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“Censura indireta”: Justiça nega ação indenizatória de R$500 mil contra humorista Léo Lins

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A 4ª Vara Cível de Novo Hamburgo (RS) negou uma ação indenizatória movida pelo município contra o humorista Léo Lins. A prefeitura pedia a condenação do comediante ao pagamento de R$ 500 mil de indenização por danos morais coletivos, alegando que seu show de stand-up, intitulado “Peste Branca”, continha “piadas ofensivas a diversas minorias”. Contudo, o juiz Daniel Pellegrino Kredens considerou que a liberdade de expressão artística permite a “exploração de temas polêmicos” e que não é possível instaurar uma “censura indireta” ao autor de piadas.

A decisão na esfera cível contrasta com um desfecho judicial recente de Léo Lins. No início de junho, em uma outra ação, de caráter criminal, o humorista foi condenado a oito anos e três meses de reclusão por racismo e discriminação em piadas. A sentença da 3ª Vara Criminal Federal de São Paulo considerou que o show “Léo Lins – Perturbador” incitou discriminação e preconceito contra minorias, afirmando que o exercício da liberdade de expressão não é absoluto e que houve caracterização dos crimes de racismo e capacitismo.

SHOW “PESTE BRANCA”

A ação civil pública em que Léo Lins foi absolvido no RS foi ajuizada pelo município de Novo Hamburgo. A cidade alegou que o comediante teria “ridicularizado” o local com piadas que, supostamente, difamavam autoridades. Também foi argumentado que o show foi marcado por piadas de cunho “racista, capacitista e gordofóbico”, o que teria gerado “ampla revolta popular” entre os cidadãos de Novo Hamburgo, localizado na região metropolitana de Porto Alegre. O município pleiteava uma condenação de R$ 500 mil em indenização por danos morais coletivos, afirmando que “o conteúdo do referido show ofende minorias sociais, propaga preconceitos e fere a dignidade dos cidadãos de Novo Hamburgo”.

LIBERDADE ARTÍSTICA

Ao negar a ação, o juiz Daniel Pellegrino Kredens sustentou que a liberdade de expressão do humorista deve ser protegida, “inclusive quando se traduz em formas de humor ácido e irreverente, que, muitas vezes, desafiam as convenções sociais e provocam desconforto nas audiências“.

O juiz mencionou o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4451, também conhecida como “ADI do Humor”, e pontuou que o humorista pode se expressar de maneira provocativa sem que o Judiciário intervenha de forma prévia ou ostensiva.

No caso do humorista Leonardo Lins, como citado, mesmo que parte da sociedade possa entender suas piadas como agressivas ou de mau gosto, isso não pode ser razão suficiente para que haja uma restrição prévia à sua liberdade de expressão, sob pena de instaurar um mecanismo de censura indireta“, destacou Daniel Kredens na sentença.

A decisão enfatiza que o município não conseguiu provar que o show “Peste Branca” tenha causado comoção social negativa, protestos ou denúncias formais. O magistrado afirmou que, ao longo do processo, não há indícios de “prejuízo concreto” a indivíduos ou grupos. “O Município limita-se a reproduzir trechos de piadas, muitas vezes descontextualizadas, como se o seu conteúdo, por si só, fosse suficiente para ensejar a responsabilização dos réus“, anotou o magistrado.

Kredens ressaltou que não é possível exigir reparação por dano moral coletivo sem demonstrar qualquer impacto real. “A simples antipatia institucional por determinado conteúdo artístico não é suficiente para justificar condenação judicial.”

A decisão também menciona a autonomia do público e o “dever de tolerância democrática”. Segundo o juiz, o público que acompanha a carreira de Léo Lins tem conhecimento do seu trabalho com humor ácido, por vezes politicamente incorreto. Ele sustenta que, quando o público compra o ingresso, já sabe que o show se trata de um “ambiente voltado ao riso, à crítica social e à sátira”.

A solução, em uma sociedade plural e livre, é sempre a escolha individual: quem se sente ofendido com determinado tipo de humor tem todo o direito de não consumir esse conteúdo. Mas não pode impor sua sensibilidade como padrão absoluto à coletividade, tampouco mobilizar a máquina judicial para interditar aquilo que pessoalmente desaprova“, concluiu o juiz da 4ª Vara Cível de Novo Hamburgo.

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