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POR DEZ MULHERES: Juiz trabalhista é acusado de assédio sexual dentro de fórum e redes sociais

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Marcos Scalercio, juiz substituto do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT-SP) e professor de direito material e processual do trabalho, está sendo acusado por ao menos dez mulheres de assédio sexual entre 2014 e 2020. As informações são do G1.

Todas as denúncias chegaram ao conhecimento do Me Too Brasil, organização sem fins lucrativos que oferece assistência jurídica gratuita a vítimas de violência sexual. Três mulheres procuraram diretamente a ONG para formalizar e levar à frente as denúncias contra Scalercio.

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em Brasília, e o Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3), em São Paulo, apuram essas três acusações contra o juiz, respectivamente, nas esferas administrativa e criminal.

Dez mulheres

Os relatos foram divulgados inicialmente nas redes sociais, e só depois chegaram ao Me Too Brasil. As denunciantes, que não querem ser identificadas por temerem represálias, são: uma funcionária do TRT, uma advogada, uma estagiária de direito, seis alunas do cursinho Damásio à época, e uma professora de direito – com quem a reportagem conversou.

Algumas das mulheres postaram e compartilharam prints das conversas que alegam ter tido com ele e que, segundo elas, comprovam os assédios sexuais cometidos por Scalercio. As fotos dos diálogos foram divulgadas em grupos fechados de concursos públicos voltados a mulheres, compartilhadas entre as próprias vítimas e também acabaram encaminhadas ao Me Too Brasil.

Das dez mulheres, três delas acusam o magistrado de 41 anos de agarrá-las e beijá-las à força dentro do seu gabinete no Fórum Trabalhista Ruy Barbosa, na Barra Funda, Zona Oeste da capital, ou em uma cafeteria próxima ao cursinho, no Centro.

Outras sete vítimas também relatam que ele usou as redes sociais para assediá-las, tendo comportamento inapropriado e enviando mensagens com conotação sexual.

Assédio sexual é crime no Brasil. Pode ocorrer em um contexto em que há relação hierárquica entre o agressor e a vítima, no qual ele a constrange, geralmente no ambiente de trabalho, seja usando palavras ou cometendo ações de cunho sexual, sempre sem o consentimento da pessoa, como um beijo ou um toque forçados, por exemplo.

Denúncias começaram na internet

As denúncias de assédio contra o juiz começaram em 2014, mas só começaram a ser discutidas entre as vítimas em 2020. Primeiro pela internet, quando vítimas que não se conheciam começaram a citar o nome de Scalercio em pelo menos dois grupos fechados de discussão voltados a concursos públicos para mulheres. Elas o definiam como assediador sexual.

Em um desses grupos, a organizadora pedia às concurseiras que a seguiam que enviassem as postagens que haviam feito anteriormente com denúncias contra o magistrado. Ao descobrirem que outras mulheres denunciaram o juiz por assédio, três das vítimas que procuraram o Me Too Brasil decidiram dar sequência às denúncias. As queixas seguiram então para os órgãos competentes apurarem.

O Me Too Brasil, ou o “Eu Também” (na tradução do inglês), foi criado em 2020 no país, inspirado pelo movimento que nasceu nos Estados Unidos em 2017, depois de uma série de denúncias contra o produtor Harvey Weinstein, acusado por dezenas de mulheres de abuso sexual e estupro. Desde então, a ONG combate assédio e abuso sexual prestando assessoria jurídica gratuita a mulheres por meio de profissionais voluntários.

A organização levou as acusações das três mulheres contra o juiz para o Projeto Justiceiras e a Ouvidoria das Mulheres do Ministério Público, em Brasília, com os quais tem parceria. A Ouvidoria acionou depois as autoridades responsáveis para que as denúncias fossem investigadas.

Pelo fato de os membros da Justiça do Trabalho terem competência federal nas suas atribuições, eventuais violações cometidas por eles são apuradas por órgãos federais. Se for considerado culpado no âmbito administrativo, o magistrado poderá ser exonerado do cargo, suspenso, afastado ou advertido. No aspecto criminal, condenados por assédio sexual podem ser punidos com até dois anos de prisão.

O que dizem o juiz e sua defesa

g1 procurou a defesa de Scalercio para comentar o assunto, mas o advogado Fernando Capano, que o defende, informou que ele e seu cliente não iriam comentar o assunto por enquanto. “No caso em apreço, não iremos nos manifestar neste momento”, afirmou Capano.

A reportagem apurou que a defesa de Scalercio negou todas as acusações na Justiça e continua trabalhando como juiz e ainda é professor.

