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Índice de leis julgadas inconstitucionais pelo STF volta a crescer e chega a 75%

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As ações de controle concentrado de constitucionalidade são casos de competência originária em que o Supremo Tribunal Federal (STF) exerce uma de suas funções de maior importância: diz se Legislativo e Executivo respeitaram a Constituição Federal ao editar as normas questionadas. Por isso, costuma ser criticado, acusado de definir políticas públicas e de ultrapassar os limites da separação entre os poderes.

Mas, como lembra o ministro Gilmar Mendes, decano do tribunal: encerrado o debate parlamentar e aprovada nova legislação, o STF é acionado para se pronunciar. Um paradoxo, afirma.

De cada 10 ações julgadas pelo STF em 2021, sete foram consideradas inconstitucionais no todo ou em parte. Das 348 julgadas no mérito, 260 foram procedentes (75%). As ministras Cármen Lúcia e Rosa Weber foram as que mais pautaram ações de controle concentrado durante o ano: 61 e 56, respectivamente, julgadas no mérito.

A União se mantém no topo do ranking de inconstitucionalidade, com 40 leis federais, decretos e Medidas Provisórias consideradas em desacordo com a Constituição Federal. Ou seja, 51% das normas questionadas.

Em maio de 2022, havia 1.630 dessas ações no acervo do Supremo Tribunal Federal. A maior parte delas discute questões de Direito Administrativo e Público (78%) e Direito Tributário (7%). Desde a ADI nº 1, proposta em 1988, mais de 5.400 ações receberam decisão final.

Ao longo de 2021, 348 ações foram julgadas no mérito, um aumento de 80% em cinco anos. Resultado que se deve, principalmente, à ampliação da competência do Plenário Virtual. Em agosto de 2019, a Emenda Regimental 52 permitiu o julgamento de cautelares em controle concentrado e casos com jurisprudência dominante; as demais deveriam ser decididas presencialmente.

Plenário virtual

Logo no início da epidemia do coronavírus, em 2020, a Emenda 53 equiparou o ambiente virtual ao presencial: a partir dali, todos os processos poderiam ser julgados na plataforma online.

A grande diferença é que no Plenário Virtual cada ministro pode pautar os próprios casos. E o julgamento termina em até uma semana. Nas sessões presenciais, a Presidência da corte é quem define a pauta, bem mais limitada. Em 2021, 84% das ações de controle concentrado foram decididas em ambiente virtual.

“De agosto de 2019, quando aprovamos o Plenário Virtual, até a última sessão virtual, julgamos mais ADIs do que nos últimos seis anos. Em seis meses, mais que em seis anos. É muito mais interessante que se julgue rapidamente o que não precisa ser tão debatido do que ficar na fila décadas e décadas”, afirmou o ministro Alexandre de Moraes na ocasião em que a competência dos dois plenários foi equiparada, em março de 2020.

Em entrevista ao Anuário da Justiça, o ministro Gilmar Mendes disse que a “mudança foi importantíssima, porque solucionou um problema de estrangulamento que havia na corte”, inclusive em relação a casos de repercussão geral reconhecida e sem data para entrar em pauta.

Ele ponderou que esses julgamentos não permitem debates mais aprofundados, apesar de poderem ter repercussão na jurisprudência. “Isso é algo que tem preocupado, e vejo que os próprios advogados têm criticado. Mas, nesse momento, há um consenso de que foi uma mudança para melhor”, afirmou.

Ações de controle de constitucionalidade

Assim como o número de decisões, a quantidade de novas ações de controle de constitucionalidade vem aumentando ano a ano. Em 2021, foram propostas 572, o maior número da história da corte. O procurador-geral da República, Augusto Aras, adotou em sua gestão um novo modelo de atuação, buscando maior eficiência e unidade institucional no controle concentrado de constitucionalidade perante o STF.

Passou a ajuizar em bloco ações contra leis que tratam do mesmo assunto em diferentes estados. Somente em 2021, foram 204 novas ADIs, sete ADPFs e quatro ADOs.

Um exemplo dessa atuação em bloco foi o ajuizamento de 17 ADIs contra normas estaduais que trataram do foro por prerrogativa de função. A iniciativa estendeu a todos os estados a interpretação do STF sobre o tema. Segundo a corte, é inconstitucional norma de Constituição estadual que estende o foro por prerrogativa de função a autoridades não contempladas pela Constituição Federal de forma expressa ou por simetria (ADI 5.591).

Seguindo essa interpretação, a Procuradoria-Geral da República (PGR) questionou leis estaduais que conferem foro especial nos crimes comuns e de responsabilidade a diversos cargos, como defensores públicos estaduais, procuradores do Estado, membros do Conselho da Justiça Militar, procuradores das Assembleias Legislativas, chefes da Polícia Civil, delegados e reitores de universidades.

