O Ministério Público Federal (MPF) enviou parecer ao Supremo Tribunal Federal (STF) defendendo a competência da Justiça Eleitoral para julgar crimes eleitorais que já prescreveram. O posicionamento foi no recurso extraordinário apresentado pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais (MPMG) ao recorrer da decisão do Tribunal de Justiça daquele Estado (TJ-MG) que concedeu habeas corpus a ex-vice-governador condenado por lavagem de dinheiro, reconhecendo a incompetência da Justiça Estadual, e determinando a remessa dos autos à Justiça Eleitoral.
Para o subprocurador-geral da República Juliano Baiocchi, o recurso extraordinário carece de repercussão geral e vai contra decisão anterior do STF, que determinou a incompetência da Justiça Estadual para julgar casos envolvendo delitos eleitorais.
A defesa do ex-vice-governador de Minas Gerais Clésio Andrade, condenado por lavagem de dinheiro, apresentou habeas corpus ao TJMG requerendo o reconhecimento da incompetência do Juízo da 9ª Vara Criminal de Belo Horizonte e, consequentemente, a nulidade absoluta da ação penal. O TJ-MG concedeu o HC, reconheceu a incompetência da Justiça Estadual para processar e julgar a causa, anulou a ação penal desde o recebimento da denúncia e determinou a remessa dos autos à Justiça Eleitoral. O MPMG recorreu e interpôs recurso especial e o presente recurso extraordinário.
O MPMG alegou que a matéria tratada no recurso tem repercussão geral, pois detém relevância que transcende os interesses subjetivos do caso. Afirmou também que a via de habeas corpus é inadequada para análise de competência jurisdicional, pontuando que o recurso ideal seria “exceção de incompetência do Juízo”.
Defendeu ainda que a fixação da competência pressupõe a instauração de ação penal por crime eleitoral, o que não ocorreu. Acrescentou que, diante da impossibilidade de processamento e julgamento do crime eleitoral, devido à prescrição do delito, cabe à Justiça Estadual julgar o caso. Por fim, requereu a reforma da decisão recorrida e pediu que fosse reconhecida a competência da Justiça do Estado de Minas Gerais para processar e julgar o caso.
O subprocurador-geral da República Juliano Baiocchi destaca que, ao julgar o pedido de HC, o Tribunal de origem não considerou o entendimento fixado pela Suprema Corte em repercussões gerais já consolidadas. Segundo ele, não foi aplicado o Tema 339/STF, o qual exige que as decisões judiciais sejam fundamentadas, ainda que resumidamente.
O mesmo ocorreu com o Tema 660/STF, que dispõe sobre a violação dos princípios do contraditório, da ampla defesa, dos limites da coisa julgada e do devido processo legal, quando o julgamento da causa depender de prévia análise da aplicação das normas infraconstitucionais.
Tendo o STF já decidido essas matérias em regime de repercussão geral, Baiocchi afirma que caberia ao TJ-MG aplicar o entendimento já firmado nos citados temas, nos termos do art. 1.030 do Código de Processo Civil. “Não há óbice que o STF determine o retorno dos autos ao Tribunal de origem, para que seja feito novo Juízo quanto a seu trâmite”, diz Baiocchi no parecer.
Todavia, o subprocurador-geral afirma que o recurso extraordinário do MPMG tem vários óbices para que seja conhecido, como o fato de o pedido não ter demonstrado, efetivamente, a repercussão geral, requisito essencial para esta via recursal. O representante do MPF enfatiza que não bastam argumentações genéricas de que a matéria tem repercussão geral, é preciso demonstrar, de forma fundamentada, que o tema transcende a própria causa.
Outro empecilho para o conhecimento do recurso, segundo o subprocurador-geral, é que ele esbarra na Súmula 284/STF, pois também não demonstrou de forma clara a violação ao texto constitucional indicado em suas razões recursais, limitando-se a apontar os dispositivos supostamente violados, mas sem qualquer fundamentação. Sendo assim, eventual violação ao texto constitucional, ainda que existente, seria meramente indireta ou reflexa, por demandar o exame de legislação infraconstitucional.
Por fim, Juliano Baiocchi frisa que o próprio STF, ao avaliar a situação de um corréu na ação penal, nos autos do RHC 177.243, consolidou o entendimento de que, mesmo com a prescrição do crime eleitoral, a competência da Justiça Eleitoral permanece. Na ocasião, a Suprema Corte julgou incompetente a Justiça Estadual para analisar o caso e determinou a remessa dos autos à Justiça Eleitoral.
Diante dos fatos, o MPF opina pelo retorno dos autos ao TJMG, para que seja observado o art. 1.030, I, “a”, do CPC e feito juízo quanto ao RE, considerando o teor dos temas 339 e 660. Porém, caso o STF entenda que não cabe retorno dos autos à origem, opina pelo não seguimento do recurso extraordinário.
Íntegra da manifestação no RE 1.369.353
Com informações do MPF