O Ministério Público Federal (MPF) enviou ao Supremo Tribunal Federal (STF) parecer em que sustenta a possibilidade de o relator de uma ação penal com origem no tribunal delegar ao juiz de primeira instância o interrogatório dos réus e outros atos da instrução processual.
A medida está prevista em lei e qualquer tentativa de anular o procedimento deve demonstrar prejuízo aos envolvidos. A manifestação foi feita em recurso extraordinário apresentado por dois acusados de fraude em licitação e desvio de recursos públicos em município da Bahia (BA).
A defesa alega que, ao delegar ao juiz de primeira instância a realização do interrogatório dos acusados, o tribunal violou o princípio da identidade física do juiz, já que a ação penal era originária da Corte. Para o MPF, no entanto, a decisão foi acertada, pois o procedimento está previsto na Lei nº 8.038/1990 e visa atender ao princípio da razoável duração do processo.
O caso teve origem após o MPF oferecer ao Tribunal Regional Federal da Primeira Região (TRF1) denúncia contra o ex vice-prefeito do município de Belo Campo (BA) José Henrique Silva Tigre e o empresário Elve Cardoso Pontes, por ilícitos praticados entre 2008 e 2010.
O Tribunal, então, expediu Carta de Ordem para delegar à Subseção Judiciária de Vitória da Conquista (BA) a realização de audiência para ouvir as testemunhas e para o interrogatório dos acusados. Porém, a defesa requereu o cancelamento dessa delegação, alegando que os interrogatórios deveriam ser executados pelo relator da ação penal no TRF1, por se tratar de uma ação com origem no Tribunal.
Ao analisar o mérito da questão, o subprocurador-geral da República Alcides Martins, que assina o parecer, defende que o entendimento do TRF1 foi correto, no sentido de que a Emenda Constitucional nº 45/2004 acrescentou ao rol dos direitos e garantias fundamentais previstos na Constituição o direito à duração razoável do processo.
Com o objetivo de assegurar esse direito, o artigo 9°, parágrafo 1°, da Lei n. 8.038/1990 passou a admitir a delegação do interrogatório dos réus e de outros eventuais atos de instrução processual a juízes federais de primeiro grau, no intuito de garantir respostas mais ágeis da Justiça.
Em relação à alegação de ofensa ao princípio da identidade física do juiz levantada pela defesa, o subprocurador-geral ressaltou que a decisão contestada foi adequada, no sentido de que a própria Suprema Corte já firmou que esse princípio não é absoluto e comporta exceções, como a ausência motivada do magistrado por convocação, licença, afastamento, promoção ou aposentadoria, ou, ainda, a expedição de Carta de Ordem ou precatória.
Diante disso, o MPF sustenta que eventual anulação de diligência delegada ao juiz de primeiro grau só seria possível se comprovado prejuízo direto à defesa do réu no processo, o que não ocorreu no caso em concreto.
Preliminar
Embora o parecer apresente o entendimento do MPF sobre o mérito da questão, na análise das preliminares, Martins defende que o recurso apresentado pelos réus não deveria sequer prosseguir. O subprocurador-geral explica que, embora as normas indicadas pela defesa sejam de cunho constitucional, os argumentos apontados na decisão do acórdão revelam que a discussão apresentada possui relação com legislação infraconstitucional.
Com isso, caso tenha ocorrido violação ao texto constitucional, seria reflexa ou indireta, hipótese em que não é admitida a apresentação de recurso extraordinário. Afirma, ainda, a impossibilidade de conhecimento do recurso em razão de argumentação genérica quanto à repercussão geral. Caso o recurso seja conhecido pelo STF, o MPF opina pela improcedência do pedido.
Íntegra do parecer no Recurso Extraordinário 1.354.285/BA
Com informações do MPF