O procurador-geral da República, Augusto Aras, confirmou o posicionamento do Ministério Público Federal (MPF) e manifestou-se contrário à fixação da tese do marco temporal para a demarcação das terras indígenas.
“Este procurador-geral manifesta concordância com o afastamento do marco temporal, quando se verifica, de maneira evidente, que já houve apossamento ilícito da terra dos índios”, disse ele durante a sessão do Supremo Tribunal Federal (STF) que analisa o caso, confirmando discordância com a tese defendida pelo governo.
A tese fixada por Aras é a seguinte : “o artigo 231 do texto constitucional, impõe o dever estatal de proteção dos direitos das comunidades indígenas, antes mesmo da conclusão do processo demarcatório, dada a sua natureza declaratória. Por razões de segurança jurídica, a identificação e delimitação das terras tradicionalmente ocupadas pelos índios há de ser feita no caso concreto, com a regra do tempus regit actum, aplicando-se a cada fato a norma constitucional vigente ao seu tempo”.
Ou seja, cada caso deve ser examinado a seu tempo e de acordo com a legislação vigente, sem ser de aplicação automática para todos eles.
No segundo dia de debates, nesta quinta-feira (2), depois da manifestação de 39 amici curiae, o presidente Luiz Fux marcou o início da votação para a sessão da próxima quarta-feira (8), com a leitura do voto do relator Edson Fachin, também contrário à tese do marco temporal. Ambos discordam, portanto, do posicionamento da Advocacia-Geral da União (AGU), favorável à tese.
Último a falar, o PGR disse que os índios sempre foram tradicionalmente expulsos de suas terras. “A Assembleia Constituinte registrou a importância do reconhecimento de que os índios foram os primeiros ocupantes do Brasil. O Brasil não foi descoberto. Não tem 521 anos. Não se pode inviabilizar os nossos ancestrais, que nos legaram esse país”, afirmou, ao rechaçar a tese do marco temporal, segundo a qual os indígenas só podem reivindicar terras nas quais já estavam até a data da promulgação da Constituição de 1988.
“A nossa Constituição Federal reconheceu direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam os índios. Demarcar consiste em atestar a ocupação dos índios como circunstância anterior à demarcação”, sustentou.
Segundo ele, “por razões de segurança jurídica, a identificação e delimitação das terras tradicionalmente ocupadas pelos índios há de ser feita no caso concreto, aplicando-se a cada fato a norma constitucional vigente ao seu tempo”. Ele se referia ao caso examinado pelo STF no momento que é a disputa por terras em Santa Catarina.
O processo trata de uma ação de reintegração de posse movida pelo governo de Santa Catarina contra o povo Xokleng, referente à Terra Indígena (TI) Ibirama-Laklãnõ, onde também vivem indígenas Guarani e Kaingang.
O PGR lembrou que em comunicado de imprensa divulgado recentemente, no dia 23 de agosto, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos reafirmou que a aplicação da tese do marco temporal contradiz as normas internacionais e interamericanas de direitos humanos, em particular a Convenção Americana sobre Direitos Humanos e a Declaração Americana sobre os Direitos dos Povos Indígenas
Isso porque “não leva em consideração os casos em que os povos indígenas foram deslocados à força de seus territórios, muitas vezes com violência, razão pela qual não estariam ocupando seus territórios em 1988. Daí a importância de se admitir o renitente esbulho como exceção ao marco temporal, como tem feito este Supremo Tribunal em jurisprudência que há de ser mantida”, defendeu. O renitente esbulho é a comprovação de que a população foi removida da área à força, sob resistência persistente.
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RE 1.017.365
Com informações da Conjur