O ministro André Mendonça, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu nesta segunda-feira (17) o julgamento que discute normas que reclassificam o uso e o controle de agrotóxicos no Brasil. Até a interrupção, o placar estava em 4 a 0 a favor do entendimento da relatora Cármen Lúcia, que considerou boa parte do decreto inconstitucional e defendeu mais transparência aos registros e regras mais rígidas quanto ao uso e controle dos agrotóxicos no país.
Ao mesmo tempo, a ministra manteve parte do decreto presidencial como a classificação toxicológica e de comunicação de perigo à saúde na rotulagem adotada desde 2021. O julgamento estava em plenário virtual até o fim desta segunda-feira (17). Até a paralisação, os ministros Luís Roberto Barroso, Alexandre de Moraes e Edson Fachin acompanharam integralmente o voto da relatora.
A ADPF 910 foi ajuizada pelo Partido dos Trabalhadores (PT) contra dispositivos do Decreto 10.833/2021. Para a legenda, o decreto flexibilizou as normas que tratam da liberação e reclassificação de agrotóxicos no Brasil, inclusive autorizando produtos proibidos em países da União Europeia, em clara violação ao meio ambiente, à saúde e ao direito dos consumidores.
Em seu voto, Cármen Lúcia considerou constitucional a adoção do Sistema Globalmente Harmonizado de Classificação e Rotulagem de Produtos Químicos (GHS) para a classificação toxicológica e comunicação de perigo à saúde na rotulagem de agrotóxicos. Para ela, o padrão escolhido seguiu as determinações da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o poder regulador da Administração Pública. Este era um dos tópicos mais importantes para o PT.
“Observa-se que a adoção das diretrizes do Sistema Globalmente Harmonizado de Classificação e Rotulagem de Produtos Químicos para a classificação toxicológica e comunicação de perigo à saúde na rotulagem de agrotóxicos, pré-misturas e afins não se comprova desobediente a normas da Constituição da República, tendo sido impostas no exercício legítimo do poder regulador da Administração Pública em matéria de controle e fiscalização de agrotóxicos e proteção dos direitos fundamentais da saúde e do meio ambiente”, explicou.
Cármen determinou no voto a ampla publicidade de pedidos e concessões de registro de agrotóxicos, retirando, assim, a necessidade de cadastro prévio para a consulta dessas informações. Determinou ainda que o registro dos defensivos seja associado a critérios científicos e parâmetros nacionais e internacionais.
A relatora também retirou do Ministério da Saúde a exclusividade sobre a definição dos limites de resíduos de agrotóxicos em alimentos e intervalos de segurança. Na visão da ministra, a atuação deve ser conjunta com outras pastas como Meio Ambiente e Ministério da Agricultura.
A ministra votou para que produtores e importadores de agrotóxicos apresentem ao Poder Público os laudos de análise de teor de impurezas significativos sob o aspecto toxicológico e ambiental feitos em seus laboratórios, portanto, manteve a obrigação da apresentação e não apenas de guarda, tendo que fornecê-los apenas se requisitado pelas autoridades.
“Com a modificação do inc. X do art. 2º, instalou-se perniciosa sutileza: os Ministérios da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, da Saúde e do Meio Ambiente não mais controlam a qualidade dos agrotóxicos, apenas monitoram e fiscalizam o tanto realizado pelos produtores. Essas normas descumprem os princípios da prevenção, da precaução e da vedação ao retrocesso, pois a Administração mitigou o seu dever de controle de agrotóxicos, componentes e afins”, escreveu.
“O arrefecimento do poder de polícia estatal é evidente, inadmissível em matéria de proteção à saúde – notadamente a segurança alimentar – e ao meio ambiente. Controlar é diferente de monitorar ou fiscalizar e pressupõe apreciação direta, criteriosa e condicionante pelos órgãos encarregados do exercício do poder de polícia”, acrescentou.
A ministra também considerou inconstitucional trecho da norma que vincula a destruição ou inutilização de vegetais e alimentos com resíduos de agrotóxicos acima do permitido ou com uso de pesticidas não permitidos no país a “risco dietético inaceitável”. Para ela, este termo é genérico e sem parâmetros, o que pode representar perigo ao consumidor.
“A afirmação de que esses produtos não representam perigo ao consumidor é, no mínimo, contraditória, pois a razão pela qual os alimentos seriam destruídos ou inutilizados, nos termos da norma anterior, seria a identificação de “ resíduos acima dos níveis permitidos ou aplicação de agrotóxicos e afins de uso não autorizado”, argumentou a ministra. “Permitir o consumo desses produtos é ser conivente com a exposição da população a alimentos com padrões de segurança reduzidos ou insuficientes.
Com informações do Jota