O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que não é necessária a realização de licitação prévia para transferência de concessão ou do controle societário da concessionária de serviços públicos. Por maioria, na sessão virtual encerrada em 8/3, a Corte julgou improcedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 2946, ajuizada pela Procuradoria-Geral da República (PGR).
O caput do artigo 27 da Lei Geral de Concessões e Permissões (Lei 8.987/1995) estabelece que a transferência sem prévia anuência do poder concedente implicará a extinção da concessão. O parágrafo único prevê que, para a obtenção da anuência, o pretendente deverá atender às exigências de capacidade técnica, idoneidade financeira e regularidade jurídica e fiscal necessárias à assunção do serviço e comprometer-se a cumprir todas as cláusulas do contrato em vigor.
Segundo a PGR, a norma afrontaria o dever de licitar (artigo 175 da Constituição Federal) e divergiria do regime jurídico estabelecido na Lei Geral das Concessões, que prevê a obrigatoriedade de licitação prévia para a subconcessão de serviços públicos (artigo 26).
Proposta mais vantajosa
O Plenário começou a julgar a questão em 9/12/2021, em sessão presencial, quando o relator, ministro Dias Toffoli, votou pela manutenção do dispositivo e foi seguido pelos ministros Gilmar Mendes e Nunes Marques. Para Toffoli, o que interessa, para a administração pública, é a proposta mais vantajosa, e não a identidade do contratado. Ele ressaltou que é necessário zelar pela continuidade da prestação dos serviços, e a modificação do contratado não implica, automaticamente, burla à obrigatoriedade de licitação ou ofensa aos princípios constitucionais correlatos.
Toffoli observou que, em regra geral, as características do contratado são indiferentes para o Estado. Basta que seja idôneo, ou seja, comprove a capacidade para cumprir as obrigações assumidas no contrato, o que é aferido por critérios objetivos e preestabelecidos. Além disso, o princípio constitucional da impessoalidade veda que a administração “tenha preferência por esse ou aquele particular”.
O relator salientou que uma das peculiaridades dos contratos de concessões públicas é que são dinâmicos, e seu regime jurídico autoriza ajustes, a fim de permitir a continuidade e a prestação satisfatórias. As transferências, assim, são utilizadas quando as concessionárias não tiverem condições de permanecer no contrato, e a exigência constitucional de prévia licitação é atendida com o procedimento inicial, cujos efeitos jurídicos são observados e preservados mediante a anuência administrativa.
Parcerias
Para ele, a norma questionada é de extrema relevância no contexto das concessões públicas, especialmente em razão das características desse tipo de contratação, do prazo de duração flexível e da estreita relação com o mercado financeiro, principalmente após a edição a Lei 13.334/2016, que criou o Programa de Parcerias de Investimentos (PPI). A seu ver, as concessionárias podem estabelecer novas parcerias para a atualização ou a inovação tecnológica, para superar crises ou dificuldades econômico-financeiras “ou simplesmente captar no mercado os valores necessários ao seu regular prosseguimento”.
Outro ponto destacado pelo relator é que a administração pública “pode e deve” proceder a um controle de juridicidade do ato de transferência, assegurando-se que o objeto admite a cessão e que não há vedação legal ou contratual à cessão ou à transferência do controle acionário nem indícios de cartelização, entre outros requisitos.
Transferência x subconcessão
Por fim, Toffoli ressaltou que a transferência não se assemelha à subconcessão, disciplinada no artigo 26 da lei. No primeiro caso, se mantém o contrato original, apenas com a modificação contratual subjetiva. No segundo, instaura-se uma relação jurídico-contratual nova e distinta da anterior.
Na retomada do julgamento, em sessão virtual, também aderiram ao voto do relator os ministros Alexandre de Moraes, André Mendonça, Luiz Fux e Luís Roberto Barroso.
Divergência
Ficaram vencidos os ministros Edson Fachin e Ricardo Lewandowski e as ministras Cármen Lúcia e Rosa Weber. Primeiro a divergir, Fachin ressaltou que a Constituição optou expressamente pela realização de licitação sempre que o poder público decidir conceder a prestação de serviço público, “de modo a concretizar os princípios da isonomia, da moralidade e da eficiência, para além da economia de ordem financeira que a contratação direta poderia gerar”.
Com informações do STF