A 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) declarou a nulidade da oitiva de dois adolescentes vítimas de estupro de vulnerável, realizada sem observância do contraditório previsto na Lei 13.431/2017. A decisão foi tomada em Habeas Corpus concedido de ofício e por maioria.
A nova oitiva havia sido determinada pelo Tribunal de Justiça de Goiás (TJ-GO) após a retratação da enteada do acusado em outro processo criminal. A defesa solicitou que os adolescentes fossem ouvidos novamente para esclarecer a veracidade das acusações feitas contra o pai quando tinham 11 anos, o que resultou na condenação do réu em primeiro grau.
DILIGÊNCIA PARA DEPOIMENTO ESPECIAL
O relator da apelação determinou a realização dos novos depoimentos na presença de psicólogos do Judiciário, que auxiliariam na formulação das perguntas. No entanto, a diligência não seguiu o rito do artigo 12 da Lei 13.431/2017, que estabelece proteção especial para crianças e adolescentes vítimas ou testemunhas de violência.
A norma prevê que, após o depoimento especial, o juiz deve consultar Ministério Público, defesa e assistentes técnicos sobre a necessidade de perguntas complementares, cuja pertinência será avaliada. No caso, a oitiva foi conduzida por um único servidor, sem a participação das partes. A defesa manifestou discordância, mas o procedimento resultou em um relatório em que os irmãos e a mãe eximiram o acusado dos crimes.
O TJ-GO, contudo, considerou que os novos depoimentos eram insuficientes para desconstituir aqueles prestados durante a instrução processual, pois a retratação ocorreu anos depois e estava isolada das demais provas.
FALTA DE CONTRADITÓRIO
O ministro Sebastião Reis Júnior destacou que o TJ-GO não era obrigado a permitir a nova oitiva das vítimas e da mãe. No entanto, ao autorizá-la, deveria ter seguido o procedimento legal adequado.
“No caso, não foi realizada nova audiência, mas apenas uma entrevista por um único servidor, sem participação das partes e em manifesto descompasso com as diretrizes estabelecidas na norma em comento, de modo que me parece nítida a nulidade do ato e daqueles que o sucederam, inclusive o julgamento da apelação”, afirmou o magistrado.
Seu voto divergiu do relator, ministro Antonio Saldanha Palheiro, que votou por negar o pedido da defesa. A divergência foi acompanhada pelos ministros Og Fernandes e Rogerio Schietti Cruz, além do desembargador convocado Otávio de Almeida Toledo.