A insegurança jurídica paira sobre os professores. Esse foi o alerta do promotor de Justiça Lucas Sachsida durante audiência pública promovida pela Comissão de Educação da Câmara dos Deputados. Representando a Câmara de Direitos Sociais e Fiscalização de Atos Administrativos em Geral do Ministério Público Federal (1CCR/MPF) no debate, ele destacou que não é apenas a possibilidade do reajuste do piso nacional que está sendo questionado, mas a própria existência do piso.
Membro do Grupo de Trabalho Interinstitucional Fundef/Fundeb da 1CCR, Sachsida lembrou que, sob a falsa premissa de vácuo normativo – a partir de parecer jurídico contratado pela Frente Nacional de Prefeitos (FNP) –, diversos municípios não estão cumprindo a Lei do Piso (Lei 11.738/2008), com base na nova Lei do Fundeb (Lei 14.113/2020), que revogou dispositivos da legislação anterior (Lei 11.494/2007).
De acordo o promotor, a nova lei não regulamenta por inteiro a Lei do Piso ou trata dela, portanto, não a revogou tacitamente. “A falta de regulamentação dos institutos da Lei do Piso pela nova Lei do Fundeb não gera incompatibilidade jurídica. É preciso destacar o princípio da continuidade das leis, pelo qual a norma, a partir da entrada em vigor, tem eficácia contínua, até que outra a modifique ou a revogue”, ressaltou.
Possibilidades
Diante desse cenário, Sachsida apontou dois caminhos para a concreta valorização do magistério e a eficácia plena das normas de regência do Piso Salarial Nacional do Magistério. O primeiro seria o ajuizamento de ação direta de inconstitucionalidade (ADI) com pedido de medida cautelar perante o Supremo Tribunal Federal (STF). O objetivo é assegurar que o parágrafo único do art. 5º da Lei 11.738/2008 (Lei do Piso) – que faz menção à antiga Lei do Fundeb, já revogada, seja interpretado conforme à Constituição.
Nesse sentido, o representante do Ministério Público citou que a 1CCR/MPF já enviou representação ao procurador-geral da República para avaliação do caso. A manifestação foi elaborada pelo GTI Fundef/Fundeb, que reúne membros dos Ministérios Públicos Federal, dos Estados, de Contas e do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União.
O segundo caminho, segundo Sachsida, seria o Parlamento aprovar uma lei modificando a redação do parágrafo único do art. 5º da Lei do Piso, para que o texto remeta à Nova Lei do Fundeb, e não mais à norma anterior, revogada em 2020.
“Defender a valorização do magistério é acastelar a qualidade da educação de milhões de crianças e adolescentes, jovens e adultos, permitindo que os propósitos constitucionais da educação se realizem e, por consequência, os próprios objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil se materializem”, sustentou o promotor durante a audiência pública.
Recado
O promotor alertou, ainda, para o desconhecimento dos princípios constitucionais educacionais pelo Legislativo, o que fica claro no momento de criar normas. Nessa perspectiva, relembrou o atraso no retorno das aulas presenciais na rede pública durante a crise sanitária da covid-19, momento em que não houve edição de normativa superior. A omissão legislativa, segundo ele, levou o Ministério Público a ajuizar diversas ações civis públicas para garantir o retorno e a igualdade aos alunos das escolas públicas.
O promotor também mencionou a contradição de excluir a psicologia e o serviço social da lista de categorias de profissionais da educação básica passíveis de serem atendidas pelo Fundeb, enquanto se discute, por outro lado, a inclusão de seguranças armados, principalmente após as ações de violência contra escolas.
Por fim, Lucas Sachsida criticou a aprovação da Emenda Constitucional 114/2020, que dispõe expressamente sobre a possibilidade de pagamento de abono sem qualquer condicionante. “Criou-se, assim, um pano de fundo e um palco para o descumprimento do piso salarial dos professores. O abono passou a ser o prêmio da má gestão”, advertiu o promotor.
Segundo ele, é necessário definir melhor o que é o abono e em que condições ele deve ser pago. “É preciso estabelecer o que é, de fato, uma sobra de dinheiro, definir melhor quem são os profissionais de educação, e terminar com as inseguranças jurídicas criadas por alguns dispositivos legais”, concluiu.
Com informações do MPF