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A FACE DA HISTÓRIA: Juiz pardo impedido de tomar posse desabafa: “Não sou branco e não tirei vaga de ninguém. Serei um juiz exemplar”   

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Tarcísio Francisco Regiani Júnior jamais imaginou que o sonho de ser juiz se transformaria em um pesadelo após 11 anos de estudos e muita dedicação para alcançar o tão desejado cargo.

Autodeclarado pardo e aprovado em vaga destinada a cotas no concurso para juiz substituto do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ), ele foi impedido de ser empossado por decisão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que considerou “sem nenhuma sombra de dúvida” que o candidato é um cidadão branco e que não preenche os requisitos necessários para a vaga de cotista.

“Estou perplexo com tudo isso, indignado com a condenação pública que estou sofrendo e frustrado em não poder assumir o cargo para o qual fui aprovado”, revelou em entrevista exclusiva a JuriNews.

Natural de Vila Velha (ES), 36 anos, casado, pai de uma filha, servidor público estadual, Tarcísio Regiane Júnior resolveu falar pela primeira vez, após a decisão do Plenário do CNJ na última terça-feira (24). O caso teve uma grande repercussão no país desde a suspensão da sua posse no dia 18 de maio.

 “Não sou uma pessoa branca e isso foi devidamente comprovado pela Comissão de Heteroidentificação do concurso. Das 10 vagas previstas para cotas, apenas 5 foram preenchidas, ou seja, não tirei a vaga de ninguém. Em concurso para juiz, com exceção da primeira fase, nas várias fases seguintes não há um critério diferenciado de avaliação por ser candidato cotista”, afirmou.

Segundo ele, toda a celeuma relacionada à sua autodeclaração como uma pessoa parda somente foi iniciada na fase final do concurso. “Todos os 5 candidatos aprovados por cotas se submeteram a uma avaliação da comissão de Heteroidentificação e tiveram suas inscrições deferidas. Até que eu e outra colega fomos impugnados questionando nossa autodeclaração. Foi aberto um processo administrativo e uma das médicas da comissão atestou nossa cor de acordo com a fenotipia (características físicas), que é o critério legal em que se baseia o Estatuto da Igualdade Racial. Após isso, seguimos para a prova oral e todos os 5 foram devidamente aprovados”, relembra.

Para sua surpresa, um dia antes da posse, veio a liminar do CNJ suspendendo o ato. “Meu mundo desabou. Como dizer que eu sou uma pessoa branca? Não usei de nenhum artifício para entrar como cotista. Submeti-me a todas as avaliações e isso foi devidamente comprovado pelo laudo pericial médico, além do meu sentimento de pertencimento. Sou uma pessoa parda, sinto-me assim e sempre fui identificado dessa forma”, desabafa.

Regiani Júnior conta ainda que em 2018 prestou concurso para juiz do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) também na condição de candidato pardo e foi aprovado pela comissão de Heteroidentificação daquele certame. “Também tive minha inscrição deferida como cotista no concurso do TJ-SP, mas fui reprovado na prova oral. Agora que consegui querem me impedir de ser empossado. Confio na Justiça e vou assumir minha vaga que consegui legalmente e honestamente, diz.  

“TENHO ORGULHO DA MINHA HISTÓRIA”, DIZ REGIANI

A repercussão do caso, tanto pela decisão do CNJ de impedir sua posse quanto pela condenação pública como alguém que tentou burlar o sistema de cotas para levar vantagem, trouxe muita dor a Regiani nos últimos dias. No entanto, segundo ele, o caso serviu para mostrar sua história de vida, de alguém que está sendo injustiçado e que agora luta pelo seu direito de ser empossado.

“Vou ser um juiz exemplar. Foram anos de dedicação, sonhei por muito tempo com o dia da minha posse e acredito que esse dia vai chegar”, contou emocionado.

Regiani também falou da sua família e que sempre foi identificado como uma pessoa parda. “Tenho muito orgulho da minha família, da minha história. Sou filho de uma mulher negra (veja na imagem). Minha mãe foi abandonada e adotada por pais brancos, ela enfrentou o racismo e o preconceito desde muito cedo. Já meu pai é branco, então existe uma miscigenação na minha família. Tenho uma irmã que puxou geneticamente a família do meu pai, mas eu puxei a minha mãe. Por isso, sempre fui identificado como uma pessoa parda”, disse.

Segundo ele, documentos desde a sua infância reforçam a sua cor. “Tem no documento de 1987 da minha primeira escola que minha cor é parda, minha pediatra declarou que eu era uma criança parda, então cresci assim e quem me conhece vê pela coloração da minha pele e tipo do cabelo que eu sou uma pessoa parda. Sempre me senti assim”, detalhou.

O futuro magistrado diz que está preparando sua defesa para recorrer da decisão do CNJ e espera nos próximos dias ser empossado no cargo de juiz substituto do TJ-RJ. “Não sou uma pessoa branca, não me declaro pardo para me beneficiar de nada, estou estudando para concurso há 11 anos e agora não vou aceitar ser injustiçado pela cor da minha pele”, concluiu.

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