Nesta terça-feira, com as atenções dominadas pela Copa do Mundo, a Comissão de Agricultura e Reforma Agrária do Senado realiza uma sessão extraordinária que tem como pauta única a votação do relatório sobre o Projeto de Lei 1459/2022 — um dos mais polêmicos da atual legislatura.
Defendido pela bancada ruralista, mas apelidado de “PL do Veneno” pelos críticos, o texto altera praticamente toda a atual regulamentação sobre agrotóxicos no país. As propostas versam sobre pesquisa, registro, comercialização e transporte desses produtos.
A sessão é alvo de contestações por ser entendida como uma manobra para acelerar a aprovação do PL antes do fim do mandato do presidente Jair Bolsonaro. Em tese, se for aprovado na comissão de agricultura, o projeto poderá ser votado por todos os senadores, no plenário.
No entanto, o Ministério Público do Trabalho (MPT) defende que o texto também seja debatido nas comissões de saúde e do meio ambiente, antes de ir ao plenário. “Estamos reclamando da falta de discussão e de contraponto”, afirma Leomar Daroncho, procurador do MPT.
Segundo Daroncho, o relatório do senador Acir Gurgacz (PDT-RO) não leva em conta os alertas de uma série de pesquisadores sobre os impactos que a eventual aprovação do PL pode causar à natureza e à integridade física de consumidores e trabalhadores.
Em junho, técnicos da Organização das Nações Unidas (ONU) já haviam publicado uma recomendação contrária ao projeto de lei, depois de a matéria ter sido aprovada na Câmara dos Deputados.
O senador Gurgacz rebate as críticas. “É um projeto bom para o Brasil, para a modernização de nossa agricultura, com segurança ambiental e cuidados com a saúde humana. O que não podemos mais fazer é ficar arrumando desculpas para não votar”, argumenta o parlamentar em nota enviada à coluna.
Aprovação acelerada de agrotóxicos
Os defensores do PL afirmam que a discussão se arrasta há mais de duas décadas no Congresso Nacional e que, uma vez aprovado, o projeto vai desburocratizar a aprovação de agrotóxicos mais modernos.
“Muito pior é manter a legislação como está, permitindo que pesticidas ultrapassados e nocivos à saúde e ao meio ambiente permaneçam em uso”, argumenta o senador Gurgacz.
Por outro lado, o MPT aponta uma série de problemas na redação do PL. Um dos mais graves, segundo o órgão federal, é concentrar a decisão final sobre a aprovação de agrotóxicos nas mãos do Ministério da Agricultura.
Já os órgãos técnicos da saúde e do meio ambiente, ao contrário da atual legislação, teriam um papel secundário no processo.
Além disso, o PL cria uma autorização temporária para o uso de agrotóxicos ainda não usados no país, caso os fabricantes atendam aos requisitos da lei e os órgãos competentes deixem de emitir um parecer no período determinados pelas novas regras.
“Ou seja, passa a ser de interesse do setor econômico o desmantelamento dos órgãos de análise, pois se não forem cumpridos os prazos estipulados para a conclusão da análise, que vão de 30 dias a 2 anos, teremos a inusitada autorização tácita, por decurso de prazo”, critica o procurador Leomar Daroncho.
Permissão para exportar agrotóxicos perigosos
O MPT também cita como outro problema grave do PL o artigo 17, que dispensa o registro de pesticidas destinados exclusivamente à exportação. “É de se supor que se refira a pesticidas com risco inaceitável no Brasil, pois do contrário seriam registrados”, explica Daroncho.
Na avaliação do procurador, a falta de controle pode expor trabalhadores e comunidades nos entornos das fábricas a riscos de saúde desconhecidos.
Além disso, o transporte inadequado desses produtos tem potencial para contaminar rios e mananciais com substâncias altamente nocivas.
“Esse PL não é de interesse da agricultura brasileira, mas da indústria química, que consegue vender aqui produtos que não vendem mais em outros lugares”, critica Daroncho.
“A longo prazo, inclusive, a aprovação desse projeto pode ser nociva pra economia brasileira. Podemos ser vítimas de retaliação por parte de países que compram nossas commodities”, finaliza o procurador do MPT.
Com informações do UOL