O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, criticou, nesta sexta-feira (3), o papel do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) no fomento a atos golpistas e ataques às instituições democráticas brasileiras.
O magistrado afirmou que o país “estava sendo governado por uma gente do porão”, que exercia influência sobre “zumbis consumidores de desinformação”. Também ressaltou que Bolsonaro e pessoas do seu entorno provavelmente flertaram com a ideia de um golpe militar.
As declarações foram feitas em Lisboa, durante uma conferência do Grupo de Líderes Empresariais (Lide). Logo no início de seu discurso, Gilmar indicou que a posição de poder exercida pelo ex-presidente e seus aliados representa “um grande problema para a democracia atual”.
Conforme o ministro, os apoiadores do antigo governo foram “adestrados” na “cartilha de um fanatismo político ignóbil”. Para ele, as instituições foram alvo predileto de “vivandeiras alvoroçadas”. Esta expressão foi originalmente utilizada em 1964 pelo primeiro presidente da ditadura militar, Humberto Castello Branco, para se referir a civis que simpatizavam com a ideia do golpe.
Democracia e 8/1
Porém, mesmo com a depredação à Praça dos Três Poderes no último dia 8/1, o magistrado disse não acreditar que um golpe militar tenha sido cogitado, ou que as Forças Armadas tenham se envolvido na empreitada antidemocrática. “Houve um ou outro militar que participou, tolerou ou admitiu este episódio”, ressalvou.
Segundo ele, a democracia tem grande apoio da sociedade brasileira. “Não há nenhum elemento que justificasse esse tipo de devaneio”, pontuou. “Apesar da extensão do dano ser grande, o seu conserto é possível”.
Gilmar depositou suas esperanças nas investigações para a identificação de “quem ocupava o topo dessa pirâmide” e “que espécie de lucro auferiam, sejam ganhos políticos ou econômicos”.
Na visão do ministro, a responsabilização dos golpistas é “tarefa premente para readquirirmos uma boa qualidade democrática” e “um fortalecimento institucional, para que nunca mais voltemos a ser um pária internacional — objetivo expressamente vocalizado por certo expoente de uma certa doutrina”.
Ele se referia a Ernesto Araújo, que durante a gestão Bolsonaro exerceu o cargo de ministro das Relações Exteriores. Em 2020, quando a atuação diplomática do Brasil era criticada por outras nações, o chanceler alegou que seria positivo o status de “pária internacional”.
O decano do STF ainda opinou sobre as falhas na segurança para conter os atos golpistas de 8/1. “Acho que houve excesso de tolerância com o fato de pessoas se manifestarem perante os quartéis e pedirem uma intervenção militar, o que tem de ser tido como anômalo”, salientou. Bolsonaristas acampavam em frente ao Quartel-General do Exército desde outubro, após as eleições.
Ele ainda constatou “um certo relaxamento depois da posse” do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), ocorrida no dia 1º/1, e enfatizou episódios de dezembro que já alertavam o perigo dos golpistas: a queima de carros no centro de Brasília e a tentativa de invasão ao prédio da Polícia Federal.
Gestão perigosa
Gilmar também se manifestou quanto ao relato do senador Marcos do Val (Podemos-ES), feito nesta quinta-feira (2/1), sobre o possível envolvimento de Bolsonaro em uma trama golpista para reverter o resultado das eleições presidenciais do último ano.
Para o ministro, o episódio “mostra que a gente estava sendo governado por uma gente do porão. Esse é um dado da realidade. Pessoas da milícia do Rio de Janeiro, com contato na política internacional, isso é o que resulta quando vemos a nominata desses personagens”.
Em entrevista ao jornal português Expresso, o magistrado também não perdeu a oportunidade de criticar o ex-ministro da Justiça e Segurança Pública de Bolsonaro e ex-juiz Sergio Moro: “No Brasil, produzimos uma situação muito singular de ter um combatente da corrupção, que gosta muito de dinheiro, que facilita a vida de uma empresa americana e depois se emprega nessa empresa”. Ele se referia à consultoria Alvarez & Marsal, que prestou serviços a empresas investigadas pela “lava jato”.
Com informações da Conjur