Atribuir, por meio de lei de iniciativa parlamentar, a este ou àquele órgão do Poder Público municipal certa e determinada atividade ou função, constitui violação do princípio da separação de poderes, uma vez que é reservada constitucionalmente ao chefe do Poder Executivo a tarefa de definir as atribuições de suas secretarias e órgãos auxiliares.
O entendimento é do Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) ao anular uma lei municipal de Caçapava, de autoria parlamentar, que autorizava o Poder Executivo a instituir um “cartão receita”, destinado à renovação automática de receituários médicos de pacientes com doenças crônicas.
Ao propor a ADI, a Prefeitura de Caçapava alegou ofensa ao artigo 5º da Constituição Estadual e 2º da Constituição Federal. Em votação unânime, a ação foi julgada procedente. Para o relator, desembargador Costabile e Solimene, a renovação de receitas médicas não é tema local, o que justificaria a edição de lei municipal.
“A orientação do STF é de só reconhecer aos municípios direito à regulação suplementar e quando em restrita consonância com interesses locais, o que, a nosso sentir, não se antevê neste caso”, afirmou.
Segundo o magistrado, “apesar de empolgada pelas melhores intenções, para atingir igualmente bons e nobres objetivos, e com atenção à proteção à saúde”, a norma também afrontou a reserva da administração, assegurada pela Constituição Estadual, ao criar obrigações e interferir na organização e no funcionamento do município.
“Esta lei, indo além de instituir uma política pública de saúde, criou o ‘cartão receita’, estabeleceu que os seus portadores terão direito à automática renovação de receituários em certas comorbidades, estabeleceu paradigmas técnicos para os servidores da rede pública local, indicou quais os dados que nele serão inseridos, até o modo de sua confecção e determinou que o sistema fosse subsidiado por dotações próprias do orçamento, sequer identificadas as suas fontes”, completou.
Assim, seja pela violação do preceito da separação de poderes, seja por dar ao município poderes normativos de que não dispõem, na medida em que o assunto é de saúde pública, mas não condiz com peculiaridade local, Costabile e Solimene declarou a inconstitucionalidade da norma. O relator não modulou os efeitos da decisão.
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2253876-51.2020.8.26.0000
Com informações da Conjur