A ministra Assusete Magalhães, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), reafirmou entendimento da Corte de que optometristas, mesmo com graduação de ensino superior em optometria, não podem realizar exames de vista, diagnóstico de patologias e prescrição de lentes de grau. Na decisão, a ministra sublinhou que estes atos são privativos de médico oftalmologista e que este também é o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF).
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Na avaliação do STJ, estão em vigor os decretos 20.931/32 e 24.492/34, que não permitem aos optometristas atendimento de pessoas para diagnosticar doenças, prescrever medicamentos ou lentes de grau, fazer exame de vista ou praticar outras atividades privativas do profissional médico oftalmologista. Esse posicionamento também é defendido pelo Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO) e pelo Conselho Federal de Medicina (CFM).
BACHAREL
O caso chegou ao STJ, este ano, depois que um bacharel em optometria do município de Seara (SC), que teve o seu consultório interditado pela vigilância sanitária municipal, em 2006, ajuizou ação, naquele ano, requerendo que fosse anulada a decisão do fechamento de seu estabelecimento. Ele alegou que optometristas podem realizar exames de vista e prescrição de lentes de grau.
A interdição do local foi feita pela vigilância com a justificativa de que, no local, havia o exercício ilegal da profissão de médico. O optometrista ainda requereu indenização por danos morais e lucros cessantes, pois, de acordo com ele, houve prejuízos financeiros em razão do fechamento de seu consultório.
IMPROCEDENTE
Durante a tramitação do processo, em 2011, a Justiça julgou improcedente todos os requerimentos do optometrista denunciado. Porém, ele recorreu ao Tribunal de Justiça do Espírito Santo, que, em 2022, acolheu os requerimentos dele, decidindo pela anulação da decisão que determinou a interdição do seu consultório.
No entanto, o município de Seara (SC) recorreu ao STJ e a ministra Assusete Magalhães julgou o recurso do município, em maio deste ano. O Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO) comemorou a decisão. A entidade afirma que, apenas em 2022, contabilizam-se 20 liminares deferidas e oito sentenças favoráveis ou parcialmente favoráveis. Em 2023, os números permanecem crescendo, passando a 15 liminares deferidas e 11 sentenças favoráveis ou parcialmente favoráveis até o presente momento.
ADPF
A ilegalidade do pedido de exames, consultas e prescrição de lentes por optometristas foi definida pelo STF ao acolher a argumentação do Conselho Federal de Medicina (CFM) e Conselho Brasileiros de Oftalmologistas (CBO) no julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 131, ajuizada pelo Conselho Brasileiro de Óptica e Optometria (CBOO).
Com a decisão, o que restou permitido aos optometristas com graduação em instituição de ensino superior reconhecida pelo MEC (bacharéis ou tecnólogos) é a instalação de consultório para atendimento de clientes, restringindo-se a somente: aviar/executar fielmente prescrições médicas; indicar e confeccionar lentes de grau mediante prescrição médica; e escolher ou permitir escolher ou aconselhar o uso de lentes de grau sem emitir qualquer prescrição ou receita, tendo em vista que atos continuam sendo privativos de médicos.
Confira aqui o acórdão do julgamento da ADPF 131
Após 12 anos de tramitação, os ministros da Corte proibiram aos optometristas a instalação de consultórios, confecção e venda de lentes de grau sem prescrição médica, escolha, permissão de escolha, indicação ou aconselhamento sobre o uso de lentes de grau e fornecimento de lentes sem apresentação da fórmula de ótica de médico.
“A decisão mostra o acerto da estratégia montada pelo CFM de, a partir de um grupo de trabalho formado por advogados do sistema de conselhos de medicina e das sociedades médicas, atuar em todas as frentes jurídicas na defesa do ato médico”, destaca o presidente do CFM, José Hiran Gallo.
Segundo ele, os documentos apresentados pelo CFM e pelo CBO confirmaram informações de que os profissionais estariam excedendo suas atribuições ao realizar exames, consultas e prescrever lentes, o que é vedado pela legislação que se aplica ao profissional optometrista.
MATURIDADE DO STF
Na avaliação do presidente do CBO, Cristiano Caixeta Umbelino, “o resultado mostra a maturidade do Supremo em relação à defesa da saúde da população. Há claramente a percepção de que uma lei não perde sua relevância naquilo que lhe é mais caro: a defesa da população e de sua saúde ocular. Erros refrativos são patologias e precisam ser diagnosticados e tratados por médicos”, destacou Umbelino.
O responsável pela Coordenação Jurídica do CFM, advogado Alejandro Bullon, participou de sustentação oral no STF sobre o caso. Na oportunidade, alertou que profissionais que praticam ilícitos penais colocam em sério risco a saúde da população como um todo. Além disso, ele explica que a decisão do Supremo resguarda a saúde da população brasileira e exalta a lei do ato médico, onde o médico é o único profissional capacitado e autorizado legalmente para realizar o diagnóstico nosológico e trate doenças.
Para o CFM e o CBO, essa decisão corrobora a legislação e abre um importante precedente favorável à medicina brasileira. “Sem sombra de dúvidas, o maior beneficiado dessa decisão é o paciente, que vai poder ter a certeza de que a pessoa que está cuidando da sua saúde ocular é um profissional qualificado, responsável e seguidor de todos os preceitos éticos e morais que regulamentam a medicina”, ressaltou o presidente do CBO.
ENTENDA O CASO
A ADPF nº 131 questionava os Decretos Presidenciais nº 20.931/32 (artigos 38, 39 e 41) e nº 24.492/34 (artigos 13 e 14), que fazem restrições ao exercício profissional dos optometristas. Sustentava o CBOO que estes dispositivos não foram recepcionados pela Constituição Federal de 1988, porque os valores sociais do trabalho e a garantia da liberdade de ofício ou profissão estariam sendo ofendidos, uma vez que estabelecem ser ato privativo do médico o atendimento à saúde visual.
Pretendia o autor da ADPF, portanto, a declaração de inconstitucionalidade dos decretos e sua não receptividade pela nova ordem constitucional. Instada a se manifestar, a Advocacia Geral da União sustentou ao STF que a legislação brasileira não impede exercício profissional de nenhuma categoria de trabalhador, inclusive na área de saúde, “desde que atendidos os requisitos legais”.
Ao longo do julgamento da ADPF, que teve início em 19 de junho, a maioria da Corte acompanhou a relatoria do ministro Gilmar Mendes, pela improcedência da arguição. No entendimento dos magistrados, os decretos estão alinhados com o texto constitucional, tanto para a autorização da liberdade profissional, desde que atendidas as qualificações que a lei estabelece, quanto para a competência privativa da União de legislar sobre condições para o exercício de qualquer profissão.