Para resguardar os direitos de terceiros em eventual ação de responsabilidade civil, a emissora de TV deve manter a guarda de todos os documentos referentes à sua atividade enquanto não ocorrer a prescrição ou a decadência da pretensão indenizatória, conforme previsto no artigo 1.194 do Código Civil.
Com esse entendimento, a 3ªTurma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve a determinação da Justiça de São Paulo para que o SBT apresente arquivo de reportagem sobre maus-tratos infantis, na qual foram expostos o nome e a imagem do autor de uma ação de exibição de documentos.
Na origem do caso, o autor explicou que tem uma filha menor de idade e detém a sua guarda definitiva. Argumentou que precisaria ter acesso à matéria jornalística para tomar as medidas judiciais cabíveis devido ao potencial dano decorrente do conteúdo veiculado.
O pedido foi julgado procedente, e o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) manteve a decisão. De acordo com a corte estadual, o prazo para manutenção do arquivo de reportagens pela emissora deve ser o mesmo estabelecido no Código Civil para a prescrição da pretensão indenizatória, ou seja, três anos, pois o conteúdo se destina à instrução da ação de reparação civil.
Citando uma suposta violação do artigo 71, parágrafo 3º, da Lei 4.117/1962 (Código Brasileiro de Telecomunicações), a defesa do SBT alegou em recurso especial que o prazo de conservação de gravações transmitidas é de 30 dias. Assim, a emissora não estaria obrigada a apresentar o material requerido pelo autor após o transcurso desse período.
O relator do processo no STJ, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, afirmou que o caso deve ser analisado sob a ótica do princípio da especialidade, que estabelece a prevalência do regramento específico, com força de lei, sobre as normas de caráter geral.
Como exemplo, o magistrado citou a adoção dos prazos previstos na Lei 12.965/2014 (Marco Civil da Internet) para decidir questões sobre a guarda de dados de usuários das redes sociais, lembrando que, antes de a lei entrar em vigor, era aplicada a norma genérica do artigo 1.194 do Código Civil, ou seja, os dados deveriam ser armazenados por um tempo mínimo equivalente aos prazos de decadência ou de prescrição de eventuais ações relacionadas a eles.
Quanto ao dispositivo do Código Brasileiro de Telecomunicações mencionado pela defesa da emissora, o relator explicou que ele diz respeito a infrações e respectivas penalidades na hipótese de abuso no exercício da liberdade de radiodifusão, não havendo relação com a eventual transgressão do direito de terceiros.
“À míngua de lei fixando um prazo específico para a guarda de conteúdos televisionados, ao menos em relação ao direito de terceiros, deve incidir, por analogia, a disposição contida no artigo 1.194 do Código Civil, que obriga a guarda, pela sociedade empresária, de todos os documentos concernentes à sua atividade enquanto não ocorrer a prescrição ou a decadência do direito correspondente aos atos neles consignados”, concluiu Villas Bôas Cueva ao negar provimento ao recurso especial.
Leia o acórdão no REsp 1.602.692.
Redação, com informações do STJ