A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a inércia de uma parte em contestar reajuste contratual abusivo ao longo dos anos, mesmo com a assinatura de confissão de dívida, não configura, por si só, violação ao princípio da boa-fé objetiva. Assim, a empresa que inicialmente agiu com abuso de direito não pode se beneficiar da falta de ação da parte prejudicada. De acordo com o relator, ministro Marco Aurélio Bellizze, a “supressio” (perda do direito de impugnar) “pressupõe a idoneidade das circunstâncias subjacentes ao negócio jurídico” e não pode ser aplicada “em favor da parte que inicialmente desbordou dos limites da boa-fé objetiva” .
O caso envolveu uma empresa alimentícia que questionou reajustes praticados por uma fornecedora de gás natural. A empresa alegou que os reajustes aplicados foram muito superiores ao índice oficial de variação de energia elétrica no Paraná. Bellizze destacou que, mesmo que uma cláusula contratual esteja expressa, ela pode ser objeto de contestação, especialmente quando há abuso, e acrescentou que “quanto mais uma conduta gravosa da contraparte”, como foi o caso da fornecedora ao utilizar uma “cláusula com conteúdo aberto”, extrapolando “os limites de sua discricionariedade”, em benefício próprio .
A decisão do STJ reformou o entendimento do Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR), que havia considerado a ausência de contestação por mais de cinco anos como comportamento contraditório da contratante, beneficiando a fornecedora. O STJ restabeleceu a sentença original, que determinava o recalculo dos valores pagos pela empresa alimentícia e a devolução dos montantes cobrados indevidamente.