O legislador municipal não pode, a pretexto de suplementar a legislação federal, invadir a competência de ente federativo superior. O entendimento é do Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) ao julgar inconstitucional uma lei de Jundiaí, de autoria parlamentar, que criava um cadastro municipal de doadores de órgãos.
A ação direta de inconstitucionalidade foi proposta pela Prefeitura de Jundiaí, afirmando que já existe legislação federal que regulamenta o cadastro de doadores de órgãos no país e, desse modo, não caberia à Câmara Municipal legislar sobre a matéria. O relator, desembargador Vianna Cotrim, julgou a ação procedente.
“A inconstitucionalidade decorre da usurpação da competência da União para dispor sobre regra geral de proteção e defesa da saúde, de sorte que o Poder Legislativo local invadiu a esfera de competência legislativa da União e do Estado, prevista no artigo 24, XII e §§ 1° e 2°, da Constituição Federal, violando o princípio federativo, e, consequentemente, normas de reprodução obrigatória pelos municípios”, pontuou.
O magistrado ressaltou que, pela técnica adotada na Constituição Federal, compete à União a criação de normas gerais e, aos Estados e ao Distrito Federal, a edição de normas específicas para adaptar as diretrizes gerais às peculiaridades regionais. Nesse cenário, aos municípios, cabe somente a suplementação da legislação federal e estadual no que couber, de forma restrita a assuntos de interesse local.
“Conquanto louvável o intento do legislador em relação ao tema, a Lei 9.736, de 25 de março de 2022, do município de Jundiaí viola, efetivamente, o artigo 144, da Constituição Bandeirante, porquanto inexistente qualquer interesse local na norma impugnada”, completou Cotrim, destacando a existência de lei federal sobre o mesmo assunto.
Na legislação, afirmou o relator, a União concedeu aos Estados a organização, a coordenação e a regulação sobre as atividades de doação e transplante de órgãos em seu âmbito de atuação, inclusive a gerência do cadastro de doadores, afastando qualquer competência municipal para tratar sobre a temática.
“Com efeito, incabível que o município, sob a justificativa de complementar a legislação dos demais entes, neutralizá-la, ignorando que a temática já foi tratada, no âmbito da competência das outras pessoas políticas, de forma a dispor de forma dissonante do arcabouço jurídico já existente”, finalizou o desembargador.
Com informações da Conjur