A insuficiência de recursos destinados pela União a ações e programas voltados a povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais foi alertada pelo Ministério Público Federal (MPF) nos últimos três anos. Com base em informações técnicas que analisaram os projetos de lei orçamentária anual enviados pelo governo federal ao Congresso Nacional em 2020, 2021 e 2022, o órgão apontou cortes e reduções em diversas iniciativas, e sugeriu aos parlamentares a proposição de emendas que garantissem mais verbas para as políticas públicas de proteção dessas populações.
O acompanhamento do orçamento público da União em relação à temática é feito pela Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais do MPF (6CCR/MPF), colegiado responsável pela coordenação, integração e revisão do exercício funcional dos procuradores da República de todo o país na matéria. A coordenadora do órgão, subprocuradora-geral da República Eliana Torelly, explica que essa análise é importante para identificar eventuais distorções e sugerir melhorias na destinação dos recursos públicos para esses povos.
Em setembro do ano passado, informação técnica elaborada pela 6CCR/MPF apontou redução de cerca de 14,73% no orçamento previsto para o programa de proteção e promoção dos direitos dos povos indígenas, desenvolvido pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai). Em valores nominais, haveria redução de quase R$ 14 milhões, se comparado ao projeto de lei (PL) para a LOA 2022. Destaca-se que o parâmetro de cotejo adotado foi o PL LOA 2022 e PL LOA 2023, pois eram as mesmas peças orçamentárias disponíveis para a devida comparação.
Em relação ao programa de proteção, promoção e recuperação da saúde indígena, financiado pelo Fundo Nacional de Saúde, a redução foi de quase 60%, se comparado ao projeto de lei para a LOA 2022. O orçamento previsto para a iniciativa, que inclui, entre outras ações, o saneamento básico em aldeias indígenas para a prevenção de doenças, era de apenas R$ 665 milhões, conforme PL 32/2022-CN (para a LOA 2023).
Atuação – Para tentar reverter esse quadro, a 6CCR/MPF expediu ofícios e buscou o diálogo com diversos parlamentares. O trabalho de articulação resultou na aprovação, pela Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado Federal, de uma emenda no valor de R$ 115 milhões ao Projeto de Lei Orçamentária Anual 2023 a serem destinados à Funai. O recurso seria voltado à proteção e promoção dos direitos dos povos indígenas. Porém, esse valor não foi mantido na aprovação da Lei Orçamentária, que acabou trazendo aumento em torno de 37% na ação, e o valor aprovado foi na quantia de R$ 53.483.120,00.
Também merece destaque a aprovação de três emendas parlamentares na Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, seguindo propostas feitas pela 6CCR/MPF, totalizando R$ 500 milhões nas áreas de governança fundiária (Incra), promoção e defesa de direitos humanos (MMFDH), saúde indígena (FNS) e direitos dos povos indígenas (Funai). Em relação às emendas em prol dos povos indígenas (R$ 350 milhões), não foram integralmente alocadas, mas certamente influenciou o aumento de 73% para regularização, demarcação e fiscalização de terras indígenas e proteção de povos indígenas isolados (aprovação de R$ 70.075.691,00), e de 161% para o programa de proteção, promoção e recuperação da saúde indígena (R$ 1.593.692.313,00).
Segundo nova informação técnica elaborada pela 6CCR, comparando os recursos inicialmente previstos no projeto de lei orçamentária e os valores efetivamente aprovados para o orçamento de 2023, houve aumento de 55% dos valores destinados à Funai e de 162% ao Fundo Nacional de Saúde para programas e ações direcionadas aos povos indígenas. Isso indica que o Congresso Nacional vem acrescentando recursos orçamentários aos programas e ações nas temáticas de interesse da 6ª Câmara, em comparação às propostas enviadas pelo Executivo.
Para Torelly, “mesmo que o montante final ainda seja insuficiente para a execução de todas as ações e medidas necessárias à proteção dos povos indígenas, a variação positiva verificada no orçamento aprovado pelo Congresso demonstra a importância do diálogo permanente entre o MPF e o Poder Legislativo para a preservação e a garantia dos direitos constitucionais dos povos originários”.
Com informações do MPF