“Uma mulher na política muda a própria mulher. Muitas mulheres na política mudam a política”. A frase da ex-presidente do Chile e atual alta comissária da ONU para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet, deu o tom da cerimônia de lançamento da Ouvidoria da Mulher do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), nesta segunda-feira 21. O evento contou com a participação da procuradora regional da República Raquel Branquinho, como representante do Ministério Público Eleitoral.
A ouvidoria funcionará como um canal para o recebimento de notícias de assédio, discriminação e demais formas de abusos sofridos por qualquer pessoa do gênero feminino, e não apenas aquelas que trabalham na Justiça Eleitoral. Os casos de violência política de gênero recebidos serão encaminhados ao Ministério Público Eleitoral, quando houver atribuição do órgão para atuar.
Essa atuação conjunta e interinstitucional entre Judiciário e o Ministério Público foi um dos pontos destacados por Raquel Branquinho como essencial para coibir atos ilícitos relacionados à discriminação de mulheres no exercício da política e fazer com que as representações e notícias-crime cheguem às autoridades competentes.
“Vamos trabalhar conjuntamente para que a Ouvidoria da Mulher e as ouvidorias dos Tribunais Regionais Eleitorais tenham trilhas de trabalho e processos mais dinâmicos e efetivos de comunicação com o MP Eleitoral na ponta. Porque a prevenção, o combate e a repressão à violência politica de gênero é uma prioridade nessas eleições”, ressaltou a procuradora, que é uma das coordenadoras do Grupo de Trabalho de Prevenção e Combate à Violência Política de Gênero, vinculado à Procuradoria-Geral Eleitoral.
Branquinho parabenizou a iniciativa da Corte Eleitoral e avaliou que o assunto “está na ordem do dia no Brasil e no mundo”, mas exige o avanço da fase de conscientização para a efetivação em defesa do direito fundamental das mulheres em manifestar-se politicamente.
Segundo ela, um dos focos de atuação do GT Eleitoral é fornecer ferramentas que auxiliem o trabalho de procuradores e promotores eleitorais nos estados, tendo em vista que o debate sobre a violência política de gênero é recente nos meios jurídicos. Após quase um século da conquista do voto feminino no Brasil, foi apenas no último ano que a violência política contra as mulheres passou a ser tipificada como crime nos códigos Eleitoral e Penal, a partir das leis 14.192/2021 e 14.197/2021.
O presidente do TSE, ministro Edson Fachin, classificou a atuação do Ministério Público como essencial no objetivo de conscientizar a sociedade contra as práticas antidemocráticas e constrangedoras do livre exercício de direitos políticos das mulheres. Ele afirmou, ainda, que a edição das recentes leis foi avanço sensível para a história do país, demonstrando a importância de uma resposta eficiente do Estado às práticas discriminatórias de gênero na política brasileira. “Ter espaço para escuta e diálogo, eis o que a face feminina da democracia pode contribuir de modo indelével para que tenhamos um futuro de tolerância e mútuo respeito”, pontuou.
Combate à impunidade
Assegurar resposta efetiva aos casos de violência de gênero na política, de forma a conferir efetividade à atual legislação, é hoje um dos principais desafios enfrentados pelo Ministério Público e pelo sistema de Justiça, conforme ressaltou Raquel Branquinho, em outro evento sobre o tema, realizado na tarde desta segunda-feira (21). A procuradora participou do seminário Avanços Legislativos e a Preparação das Candidaturas Femininas para as Eleições de 2022, promovido pelo Observatório Nacional da Mulher na Política (ONMP), da Secretaria da Mulher da Câmara dos Deputados.
Na ocasião, ela afirmou que mulheres vítimas de violência política podem acionar o procurador regional Eleitoral dos estados onde atuam, pois ele saberá encaminhar para o promotor de Justiça Eleitoral com atribuição para atuar no caso. “Temos feito amplo debate interno e institucional para que esse tema seja tratado com prioridade, respeitando a independência funcional dos membros do Ministério Público”, afirmou a coordenadora do GT.
Segundo ela, sempre que o grupo tem conhecimento de casos de violência, encaminha para os respectivos procuradores eleitorais, sugerindo a análise e adoção de providências cabíveis na esfera penal. Além disso, tem buscado diálogo institucional com a Justiça Eleitoral e o Parlamento para estabelecer fluxos e parcerias, com o objetivo de garantir respostas mais céleres ao problema e combater a impunidade.
Raquel Branquinho chamou atenção para as várias formas que a violência contra as mulheres pode assumir na política, como é o caso da psicológica – capaz de interferir inclusive no desempenho das funções públicas – ou a econômica, que consiste na falta de repasse de recursos ou apoio político às candidatas. Nesse sentido, Branquinho destacou ser necessário criar uma rede de apoio jurídico para acolher as vítimas e orientá-las sobre como buscar a responsabilização dos autores.
Para ela, o combate a esse problema envolve não apenas os órgãos do sistema de Justiça, mas também os próprios partidos, que podem adotar medidas para assegurar o acesso das mulheres às discussões intrapartidárias, além de buscarem providências cíveis na esfera judicial contra atos que buscam limitar a entrada feminina na política.
Com informações do MPF