Por ora, a 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) não vai estabelecer uma posição vinculante sobre a forma como a Lei 14.454/2022, que transforma o rol de procedimentos médicos da ANS em exemplificativo, deve ser aplicada aos milhares de processos sobre planos de saúde já em tramitação.
Na quarta-feira (8), o colegiado rejeitou por maioria de votos a proposta de levar o tema a julgamento por meio de incidente de assunção de competência (IAC). Trata-se do instrumento jurídico que redireciona a competência para o julgamento de um caso que se mostre relevante em sua questão de Direito.
A ideia foi apresentada pelo ministro Raul Araújo. A decisão em IAC tem caráter vinculante. Assim, além de firmar a posição do STJ sobre o tema, evitaria decisões divergentes nos juízos e tribunais de segundo grau por todo o Brasil.
A principal decisão a ser tomada é se a lei vai retroagir para situações consolidadas antes de sua entrada em vigor. Ela passou a vigorar em setembro de 2022 e é consequência direta da posição firmada pelo próprio STJ sobre o tema, que é alvo de hiperjudicialização no Brasil.
Até então, não havia definição sobre a taxatividade ou não do rol de procedimentos que a ANS estabelece como cobertura mínima para as operadores de plano de saúde. A maioria delas negava cobertura de tratamentos não incluídos nessa lista, o que obrigava os beneficiários a acionar o Judiciário.
Em junho de 2022, a 2ª Seção decidiu que o rol é taxativo, mas pode ser suavizado em determinadas ocasiões. O julgamento representou uma vitória das operadoras de planos de saúde e levou a uma reação imediata: no dia seguinte, foi protocolado na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 2.033/2022, que por fim virou a Lei 14.454/2022 meros três meses mais tarde.
A constitucionalidade da norma foi contestada imediatamente por especialistas e já é alvo de ações no Supremo Tribunal Federal. Ainda assim, a lei continua em vigor, então o STJ precisa decidir como aplicá-la antes que divergências nas instâncias ordinárias aumentem a judicialização.
Na quarta-feira (8/2), a ministra Nancy Andrighi se opôs ao julgamento do tema em IAC. Classificou a ideia como prematura e propôs que a discussão seja feita primeiro em processos julgados pelas 3ª e 4ª Turmas do tribunal, para que a decisão vinculante eventualmente tomada reflita uma posição amadurecida.
O ministro Raul Araújo ressaltou que essa ideia coloca as instâncias ordinárias em uma posição complicada: elas têm um precedente vinculante que aponta para a taxatividade do rol e uma lei posterior que diz que o mesmo é exemplificativo. Um deles precisará ser ignorado, e isso não acontecerá de maneira uniforme.
“Acho que a questão é realmente de profunda repercussão social e mereceria que o STJ adotasse o incidente de assunção de competência”, defendeu. Apenas o ministro Marco Buzzi concordou.
“Como vamos fazer esse julgamento: ignorando a nova lei e aplicando o repetitivo ou vamos ignorar repetitivo e levar em conta a nova lei, apenas em cada caso concreto, aguardando que isso aconteça nas instancias ordinárias? Elas terão dificuldade, também, em observar o repetitivo.”
Votaram com a ministra Nancy Andrighi os ministros Ricardo Villas Bôas Cueva, Paulo de Tarso Sanseverino, Isabel Gallotti, Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro e João Otávio de Noronha.
om informações da Conjur