O fato de uma lei não ser agradável ou boa não a torna inconstitucional. O entendimento é do Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) que, por maioria de votos, rejeitou arguição de inconstitucionalidade contra a possibilidade de progressão de regime com 1/8 de pena cumprida para mulheres condenadas por crimes hediondos, como tráfico de drogas, que forem gestantes ou mães de crianças pequenas.
A arguição foi suscitada pela 14ª Câmara de Direito Criminal, que contestou a constitucionalidade de parte da Lei 13.769/18. A norma permite a substituição da prisão preventiva por domiciliar da mulher gestante ou que for mãe ou responsável por crianças ou pessoas com deficiência, e também disciplina o regime de cumprimento de pena privativa de liberdade de condenadas na mesma situação.
A Câmara alegou afronta ao artigo 5º, XLIII, da Constituição Federal, que, ao elencar o tráfico de drogas no rol de crimes inafiançáveis e equiparados a hediondos, “explicitou a gravidade extrema dessa conduta, impossibilitando que lei ordinária possa prever tratamento benéfico ao não igualar, mas dispensar melhor e mais célere progressividade a crimes hediondos”. A Câmara falou em violação aos princípios da razoabilidade, proporcionalidade e isonomia.
O pedido foi para que o Órgão Especial declarasse a inconstitucionalidade do artigo 4º da Lei 13.769/18, que alterou o artigo 112 da Lei de Execução Penal, passando a ter a seguinte redação: “§ 3º No caso de mulher gestante ou que for mãe ou responsável por crianças ou pessoas com deficiência, os requisitos para progressão de regime são, cumulativamente: não ter cometido crime com violência ou grave ameaça a pessoa; não ter cometido o crime contra seu filho ou dependente; ter cumprido ao menos 1/8 da pena no regime anterior; ser primária e ter bom comportamento carcerário, comprovado pelo diretor do estabelecimento; não ter integrado organização criminosa.”
Ao rejeitar a arguição, o relator, desembargador Campos Mello considerou que o dispositivo não afronta a ordem constitucional. “A finalidade da lei não é a de proteger ou privilegiar as gestantes ou as mães sentenciadas. Muito ao contrário, o que se quer proteger é o nascituro e o infante. Tal proteção tem inequívoca matriz constitucional (artigo 227, caput, da Lei Maior)”, disse.
Para o magistrado, é razoável que as mães e as gestantes condenadas possam cumprir a pena em regime menos gravoso, não em seu próprio benefício, mas para assegurar maior proteção a seus filhos. “Aliás, a progressão, em si mesma, nada tem de desproporcional”, pontuou o desembargador.
Mello lembrou que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 1.327.963, já definiu que está no âmbito das atribuições do legislador ordinário o estabelecimento de critérios temporalmente diversos para que possa ser exercido o direito de progressão de regime.
“Então, parece claro que o estabelecimento de critérios temporais diversos para progressão de regime de pena, ainda por quem tenha praticado crime hediondo, não é algo que tenha o condão de tornar inconstitucional o dispositivo legal que o determine, máxime, como na espécie, em que tal determinação reflete imperativo que, como visto, é de índole constitucional”, completou.
Além disso, o relator disse que o Superior Tribunal de Justiça já permitiu a progressão de regime de uma mulher condenada por associação ao tráfico, que havia cumprido 1/8 da pena em regime fechado, sem cogitar eventual inconstitucionalidade (AgRg no HC 679.715), “o que demonstra que a Corte à qual compete a padronização do direito federal infraconstitucional reconheceu a juridicidade dessa progressão”.
Com informações da Conjur