O racismo estrutural, internalizado nas práticas cotidianas do Sistema de Justiça, tem se manifestado de maneira implícita, tolerada e frequentemente não reconhecida, segundo a pesquisa “Características do racismo estrutural (re)produzido no Sistema de Justiça: uma análise das discriminações raciais em tribunais estaduais”.
O estudo, parte da 6.ª edição da série Justiça Pesquisa, foi apresentado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) durante o Seminário de Pesquisas Empíricas aplicadas às Políticas Judiciárias, em Brasília.
A pesquisa revelou que pessoas negras enfrentam barreiras desde o ingresso em carreiras jurídicas até a atuação profissional. Embora representem 55,5% da população brasileira, pretos e pardos ocupam menos de 15% da magistratura e apenas 30% das posições de servidores no Judiciário.
Entre os estagiários no setor público, representam 41%, mas frequentemente enfrentam discriminações e restrições em oportunidades, além de tarefas mecânicas e de menor valorização.
“A pesquisa demonstra que as cotas para ingresso são apenas parte do problema. Mesmo ocupando cargos de autoridade, profissionais negros continuam vivenciando discriminações frequentes”, afirmou Paulo Eduardo Alves, professor da USP.
O estudo apontou a ocorrência de microagressões e racismo recreativo, com episódios de desqualificação, tratamento diferenciado e restrições no acesso a espaços institucionais. Além disso, há desafios no acesso ao ensino superior e no preparo para concursos, onde as condições são mais desiguais para candidatos negros.
Gabriel Matos, secretário de Estratégias e Processos do CNJ, destacou que a questão é uma prioridade da gestão do ministro Luís Roberto Barroso, com foco no ingresso na magistratura e na gestão interna dos tribunais.
Os resultados da pesquisa embasaram diretrizes para mitigar o racismo estrutural no Judiciário, incluindo:
- Reconhecimento do racismo institucional por operadores do direito em todos os níveis.
- Fortalecimento das políticas de cotas, com reserva mínima de vagas em concursos e flexibilização de notas mínimas.
- Criação de comitês permanentes de políticas antirracistas.
- Inclusão do tema “Direito e Relações Raciais” no Exame Nacional da Magistratura.
Karen Luise de Sousa, juíza auxiliar da Presidência do CNJ, ressaltou que o trabalho busca estruturar políticas efetivas e de longo prazo para transformar a realidade institucional.
A pesquisa foi realizada por especialistas da USP e da UFF, com base em entrevistas, observações e dados fornecidos pelo CNJ. Para Gislene Aparecida dos Santos, professora da USP, o estudo “contribui enormemente para a compreensão de como o racismo institucional funciona no país”.
Marco Adriano Fonseca, da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), destacou que enfrentar o racismo estrutural é essencial para construir uma sociedade pluralista e inclusiva, conforme prevê a Constituição Federal.
Redação, com informações do CNJ