O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), declarou de ofício a remição da pena de um homem que buscava o benefício com base em seu resultado no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). A decisão do ministro estabelece que não há fundamento normativo para exigir pontuação mínima de aprovação no Enem, na modalidade “acesso ao ensino superior”, como condição para a redução do tempo de cumprimento de pena.
O homem, condenado a mais de 14 anos de prisão, havia cumprido 75% da pena no momento da petição inicial. Ele prestou o Enem e obteve aprovação, o que, em tese, lhe daria o direito à remição da pena. Contudo, o juízo de execução indeferiu o pedido, alegando que o réu não havia alcançado nota mínima em nenhuma área de conhecimento do exame, ou seja, não teria obtido a aprovação esperada.
A defesa recorreu, sustentando que as normas referentes ao caso não exigem nota mínima de aprovação no Enem para o ingresso em uma instituição de ensino superior. O pedido, no entanto, foi negado no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e no Superior Tribunal de Justiça. Um Habeas Corpus foi, então, impetrado no STF.
REGRAS OSCILANTES
Ao analisar o caso, Fachin, inicialmente, observou a impossibilidade de admissão do Habeas Corpus, uma vez que foi impetrado contra decisão proferida por membro do STJ, hipótese vedada pela Constituição. Contudo, ele destacou que o STF tem admitido, de forma excepcional em casos concretos, a concessão da ordem de ofício. “No caso dos autos, denota-se a existência de ilegalidade aferível de pronto a autorizar a concessão da ordem (…), nos termos do art. 654, § 2o, do CPP“, anotou Fachin.
Quanto à alegação da defesa sobre a inexistência de fundamento para a exigência da nota mínima, Fachin disse haver uma “dificuldade interpretativa” em relação à regra que prevê remição para presos que prestarem o Enem. “O exame presta-se tanto para remir a pena no caso de certificação do ensino médio, como para remir a pena em hipótese de aprovação para fins de ingresso em ensino superior. A despeito disso, há de se separar as duas situações, bem estabelecendo seus critérios e parâmetros próprios, a fim de que não se restrinja indevidamente a remição de pena sem a devida correspondência normativa“, explicou.
O ministro esclareceu que, de fato, até 2016, o Enem era utilizado tanto para a certificação do ensino médio quanto para o ingresso em cursos superiores. No primeiro caso, havia uma nota mínima de 450 pontos por área de conhecimento. No entanto, as normas definidas pelo Ministério da Educação (MEC) oscilaram desde então, o que gerou a controvérsia.
Em 2025, uma portaria do MEC restaurou a possibilidade de utilização do Enem como exame de certificação do ensino médio. Assim, ressaltou o ministro, houve a reintrodução da exigência de nota mínima apenas para essa finalidade específica, e não para a hipótese de aprovação para acesso ao ensino superior.
“A segunda hipótese, prevista no parágrafo único do art. 3º da Resolução CNJ nº 391/2021, refere-se à aprovação no Enem como ‘modalidade de acesso ao ensino superior, desvinculado da certificação formal do nível médio. Nessa situação, (…) não há previsão normativa de nota mínima uniforme”, prosseguiu Fachin.
“Bem estabelecida essa diferenciação, resta clara a ilegalidade da exigência de nota mínima se o pedido de remição de pena é formulado por apenado já graduado no ensino médio e que, portanto, não reivindica o benefício na modalidade ‘conclusão de etapa educacional’, mas sim na modalidade ‘acesso ao ensino superior’”, concluiu o ministro.