A vítima de um crime não pode firmar acordo de colaboração premiada, pois é diretamente interessada na punição dos envolvidos. Essa premissa vale também para o caso do colaborador que, em passado recente, tenha participado das atividades criminosas das quais agora é alvo.
Com esse entendimento e por maioria de votos, a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) trancou a ação penal contra 26 pessoas acusadas de integrar organização criminosa miliciana criada para praticar crimes de extorsão, roubo, corrupção, lavagem de dinheiro e delitos tributários.
Toda a investigação se baseou na colaboração premiada de um comerciante que, por estar na área de influência da milícia, teve mercadoria roubada, foi ameaçado e obrigado a vender apenas os produtos fornecidos pelo bando, com preço tabelado.
Esse comerciante, posteriormente, passou a atuar com a milícia, mas em 2019 teve problemas com integrantes do bando, rompeu com a estrutura criminosa e, por temer por sua vida, procurou o Ministério Público do Rio de Janeiro. Hoje, está inserido no programa estadual de proteção a vítimas.
A partir das informações passadas por ele, houve vigilância de investigados, prisões em flagrantes, cumprimento de busca e apreensão e obtenção de provas por interceptações telefônicas. Para o MP-RJ, esse colaborador não é vítima, pois integrou efetivamente a organização criminosa investigada.
Vítima não admite crime
Relator, o desembargador convocado Olindo Menezes apontou que, apesar das especificidades do caso, a jurisprudência do STJ e a legislação pertinente fixam que a vítima não pode ser colaboradora, por ter interesse direto na punição a ser aplicada pelo Estado.
Tanto a Lei 12.850/2013 quanto diversos precedentes judiciais delimitam acordo de colaboração premiada sem citar a vítima. Em vez disso, trata-se de negócio jurídico feito entre o acusador e a defesa, visando ao esvaziamento da resistência do réu e à sua conformidade com a acusação.
Ainda que a situação anterior de criminoso fosse considerada, a colaboração premiada não é motivação suficiente para embasar medidas de busca e apreensão, como ocorreu. A posição foi acompanhada pelos ministros Sebastião Reis Júnior e Antonio Saldanha Palheiro.
Não é mera vítima
Abriu a divergência a ministra Laurita Vaz, que ficou vencida ao lado do ministro Rogerio Schietti. Para eles, a circunstância de que a vítima rompeu com a organização criminosa não apaga o fato de que ela a integrou. Além disso, a lei não exige que o colaborador, no momento que faz a colaboração premiada, ainda esteja vinculado ao grupo criminoso.
“Não se cuida de uma simples vítima, mas, sim, de uma vítima que fez parte do grupo criminoso. Portanto, parece ser válida a colaboração. É uma situação peculiar (vítima de uma organização criminosa que, em outro momento, também foi integrante da organização). Mas essa peculiaridade, ao que parece, tornaria válida a colaboração”, opinou a ministra.
Com informações da Conjur