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Justiça paulista anula despejo por meio de arbitragem

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Justiça de São Paulo anulou uma sentença de arbitragem que determina o despejo de um inquilino de um imóvel alugado pela plataforma on-line Quinto Andar. Em tese, o locatário não teria pago o aluguel. A decisão serve de alerta para o setor imobiliário, em que a previsão arbitral tem sido cada vez mais usada, devido à rapidez na resolução de disputas ante o Judiciário.

De forma incomum, o juiz Guilherme de Paula Nascente Nunes, da 2ª Vara Empresarial e Conflitos de Arbitragem do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP), aplicou o Código de Defesa do Consumidor (CDC) ao caso. Na visão dele, como a cláusula compromissória (arbitragem) foi imposta, prevalece a relação de consumo entre as partes, mais do que de aluguel, pelos aspectos tecnológicos da imobiliária. Na prática, a aplicação do CDC facilita a defesa do inquilino, visto então como consumidor.

Advogados destacam que o entendimento majoritário do Judiciário é pela manutenção de sentenças arbitrais. A pesquisa Arbitragem em Números mais recente, feita pela professora Selma Lemes, indica que menos de 5% das decisões arbitrais são contestadas na Justiça. Dessas, menos de 1% são anuladas.

A sentença chama a atenção porque, quando o assunto é despejo, alguns juízes estariam aplicando “de forma incorreta” um precedente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), segundo especialistas. Nesse recurso, o relator, Luís Felipe Salomão, disse que “não parece adequada a jurisdição arbitral para decidir a ação de despejo”, pela sua natureza executiva (REsp nº 1.481.644).

O caso julgado nesta semana pela Justiça paulista iniciou em agosto de 2023, quando proprietários de um imóvel – Oliveiros Baptista Botelho e Terezinha de Souza Botelho – moveram uma ação contra o inquilino Allan Novaes de Moraes por ter descumprido uma sentença arbitral. A ordem de despejo foi decretada contra Moraes, que teria se recusado a deixar o imóvel pois já teria honrado a dívida.

O locatário também alega ser preciso preservar a função social do contrato e o princípio da dignidade da pessoa humana. Pede ainda aplicação de multa por litigância de má-fé aos donos do apartamento por “alterar a verdade dos fatos”.

O juiz acatou o argumento de Moraes. Para o magistrado, como “toda a relação entre locador e locatário é intermediada pela empresa Quinto Andar”, a imobiliária “assume o verdadeiro protagonismo como agente negociador” e “o imóvel locado passa a ser um acessório, e não o objeto principal”. “O enfoque de sua operação é a tecnologia aplicada às relações locatícias”, afirma Nunes, na sentença (processo nº 1106057-16.2023.8.26.0100).

Ainda há a particularidade de a cláusula arbitral não ter tido o devido destaque no contrato de locação, o que “manifesta a vulnerabilidade típica das relações de consumo, que acaba por impor ao consumidor, locatário, uma arbitragem compulsória”.

O juiz indica ainda não haver prova de que o inquilino foi devidamente citado na ação arbitral. “As 1ª e 2ª Varas Empresariais da Capital transformaram-se em meros executores de sentenças proferidas em procedimentos arbitrais promovidos pelo Quinto Andar, sempre realizados nas mesmas Câmaras Arbitrais e, curiosamente, sempre à revelia da parte executada”, completa.

Para o advogado e árbitro Gabriel de Britto Silva, membro da comissão de arbitragem da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Rio de Janeiro (OAB-RJ), o juiz aplicou de forma incorreta o precedente do STJ para afastar a jurisdição arbitral da ação de despejo. Segundo ele, o processo envolvia uma a desocupação de loja de shopping que já tinha sido abandonada sem o pagamento do aluguel.

Não haveria sentença arbitral a ser cumprida, segundo Silva, apenas a imissão de posse para o proprietário do imóvel, o que caberia a um juiz e não a um árbitro emitir. “A via arbitral não teria competência para isso”, diz. “Infelizmente, todas as decisões desfavoráveis ainda existentes citam a decisão do STJ sem fazer a efetiva distinção entre o caso concreto e o comum das rotineiras ações de despejo”, adiciona.

Britto fez um levantamento indicando 32 decisões proferidas pela Justiça estadual sobre o tema, entre os anos de 2023 e 2024. Do total, apenas oito anularam sentenças arbitrais, negando que ordem de despejo possa ser feita por essa via. O advogado, especializado em direito imobiliário, lembra que as cláusulas compromissórias também têm um aspecto e efeito econômico. “Sua anulação de forma superficial pelos tribunais aumenta o risco e desaquece o setor”, completa. As informações são do Valor Econômico.

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