Apuração administrativa

A Corregedoria do Conselho Nacional de Justiça, em Brasília, vai apurar se Scalercio cometeu alguma infração disciplinar como juiz por conta das denúncias de assédio sexual. Existe a possibilidade de que o caso comece a ser analisado a partir desta terça-feira (16) por vários magistrados. Eles decidirão se abrem um Processo Administrativo Disciplinar (PAD) contra o juiz do trabalho ou não.

A lei da magistratura determina que juízes devem manter conduta irrepreensível na vida pública e também na particular. “A Corregedoria Nacional de Justiça informa que os fatos relacionados ao juiz Marcos Scalercio estão sendo apurados no Pedido de Providências”, que “tramita sob segredo de justiça”, de acordo com trecho da nota do CNJ encaminhada ao g1.

O CNJ vai apurar as denúncias contra o juiz depois que a Corregedoria do TRT-SP arquivou por duas vezes as acusações contra Scalercio. Por determinação do Tribunal Superior do Trabalho (TST), a Corregedoria Nacional de Justiça do Conselho Nacional de Justiça irá analisar mais profundamente o caso e revisar os trabalhos feitos pelo órgão do TRT.

Em dezembro do ano passado, um corregedor do Tribunal Superior do Trabalho fez críticas ao arquivamento. O Tribunal Regional do Trabalho analisou os depoimentos das três mulheres que procuraram o Me Too Brasil para acusar Scalercio de assédio. São elas: a funcionária do TRT que o acusou de assediá-la no gabinete, a ex-aluna do Damásio que disse que ele a agarrou numa cafeteria e a advogada que falou ter sido chamada de “assexuada” pelo juiz numa troca de mensagens por celular.

Além disso, testemunhas e juízas ouvidas pelo órgão disseram saber de mais denúncias de crimes sexuais contra o magistrado.

Mas, mesmo diante dessas acusações contra Scalercio, a maioria dos desembargadores do TRT em São Paulo seguiu a posição do relator, que arquivou o caso em meados de 2021. Ele era corregedor do tribunal e analisou a Reclamação Disciplinar (RD) contra o magistrado. A maior parte dos magistrados decidiu por votação que não havia provas de que o juiz do trabalho cometeu irregularidades durante o serviço e na vida pessoal. E que por este motivo não iriam abrir um Procedimento Administrativo Disciplinar para investigá-lo.

O resultado do TRT seguiu para apreciação do CNJ, que não concordou com o arquivamento das denúncias e determinou nova apuração, desta vez pela corregedoria do próprio órgão, por entender que há indícios de infrações contra o juiz que precisam ser esclarecidas.

Se o CNJ abrir o Processo Administrativo Disciplinar contra o juiz e ele for considerado culpado, as punições possíveis poderiam ir de uma suspensão, um afastamento ou uma advertência até a exoneração do cargo. Além do arquivamento do caso, se o magistrado for inocentado.

“A Corregedoria Nacional informa que o Pedido de Providências […], que tramita sob segredo de justiça, aguarda inclusão em pauta para ser julgado pelo Plenário do CNJ”, diz a assessoria do Conselho Nacional de Justiça.

Apuração criminal

Além disso, o Ministério Público Federal (MPF) do Tribunal Regional Federal da 3ª Região apura desde o ano passado as denúncias de assédio sexual contra Scalercio, mas na esfera criminal.

Ao menos uma das vítimas já foi ouvida pelos procuradores da Procuradoria Regional da República da 3ª Região (PRR-3) do MPF, que investigam juízes com foro. A lei penal prevê pena de até dois anos de prisão em caso de condenação.

O g1 procurou o Ministério Público Federal, que, por meio de sua assessoria de imprensa, confirmou estar apurando as denúncias contra o magistrado, mas informou que como o caso está em sigilo não pode dar declarações sobre a investigação.

“A petição criminal […] continua em trâmite no Tribunal Regional Federal da 3ª Região. No entanto, em razão do sigilo, a Procuradoria Regional da República da 3ª Região, unidade do MPF que atua neste caso, bem como em todos os casos que estejam tramitando perante o TRF3, não pode dar declarações ou informações sobre ela”, informa o MPF.

Procurado pelo g1, o TRF-3 confirmou que o processo criminal contra Scalercio está em apuração no Tribunal Regional Federal, mas que não poderia dar mais detalhes. “O processo tramita em segredo de justiça e não temos acesso às informações”, informa a nota enviada à reportagem pela assessoria do TRF.

Caso a PRR-3 denuncie Scalercio por assédio sexual à Justiça Federal, será aberto um processo criminal contra ele. Por ser magistrado e ter prerrogativa de foro, o juiz seria investigado pelo Órgão Especial do TRF-3. Se o tribunal aceitar uma eventual denúncia, o acusado se tornaria réu.

Com informações do G1

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