Em dezembro de 2019, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que os aposentados do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) têm direito à chamada Revisão da Vida Toda, por meio da qual é possível incluir no cálculo do valor da aposentadoria os salários recebidos pelo segurado da Previdência Social anteriores a julho de 1994. Da decisão do STJ que reconheceu aos aposentados o direito à revisão da vida toda, o INSS apresentou Recurso Extraordinário levando a discussão ao Supremo Tribunal Federal (STF).
Desde o início do julgamento da Revisão da Vida Toda pelo Supremo muita coisa aconteceu e o noticiário jornalístico jurídico tem destinado bastante espaço ao assunto. No entanto, existem muitas informações inverídicas e até mesmo de cunho sensacionalistas que mais servem para confundir os aposentados do que realmente informá-los.
À luz da desmistificação do atual cenário envolvendo a Revisão da Vida Toda e o seu julgamento pelo Supremo Tribunal Federal, a JuriNews entrevistou o advogado Guilherme Chiquini, especialista em Direito Previdenciário, e que patrocina cerca de duzentas ações sobre a matéria.
Confira a seguir:
JuriNews: Num primeiro momento, poderia nos dizer o que é a Revisão da Vida Toda e quem tem direito à ela?
Guilherme Chiquini: Revisão da Vida Toda é uma revisão de aposentadoria que consiste em incluir no cálculo do valor da aposentadoria os salários recebidos pelo segurado do INSS antes de julho de 1994. Em regra, a revisão da vida toda é vantajosa para quem contribuía com valores altos ao INSS antes de julho de 1994, mesmo em outras moedas. Muitas pessoas receberam bons salários antes de julho de 1994 e passaram a contribuir com valores menores após essa data. Essas pessoas, portanto, foram prejudicadas quando do cálculo de suas aposentadorias e a revisão da vida toda é uma forma de recuperar esse prejuízo.
JuriNews: Qual o prazo para o aposentado solicitar a Revisão?
Guilherme Chiquini: Pode ter direito à revisão da vida toda quem recebeu o seu primeiro pagamento de aposentadoria nos últimos dez anos. Isso porque, o STJ, ao reconhecer o direito dos aposentados à revisão, reconheceu também a chamada decadência, ou seja, o prazo de 10 anos para pedir a revisão e, esse prazo se inicia no primeiro dia do mês seguinte ao do primeiro recebimento do benefício. Portanto, quem se aposentou nos últimos dez anos e teve o seu benefício calculado com base na média dos 80% maiores salários recebidos a partir de julho de 1994 têm direito à revisão da vida toda, desde que, é claro, o novo cálculo lhe seja benéfico.
JuriNews: A Reforma da Previdência, em vigência desde 13/11/2019, pôs fim à Revisão da Vida Toda?
Guilherme Chiquini: Na verdade, a Revisão da Vida Toda é um conflito de regras de cálculos constantes da Lei 8.213/1991. A EC 103/19, mais conhecida como Reforma da Previdência, trouxe uma nova sistemática de cálculo da aposentadoria em substituição aos textos da Lei 8.213/91. Deste modo, apenas quem se aposentou após o início de vigência da Reforma, mas que teve seu benefício calculado com base nas regras do direito adquirido (cálculo pela Lei 8.213/91) é que pode ter direito à Revisão da Vida Toda. Já quem se aposentou com fundamento no cálculo trazido pela EC 103/19 não tem direito, eis que a esse aposentado foi aplicada a nova regra e não aquelas objeto de conflito. É muito pequeno o número de aposentados após a vigência da Reforma da Previdência que têm direito à Revisão da Vida Toda. Deste modo, considerando estarmos em julho de 2022, em regra, pode ter direito à Revisão da Vida Toda quem se aposentou entre julho de 2012 (há dez anos) e novembro de 2019 (início de vigência da Reforma da Previdência).
JuriNews: Qual o posicionamento do Ministério Público Federal acerca da Revisão?
Guilherme Chiquini: O Ministério Público Federal, na pessoa do Procurador Geral da República – Augusto Aras – manifestou-se pela improcedência do Recurso apresentado pelo INSS, dando o seu parecer no sentido de que seja mantida a decisão do STJ que, por unanimidade, decidiu de maneira favorável aos aposentados. Sem sombra de dúvidas, é um ponto positivo em favor de todos os aposentados que têm direito à Revisão da Vida Toda e aguardam o desfecho do processo.
JuriNews: Muito se tem falado da Revisão da Vida Toda nos noticiários ultimamente. O que tem de verdade e mentira nas últimas notícias veiculadas sobre o assunto?
Guilherme Chiquini: Diariamente recebo muitas perguntas de clientes e pessoas interessadas na Revisão que, após verem determinada matéria, vídeo ou notícia em geral, questionam se oassunto já foi finalizado pelo STF e se o julgamento foi favorável. A bem da verdade, não tem nada decidido ainda. No entanto, fatos positivos aconteceram, dentre eles a decisão da alteração do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal no sentido de ser validado o voto proferido pelo Ministro aposentado quando um julgamento for se reiniciar em razão de pedido de destaque. E no caso da Revisão da Vida Toda isso é positivo porque será aproveitado justamente o voto do Ministro Marco Aurélio – relator do caso no STF – favorável aos aposentados.
JuriNews: Por fim, o que esperar do julgamento pelo Supremo Tribunal Federal?
Guilherme Chiquini: Particularmente, estou muito confiante, até porque, todos os Ministros do STF chegaram a votar, ficando o placar em 6 a 5 a favor dos aposentados, mas de repente, na última hora, um pedido de destaque feito pelo Ministro Nunes Marques, determinou que a votação, que até então acontecia em ambiente virtual, fosse zerada e recomeçasse no plenário físico – ainda sem data para acontecer. Em outras palavras, os aposentados venceram no “tempo normal”, mas por meio de uma artimanha o jogo foi levado para a prorrogação. E só para finalizar: o voto do Ministro Marco Aurélio – Relator da Revisão da Vida Toda no STF – é uma aula da constitucionalidade do direito adquirido. Não pode uma regra de transição, cuja razão de existir é beneficiar o segurado, ser aplicada para reduzir o valor de sua aposentadoria. Não faz sentido uma norma transitória ser utilizada para prejudicar quem se aposenta. Deste modo, tenho convicção de que o STF fará a interpretação correta, justa e de direito acerca do tema, culminando na improcedência do recurso apresentado pelo INSS e, consequentemente, no reconhecimento do direito dos aposentados à Revisão da Vida Toda.