Embora haja independência entre as jurisdições cível e criminal, ela não é absoluta. A exceção aplica-se quando, na esfera penal, é reconhecida a inexistência do fato ou afastada a autoria. Nessa hipótese, a decisão também se reflete no âmbito da responsabilização civil para evitar julgamentos antagônicos.
Com essa fundamentação, e amparada pelo artigo 935 do Código Civil, a desembargadora Heloísa Pinto de Freitas Vieira Graddi, da 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA), suspendeu a tramitação de ação cível que condenou, em primeiro grau, uma médica a pagar indenização de R$ 600 mil pelas mortes de dois jovens no trânsito.
“O juízo criminal concluiu pela inexistência da autoria do crime de homicídio doloso imputada à parte ré, o que faz exsurgir, a priori, dúvida a respeito da alegada existência de responsabilidade civil daquela na ocorrência da morte dos filhos dos autores”, ponderou Heloísa Graddi, relatora da apelação cível.
De acordo com a desembargadora, “as jurisdições civil e penal são independentes, exceto nos casos em que o juízo criminal afirma a inexistência material do fato típico ou exclui sua autoria”. Por essa razão, a julgadora determinou a suspensão do feito até que sobrevenha o trânsito em julgado da sentença criminal.
A relatora tomou essa decisão no último dia 18 de julho e citou o artigo 935 do Código Civil, conforme o qual “a responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal.”
Entenda o caso
Um casal de irmãos, de 22 e 23 anos, morreu ao ter a moto na qual transitava atingida pelo carro dirigido pela médica. O acidente aconteceu em outubro de 2013, em Salvador. Após ficar 58 dias presa, a acusada pôde responder ao processo criminal em liberdade. O Ministério Público a denunciou por duplo homicídio qualificado.
Submetida a júri popular, a ré foi absolvida em dezembro de 2017. O Ministério Público apelou e o TJ-BA referendou, em 2019, o veredicto dos jurados. Em fevereiro, abril e junho de 2022, o Superior Tribunal de Justiça negou três recursos do MP nos quais foi requerida a anulação do júri, com a consequente produção de outro.
A mãe das vítimas ajuizou ação cível e pediu, a título de dano moral, indenização de R$ 1 milhão pela morte de cada filho. Em setembro de 2019, o juiz Joanisio de Matos Dantas Junior, da 5ª Vara Cível e Comercial de Salvador, julgou a ação parcialmente procedente, condenando a médica a indenizar a autora em R$ 600 mil (R$ 300 mil para cada vítima).
“O acidente se deu por culpa exclusiva da autora, que, ao conduzir seu veículo de forma imprudente, causou a morte das vítimas”, concluiu o magistrado. As partes apelaram e a relatora do recurso considerou adequado suspender a ação cível até o trânsito em julgado da sentença criminal absolutória.
Com informações da Conjur