“A diversidade significa que concordamos em discordar, e não há problema algum em discordar”, destacou Hédio Silva Júnior, advogado, doutor em direito constitucional e fundador do JusRacial e do Instituto de Defesa dos Direitos das Religiões Afro-Brasileiras (Idafro), durante a Conferência Magna da 9ª Conferência Internacional de Direitos Humanos (CIDH). Em sua fala, intitulada “Direitos Humanos: Antídoto para o Aparelhamento do Estado”, ele realçou a importância do respeito na convivência com o próximo como um dos remédios para a defesa do Estado Democrático de Direito e da coesão social.
De início, trouxe um paradoxo entre a aproximação tecnológica e o distanciamento interpessoal para ilustrar algumas das dificuldades da sociedade global e seus reflexos no cenário brasileiro. “Segundo a ONU, os principais conflitos armados em curso no planeta e um dos principais desafios das democracias contemporâneas, por mais paradoxal que pareça, estão ligados à internet, que aproxima povos, civilizações e culturas, mas também é um dos principais motivos de conflito devido à dificuldade de convivência entre os seres humanos. A diferença de cor de pele, gênero, religião ou falta dela, e cultura são fontes de desentendimento. Ao mesmo tempo em que ataca a dignidade humana, a internet corrói a democracia. E nós temos assistido a isso no Brasil ao longo dos últimos anos”, disse.
Solidariedade
Valorizar a dignidade em momentos de tragédia foi o tema seguinte na fala do palestrante. Hédio Silva Jr. utilizou a tragédia ocorrida no Rio Grande do Sul para exemplificar o mal que a desinformação, aliada à dificuldade de conviver com a diversidade, pode causar como instrumento de disseminação de discurso de ódio. “Quantos de nós não vimos, lamentavelmente, postagens que atribuem a tragédia do Rio Grande do Sul ao fato de o governador daquele estado ser homossexual ou ao fato de haver 75 mil terreiros de religiões afro-brasileiras no Rio Grande do Sul”, lamentou.
“[Os que divulgaram] não tem nenhuma empatia pelos que morreram, pelos desalojados, pelos desabrigados. Aproveitam uma situação como aquela para disseminar o ódio. E aí nós precisamos distinguir a liberdade de expressão, que é um direito constitucionalmente assegurado, com a agressão”, complementou o palestrante.
Segundo Hédio, a discordância, a diversidade, a riqueza e a pluralidade de pontos de vista são propulsores da economia brasileira, bem como do aumento da rentabilidade das empresas, da melhoria da prestação jurisdicional, da gestão da OAB e da qualidade da produção acadêmica no Brasil. “Quanto mais plural o olhar sobre um determinado objeto, mais rica será a análise e mais profunda será a abordagem e a percepção”, defendeu.
Discurso de ódio
Hédio Silva Jr. salientou que a dificuldade de se conviver com a diversidade no país cria ambiente fértil para a disseminação do discurso de ódio. “O Brasil constitui possivelmente um dos exemplos mais acabados no planeta de uma rica geografia de identidades culturais, étnicas, raciais e religiosas. Aqui se pretende implantar um discurso de unicidade, monolítico e de incitar brasileiros a guerrear com outros brasileiros. O ministro do STF Alexandre de Moraes tem repetido isso. O direito de expressão não pode ser escudo para agressão.”
“Há uma distinção entre o credo, a convicção íntima do indivíduo e o princípio da legalidade. Sem a manutenção desse pacto, o que vige é a barbárie. O povo e a soberania popular expressa na norma jurídica são o cimento que podem manter unidas a sociedade”, ressaltou
A 9ª Conferência Internacional de Direitos Humanos é uma realização do Conselho Nacional da OAB, por meio da Comissão Nacional de Direitos Humanos, e acontece nos dias 23 e 24 de maio, em Campinas (SP). Nesta edição, o evento tem como tema central “Democracia, pluralidades e o princípio do não retrocesso”.
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