O juiz Alexandre Reis Pereira de Barros, titular da 1ª Vara do Trabalho de Pouso Alegre (TRT-MG), afastou o direito à estabilidade no emprego pretendido por uma gestante admitida por contrato de trabalho temporário, nos termos da Lei 6.019/1974.
Não houve dúvida de que a empregada estava grávida quando foi dispensada. Entretanto, de acordo com o julgador, diante da ausência de previsão legal, a garantia de estabilidade provisória à empregada gestante prevista no art. 10, II, b, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) é inaplicável ao regime de trabalho temporário, disciplinado pela Lei 6.019/1974.
Na sentença, foi pontuado que a data da concepção, se antes ou depois da contratação, é irrelevante para o reconhecimento da estabilidade da gestante, nos termos dos artigos 373-A, IV, da CLT, e 2º, I, da Lei 9.029/1995, importando apenas o fato de que, quando dispensada, a autora estava grávida.
Sendo assim, a análise da questão se resumiu à verificação se, tendo firmado contrato de trabalho temporário, a empregada teria ou não direito à estabilidade prevista para a gestante. E, para o juiz, a resposta para essa pergunta é negativa.
Contrato de trabalho temporário X Contrato de trabalho por prazo determinado
A autora invocou a Súmula 244, III, do TST, que reconhece a estabilidade da gestante às empregadas admitidas por contrato por prazo determinado. Mas o juiz afastou a aplicação da Súmula, por se tratar de contrato temporário, regido por legislação específica, no caso, pela Lei 6.019/1974, e não de contrato por prazo determinado, muito menos de contrato por experiência.
Ao expor os fundamentos de sua decisão, o julgador explicou que, no contrato de experiência, e mesmo nas demais modalidades de contrato por prazo determinado, existe a legítima expectativa de sua prorrogação e transformação em contrato por prazo indeterminado. Já no contrato de trabalho temporário, não há essa expectativa, porque ele é feito justamente para atender a situações excepcionais, de necessidade transitória, nos termos do artigo 2º da Lei 6.019/1974.
O magistrado ainda ressaltou que o artigo 10, II, “b”, do ADCT veda “a dispensa arbitrária ou sem justa causa (…) da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto”, o que pressupõe a iniciativa do empregador em romper o contrato.
Registrou que o mesmo não ocorre no contrato de trabalho temporário, uma vez que o fim do contrato, nesta modalidade, se dará pelo fim da “necessidade transitória de substituição de seu pessoal regular e permanente” ou ao “acréscimo extraordinário de serviços“, conforme previsto na legislação específica.
Tratam-se, segundo o juiz, de requisitos previstos em lei e necessários à própria existência da relação contratual entre a empresa fornecedora da mão de obra temporária e a tomadora de serviços, não havendo, portanto, “arbitrariedade” na dispensa.
Conforme constou da decisão, não se pode dizer que o contrato temporário se equivaleria ao contrato por prazo determinadoregulado nos artigos 479 a 481 da CLT. Nessa modalidade contratual, há proteção legal inclusive contra a rescisão antecipada, mediante pagamento deindenização pelo empregador (artigo 479) ou pelo empregado (artigo 480). Essa consequência fundada na CLT é inaplicável ao contrato temporário, o qual constitui modalidade especial, celebrada para atender situação específica, regida por estatuto próprio.
Segundo o pontuado na sentença, a própria Lei 6.019/1974, com as alterações promovidas pela Lei 13.429/2017, em seu artigo 10, parágrafo 5º, estabelece que o trabalhador temporário que prestar serviços pelo prazo máximo legal, contadas as prorrogações permitidas na própria lei, somente pode ser colocado à disposição do mesmo tomador dos serviços depois de 90 dias do encerramento do contrato anterior.
Essa restrição não existenas modalidades de contrato por prazo determinado, o que evidencia, uma vez mais, a incompatibilidade do sistema de trabalhotemporário com qualquer hipótese de prorrogação do contrato para além dos prazos fixados em lei.
O julgador ainda ressaltou não haver lei que obrigue a empresa de trabalho temporário a celebrar outro contrato com eventual tomador de serviços, com o fim de “albergar a empregada pretensamente estável”. Concluiu que, se não há essa obrigação, também por essa razão, não se pode entender pela presença do instituto da estabilidade.
Além disso, na visão do magistrado, a impossibilidade de prorrogar indefinidamente o contrato temporário constitui medida legal que objetiva a proteção do próprio trabalhador, na medida em que impede a utilização abusiva do regime pela empresa, em detrimento da contratação por prazo indeterminado.
“Também não custa lembrar que a própria Lei nº 6.019/1974 elencou os direitos usufruídos pelos trabalhadores temporários, em seu artigo 12, inexistindo previsão legal da estabilidade à gestante”, destacou.
O juiz ainda ponderou que, no julgamento do Incidente de Assunção de Competência nº 0005639-31.2013.512.0051, o próprio Tribunal Superior do Trabalho (TST) ressaltou que o Supremo Tribunal Federal (STF) ainda não se manifestou a respeito da matéria em questão, uma vez que, nos precedentes julgados pela Suprema Corte, não houve exame sobre a aplicabilidade da garantia à gestante ao trabalhador contratado no regime da Lei 6.019/1974, mas às contratações precárias da Administração Pública, a exemplo das ocupantes de cargos em comissão ou das contratações administrativas em regime emergencial temporário.
“Logo, também por tal fundamento, fica afastada a incidência do entendimento constante do item III da Súmula 244 do TST”, destacou.
Conforme esclareceu o magistrado, a ausência de direito à estabilidade não implica ausência de proteção à gestante e à maternidade. “A proteção institucional desses direitos é estabelecida na legislação previdenciária, que assegura à trabalhadora temporária a qualificação de segurada (cf. art. 11, I, “b”, da Lei nº 8.213/1991), sendo devido ainda o salário-maternidade, na forma do art. 30, II, do Decreto nº 3.048/1999”, destacou.
Frisou que, entretanto, não cabe ao empregador arcar com uma obrigação que está prevista em lei, do contrário, haveria grave ofensa ao princípio da legalidade, estabelecido como cláusula pétrea no artigo 5º da Constituição da República.
“Com base em tais fundamentos, a conclusão lógica é a de que, diante da ausência de previsão legal, o instituto da estabilidade provisória da empregada gestante (art. 10, II, “b”, do ADCT) não se aplica ao contrato regido pela Lei 6.019/1974, pelo que rejeito os pedidos, inclusive de condenação da Reclamada no pagamento de indenização por danos morais”, finalizou o julgador.
A trabalhadora interpôs recurso, mas a sentença foi mantida, à unanimidade, pelos julgadores da Segunda Turma do TRT-MG. Não cabe mais recurso. O processo já foi arquivado definitivamente.
Com informações do TRT-MG