Também foram objeto de ações de inconstitucionalidade, propostas em bloco, normas que trataram da exploração de energia nuclear, matéria que, conforme a Constituição, é de competência exclusiva da União. “É inconstitucional norma de Constituição estadual que disponha sobre o depósito de lixo atômico e a instalação de usinas nucleares”, definiu a corte em ADIs contra leis da Paraíba, do Piauí e do Distrito Federal.

Entre os autores qualificados para propor ações de controle concentrado no STF, a PGR foi a que teve mais processos julgados em 2021. Foram 136, com 87,5% de êxito. Partidos políticos aparecem em seguida, com 58 ações julgadas com 59% de êxito; e associações empresariais: 57 ações com 72% dos pedidos atendidos pela corte.

Em 2021, foi principalmente por meio de ações de descumprimento de preceito fundamental que o STF moldou o plano nacional de combate à epidemia da covid-19. Autorizou, por exemplo, estados e municípios a importar e distribuir vacinas contra a doença, enquanto o governo federal queria centralizar esse processo (ADPF 770).

Contra nota técnica do Ministério da Saúde que passou a não recomendar a vacinação de adolescentes de 12 a 17 anos, o STF entendeu que decisão de promover a imunização contra a covid-19 nessa faixa etária, observadas as evidências científicas e as análises estratégicas pertinentes, também se insere na competência dos estados, do Distrito Federal e dos municípios (ADPF 756).

Determinou ainda a manutenção da divulgação integral dos dados epidemiológicos relativos à epidemia. A interrupção abrupta da coleta e divulgação dos dados, entendeu o STF, “caracteriza ofensa a preceitos fundamentais da Constituição Federal, nomeadamente o acesso à informação, os princípios da publicidade e da transparência da Administração Pública e o direito à saúde” (ADPFs 690, 691 e 692).

E mais: reconheceu como dever do poder público elaborar e implantar plano para o enfrentamento da epidemia nas comunidades quilombolas (APDF 742); e considerou descabida a exigência de “justificativa de ausência” às provas no Enem diante do contexto de anormalidade vivido (ADPF 874).

No âmbito dos estados, manteve a validade de decreto do estado de São Paulo que proibiu a realização de cultos, missas e demais atividades religiosas presenciais como forma de conter a epidemia (ADPF 811). Mas julgou inconstitucional a lei fluminense que proibiu o cancelamento de planos de saúde por falta de pagamento durante a epidemia (ADI 6.441), por invasão da competência da União para legislar sobre o assunto.

O controle concentrado de constitucionalidade também foi usado pelo STF para afirmar a inconstitucionalidade do trecho da reforma trabalhista (Lei 13.467/2017) que previu o pagamento de honorários periciais e advocatícios por quem é beneficiário da Justiça gratuita e perdeu a ação (ADI 5.766). Na área eleitoral, sob relatoria do ministro Dias Toffoli, a corte entendeu que a lei pode proibir showmícios, mas que são permitidas apresentações artísticas para arrecadação para campanhas eleitorais (ADI 5.970).

Também foi de relatoria do ministro Dias Toffoli a conclusão de que o argumento da legítima defesa da honra não pode ser usado por nenhuma das partes nem mesmo durante julgamento no Tribunal do Júri (ADPF 779). Segundo Toffoli, além de ser um argumento “atécnico e extrajurídico”, a tese é um “estratagema cruel, subversivo da dignidade da pessoa humana e dos direitos à igualdade e à vida” e totalmente discriminatório contra a mulher.

A seu ver, trata-se de um recurso argumentativo e retórico “odioso, desumano e cruel” usado pelas defesas de acusados de feminicídio e agressões contra mulheres para responsabilizar as vítimas por suas próprias mortes ou lesões, contribuindo para a naturalização e a perpetuação da cultura de violência contra as mulheres no Brasil.

Direito de resposta

O direito de resposta foi tema de três ações julgadas em 2021. O STF decidiu que a retratação espontânea, ainda que com o mesmo destaque, não impede o exercício do direito de resposta pelo ofendido nem prejudica a ação de reparação por dano moral (ADIs 5.415, 5.418 e 5.436).

Em dezembro de 2021, a corte validou o Marco Legal do Saneamento Básico (Lei 14.026/2020), sancionado pelo presidente Jair Bolsonaro em julho. O marco prevê a universalização dos serviços de água e esgoto até 2033 e viabiliza a injeção de mais investimentos privados no setor. A decisão se deu por maioria, depois de três sessões de julgamento.

Propostas por partidos políticos, as ações sustentavam que as novas regras induzem empresas privadas de saneamento e fornecimento de água a participar de licitações em locais onde as estatais que realizam os serviços não apresentam prejuízos, deixando as companhias deficitárias sob a responsabilidade de estados e municípios.

Prevaleceu o voto do relator, ministro Lux Fux, segundo o qual o Congresso optou pelo modelo facultativo de concessão e manteve a autonomia federativa. Para o ministro, as novas regras podem reduzir os gastos públicos com o sistema de saúde, contribuir para a revitalização de bacias hidrográficas, com a conservação do meio ambiente e a redução de perda de água, além de proporcionar mais qualidade de vida para a população.

Com informações da Conjur

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