O juízo da 21ª Vara Cível de Brasília condenou uma pastora e um canal de televisão por fala ofensiva à população LGBTQIA+. O julgador destacou na decisão que atrelar a causa de uma doença à orientação sexual ultrapassa a liberdade de expressão ou religiosa e configura conduta discriminatória.
Autora da ação civil pública, a Aliança Nacional LGBTI relatou que a pastora proferiu discurso discriminatório em desfavor da população LGBTQIA+ durante um evento transmitido pelo canal de TV. Em um dos trechos, ela afirmou que a “união sexual entre dois homens causa uma enfermidade que leva à morte”, ao se referir à Aids.
Na ação, a autora pediu que a pastora e o canal fossem condenados a cessar a divulgação da gravação e a pagar indenização por danos morais.
Em sua defesa, os réus sustentaram que houve o exercício legítimo da liberdade de expressão e religiosa, e disseram ainda que não houve discurso de ódio ou atitude discriminatória.
Ao julgar, porém, o juiz explicou que a liberdade de expressão e a liberdade religiosa possuem limite sistêmico no ordenamento jurídico brasileiro, e devem estar em harmonia com princípios constitucionais como a dignidade da pessoa humana e a vedação à conduta discriminatória.
No caso, segundo o julgador, a ré “externou opinião danosa, ultrapassado os limites da liberdade de expressão e religiosa, exatamente no trecho em que apontou a opção afetivo-sexual como origem da Aids”.
“A ilação não encontra respaldo em texto bíblico ou na ciência. É uma conclusão errada que apenas repete a ultrapassada impressão popular da década de 1980, época da descoberta da doença (…). O que favorece a Aids não é a orientação do doente, mas a desinformação, a falta de autocuidado e, em suma, a carência social, que impede as pessoas de se precaver, razão pela qual atrelar a causa da doença à orientação afetivo-sexual diversa da heterossexualidade ultrapassa a simples liberdade de expressão ou religiosa para configurar conduta discriminatória vedada pelo texto constitucional”, escreveu o juiz.
O julgador pontuou ainda que “a injusta e superada pecha da culpa pelo surgimento e propagação” foi revivida pela população LGBTQIA+. Para ele, houve dano moral coletivo.
“A manifestação e divulgação da opinião errada atribui à população LGBTI+ uma responsabilidade inexistente, atingindo a dignidade destas pessoas de modo transindividual (…). Ocupar o lugar de culpada pela existência da Aids é situação que reduz sensivelmente todas as conquistas desta coletividade, constatação que evidencia a lesão extrapatrimonial.”
Dessa forma, os réus foram condenados a pagar R$ 25 mil a título de dano moral coletivo. O valor deve ser depositado em um fundo apontado pelo Ministério Público do Distrito Federal e dos Territórios (MPDFT), com atuação voltada à defesa dos interesses da população LGBTQIA+. Os réus terão também de cessar a disponibilização e reprodução da fala ofensiva.
Com informações da Conjur