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Qual o limite da livre expressão dos juízes no Brasil?

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O assunto volta à baila, desta vez em um cenário nacional politicamente mais polarizado, com a edição do Provimento n. 135/2022, do Corregedor Nacional de Justiça, o ministro do STJ Luís Felipe Salomão.

Em artigo publicado em setembro apontamos que a livre expressão dos juízes é reconhecida pela ONU e pela União Europeia como direito fundamental, com algumas justificáveis restrições a fim de garantir a imparcialidade e a confiança no Judiciário, mas que especialmente em momentos de risco democrático é que se deve garantir essa liberdade à Magistratura.

Também em setembro, o Cyrus R Vance Center for International Justice, por seu Lawyers Council for Civil & Economic Rights, publicou nota técnica, com precedentes, sobre a livre expressão dos juízes, na qual diz que é inadmissível limite quando se trata de defender a democracia e sobre assuntos de interesse da administração da justiça e da Magistratura. Sendo dever recordar que a democracia não pode ser definida por uma pessoa ou um grupo para dizer o que é ou não democrático, mas é fruto de debate internacional e acadêmico.

No Brasil, o tema é tratado pela Constituição Federal, pela Lei Orgânica da Magistratura e pelo Código de Ética, este último editado pelo Conselho Nacional de Justiça, e que é complementar e não inova o ordenamento.

Embora concordemos com o Ministro Corregedor sobre a necessidade de limites na liberdade da expressão dos juízes, seguindo a métrica amplamente debatida na comunidade internacional da qual o Brasil não deve se afastar, entendemos que o cabedal normativo existente basta para assegurar essa liberdade e analisar eventuais excessos de forma pontual, concreta e específica.

O Provimento n. 135/2022 traça limitações severas até mesmo às relações sociais e acadêmicas dos juízes, que precisam conviver com a pluralidade de ideias pela profissão e por serem cidadãos, e, fere a garantia fundamental que proíbe a retroatividade de norma punitiva ao atingir manifestações passadas, de antes da existência da norma, caso os juízes não as suprimissem até 20/09/2022.

A situação se torna mais complexa com a edição da Portaria n. 83/22, da Corregedoria Nacional, que cria um plantão extraordinário durante as eleições para receber denúncias a respeito da conduta de magistrados que violarem o Provimento n. 135.

Ao que se sabe, seria uma previsão inédita para análise administrativa de conduta de servidor público lato sensu que nenhuma outra carreira teve. A sindicância e o processo administrativo disciplinar possuem rito próprio, e não se antevê em que se poderia sancionar o juiz em regime de plantão de órgão correicional, já que para as condutas graves o Judiciário, i.e., os próprios juízes estão já de plantão. Os juízes não só defendem, garantem a democracia ao manter a lei, e não representam risco a ela. Casos pontuais devem assim ser tratados.

Não se pode tolher a liberdade de pensamento e até mesmo de ir e vir dos Magistrados além do necessário para o legítimo exercício do cargo, daí porque qualquer eventual excesso deve ser examinado de forma concreta e pontual, sem generalizações, aplicando-se o cabedal normativo democrático que já existe, em especial a Constituição e a LOMAN.

Como magistrado com mais de trinta anos de carreira, é justo esperar do Ministro a serenidade que lhe é usual para equilibrar a liberdade de expressão dos juízes com as necessárias independência, imparcialidade e credibilidade do Judiciário exigidas em especial nesse momento peculiar, tutelando os interesses sem violar direitos fundamentais, como tem sido debatido e sedimentado na comunidade internacional.

Edu Perez de Oliveira
Juiz de Direito do TJ-GO

José Herval Sampaio Júnior
Juiz de Direito do TJ-RN e Professor da UERN

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