Pela primeira vez no país, a Constituição Federal e a Lei Maria da Penha terão edições em idioma indígena. A iniciativa, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), está sendo coordenada pelo presidente da Biblioteca Nacional, Marco Lucchesi, e pelo professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) José Ribamar Bessa.
Quinze tradutores indígenas estão trabalhando em uma tradução da Constituição para o nheengatu, língua de origem tupinambá falada por diversos povos que vivem na região amazônica e a previsão é que o seja concluído em outubro, com o lançamento da obra em uma cerimônia na cidade de São Gabriel da Cachoeira (AM).
A tradução da Lei Maria da Penha para idiomas indígenas atende a uma demanda apresentada pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJ-MT) e, segundo Lucchesi, essas iniciativas são apenas o começo.
“Como o nheengatu tem uma relação importante com a língua portuguesa, no sentido de ser permeável, a gente vai dar uma ampliação maior no diálogo com a perspectiva jurídica”. Lucchesi destaca também duas questões associadas a essas iniciativas: disseminar o direito e dar protagonismo às línguas originárias.
O nheengatu é conhecido como língua geral amazônica. Ela começa a se formar espontaneamente por meio do contato entre indígenas de diferentes etnias nos aldeamentos coloniais, mas passa por diversas transformações por influência dos portugueses, sobretudo dos missionários religiosos que buscaram gramatizá-la e padronizá-la.
No livro Introdução ao Estudo das Línguas Crioulas e Pidgins, o pesquisador Hildo Couto define o nheengatu como idioma cujo léxico é constituído a partir do tupi, enquanto a gramática se aproxima do português.
AMPLIAÇÃO DO ACERVO DA BIBLIOTECA NACIONAL
As traduções se alinham com um dos focos de atuação da Biblioteca Nacional sob sua gestão: aumentar o acervo da instituição relacionado aos povos indígenas e outras populações tradicionais do país. São quase 300 línguas no Brasil, segundo o IBGE [Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística].
A ampliação do acervo já está em andamento. A instituição está guardando fotos de populações do Vale do Javari, no Amazonas, produzidas no mês de março durante expedição que contou com a participação de Luchesi. Além disso, nos próximos dias, serão recebidas cópias de cartazes elaborados pelo TJ-MT que trazem informações importantes das línguas maternas de vários povos indígenas.
“A Biblioteca Nacional é o espelho da memória do país. Se o Brasil desaparecesse e a Biblioteca Nacional ficasse, ela teria a capacidade de especular, refletir e devolver a imagem do país, porque aqui existem vários brasis. Ela tem aqui dentro a polifonia, todas as vozes”, avalia Lucchesi.
Redação Jurinews, com informações da Agência Brasil