Caracteriza bis in idem (punição dupla pelo mesmo fato) a utilização da quantidade e da natureza do entorpecente na primeira e na terceira fases da dosimetria da pena, seja considerando esse fundamento para afastar a causa de diminuição do parágrafo 4º do artigo 33 da Lei de Drogas (Lei 11.343/2006) ou para definir o percentual dessa redução.
Com base na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF), a ministra Cármen Lúcia concedeu Habeas Corpus de ofício para ordenar que o relator de apelação criminal submeta novamente à 4ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Minas Gerais o exame da dosimetria da pena de homem condenado por tráfico de drogas, aplicando a causa de diminuição do parágrafo 4º do artigo 33 no patamar máximo de dois terços.
Além disso, o magistrado deve, considerada a nova pena, reexaminar o regime prisional e a possibilidade ou não de substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. O homem foi condenado em primeira instância, por tráfico de drogas, às penas de 9 anos e 6 meses de reclusão, em regime inicial fechado, e 950 dias-multa.
O relator da apelação, desembargador Doorgal Borges de Andrada, votou para dar parcial provimento ao recurso para reduzir a pena do réu para 7 anos de reclusão e 700 dias-multa e mudar o regime prisional de fechado para semiaberto. O entendimento prevaleceu na 4ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG).
A defesa do réu, comandada pelos advogados André Dolabela e Sandro Reis, impetrou HC alegando bis in idem. O pedido foi negado no Superior Tribunal de Justiça (STJ), mas eles recorreram ao STF.
A ministra Cármen Lúcia constatou a ocorrência de bis in idem. Ela apontou que, ao dar parcial provimento à apelação e reduzir as penas do acusado para 7 anos de reclusão e 700 dias-multa, mudando o regime prisional de fechado para semiaberto, a 4ª Câmara Criminal do TJ-MG utilizou a quantidade e a natureza do entorpecente (175 quilos e 476 gramas de maconha) para o aumento da pena-base, estabelecendo-a em 7 anos de reclusão e 700 dias-multa.
Na terceira fase da dosimetria da pena, disse Cármen, embora o colegiado tenha utilizado a quantidade e a natureza do entorpecente novamente para afastar a aplicação da causa de diminuição do parágrafo 4º do artigo 33 da Lei de Drogas, apontou que não haveria bis in idem, pois não estaria adotando esse fundamento para definir o percentual dessa causa de diminuição, mas para afastá-la.
A 4ª Câmara Criminal do TJ-MG concluiu dizendo que a “quantidade de droga apreendida apenas não pode servir para aumentar a pena-base e, ao mesmo tempo, justificar o patamar de redução pela minorante do artigo 33, parágrafo 4º, da Lei de Tóxicos”, e, na espécie, não estaria sendo considerada a “quantidade de entorpecentes para agravar a reprimenda do acusado, mas somente para a análise dos requisitos necessários à concessão do benefício do tráfico privilegiado”.
Entendimento
Porém, declarou a ministra, a jurisprudência do STF “é firme no sentido de caracterizar-se o bis in idem a utilização da quantidade e da natureza do entorpecente na primeira fase e na terceira fase da dosimetria da pena, seja considerando esse fundamento para afastar a causa de diminuição do parágrafo 4º do artigo 33 da Lei de Drogas ou para definir o percentual dessa redução” (HC 177.766-AgR).
“Reconhecido o bis in idem na espécie, estão prejudicados os pedidos subsidiários formulados pelos impetrantes para o redimensionamento da pena-base, com a nova valoração da circunstância judicial tida por desfavorável na primeira fase da dosimetria da pena, e substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, pois o órgão fracionário do Tribunal de Justiça de Minas Gerais terá que refazer a dosimetria da pena imposta ao paciente”, afirmou a ministra.
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HC 209.023
Com informações da Conjur