O Ministério Público Federal (MPF) voltou a defender, nesta quinta-feira (26), no Supremo Tribunal Federal (STF), que seja possível convocar um novo júri popular quando um réu é absolvido por clemência, sem fundamentação adequada e em contrariedade às provas reunidas no processo. A questão está sendo discutida no âmbito do Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1.225.185, interposto pelo Ministério Público de Minas Gerais, que questiona a absolvição de um homem acusado de tentativa de homicídio, mesmo com o reconhecimento de autoria e materialidade do crime.
O caso, que recebeu status de repercussão geral (Tema 1087), coloca em debate princípios como a soberania do Tribunal do Júri e a possibilidade de apelação de veredictos manifestamente contrários às provas dos autos. A decisão do STF sobre o tema servirá como parâmetro para orientar futuras decisões judiciais relacionadas ao poder do júri e à revisão de absolvições.
Durante a sessão plenária, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, defendeu que a soberania do veredito do júri popular, embora garantida, não protege decisões que sejam claramente contrárias às provas apresentadas no processo. Ele argumentou que a soberania do júri não significa imunidade absoluta, uma vez que decisões infundadas podem ser revertidas em apelação, levando o caso a um novo julgamento. Segundo Gonet, “a decisão dos jurados não pode ser substituída por um juiz togado, mas também não pode ser mantida quando está em flagrante descompasso com as provas.”
Gonet enfatizou que a absolvição sem lastro probatório viola o direito fundamental à vida, uma vez que o Estado tem a obrigação de proteger esse direito, o que inclui punir aqueles que cometem crimes contra a vida. O procurador-geral alertou para os perigos de permitir absolvições por mera clemência, citando, como exemplo, a possibilidade de se ressuscitar a tese de “legítima defesa da honra” em casos de feminicídio, algo já rejeitado recentemente pelo STF.
O julgamento também discute a aplicação do chamado quesito genérico, previsto no artigo 483, III, do Código de Processo Penal, que permite a absolvição do réu sem necessidade de fundamentação. Além disso, a possibilidade de apelação contra decisões do júri que sejam manifestamente contrárias às provas dos autos, conforme o artigo 593, III, d, do CPP, está em análise.
Ao final de sua manifestação, Paulo Gonet destacou que o sistema jurídico brasileiro não acolhe decisões baseadas em compaixão ou outros critérios subjetivos desvinculados das provas apresentadas. Para ele, o julgamento deve sempre ter como fundamento as evidências reunidas no processo, para que a justiça seja feita de forma equilibrada e de acordo com o Estado de Direito.
Com a repercussão geral reconhecida, a decisão do STF sobre esse recurso extraordinário terá implicações diretas sobre a jurisprudência de casos futuros, estabelecendo diretrizes para a atuação dos tribunais de segunda instância em relação a veredictos de júri popular que possam ser considerados contrários às provas dos autos.