English EN Portuguese PT Spanish ES

MPF pede que União e fazendeiros sejam condenados a indenizar comunidade indígena em R$ 3,2 milhões

jurinews.com.br

Compartilhe

O Ministério Público Federal (MPF) iniciou uma ação civil pública contra a União e dez fazendeiros, buscando anular um acordo referente à aquisição de cinco propriedades rurais que totalizam 1.937 hectares no município de Brasilândia (MS) pela comunidade indígena Ofaié-Xavante. A transação ocorreu de maneira ilegal, prejudicando a comunidade, já que a área em questão já era considerada terra indígena na época do negócio. Conforme o artigo 231 da Constituição Federal, as terras tradicionalmente ocupadas pelos povos indígenas são inalienáveis. Na ação, o MPF solicita que a União e os proprietários de terra sejam condenados a pagar indenizações no valor total de R$ 3,2 milhões por danos morais e materiais.

O objeto da ação civil é um acordo firmado em 2002, no qual os indígenas foram orientados e efetivamente pagaram R$ 1,6 milhão para obter o direito de posse das terras da região. Esse montante foi repassado a um grupo de dez proprietários rurais que possuíam cinco fazendas dentro da terra indígena. No entanto, essa transação jurídica não poderia ter ocorrido, pois, de acordo com a Portaria Declaratória 264/1992 do Ministério da Justiça, a área já era reconhecida como indígena.

A comunidade indígena estava deslocada de seu território desde 1994, quando parte de suas terras foi parcialmente inundada pelas obras de construção da Usina Hidrelétrica Porto Primavera (atual Usina Sergio Motta), dois anos após a publicação da portaria declaratória do Ministério da Justiça. Para compensar os danos, a Central Elétrica do Sul e São Paulo (Cesp), responsável pela usina, adquiriu uma área de 484 hectares ao lado do território indígena e a doou à Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) como reserva. Além disso, como medida compensatória, a Cesp pagou R$ 1.641.500,00 à Associação dos Índios Ofaié-Xavante. Esses recursos deveriam ser utilizados pela comunidade indígena para adquirir uma área rural destinada à implementação de projetos agropecuários visando à subsistência e reprodução do grupo.

No entanto, as terras onde a comunidade indígena foi reassentada não atendiam às suas necessidades e modo de vida. A falta de um curso de água natural, fundamental para um grupo que possui tradições de coleta e caça e que historicamente viveu nas margens de rios, é um dos principais problemas. A procuradora da República Luísa Astarita Sangoi ressalta que essa situação “constitui uma violência cultural e torna a vida dessa comunidade insustentável, uma vez que a falta de água impede que eles se beneficiem de projetos essenciais para sua sobrevivência física e cultural. Atividades produtivas como piscicultura, pecuária e agricultura requerem um mínimo de disponibilidade de água”.

Com base nos valores recebidos, a comunidade indígena decidiu tentar adquirir as terras que lhes pertenciam. Assim, a Associação Ofaié-Xavante foi orientada a firmar o acordo e transferir o valor aos fazendeiros. O acordo foi assinado em março de 2002, com homologação judicial, e a posse das propriedades foi “adquirida” em 28 de junho de 2002. No entanto, a associação não conseguiu tomar posse da terra, uma vez que ela já estava em processo de demarcação.

Segundo a procuradora, é impossível que uma área de posse permanente indígena, reconhecida para fins de demarcação, seja vendida pelos próprios detentores (indígenas). Além disso, a área não foi formalmente vendida, pois o acordo menciona apenas a “cessão de posse” à comunidade.

Esse negócio jurídico é considerado nulo, no mínimo. Como é possível que um povo indígena compre a propriedade ou posse de terras que já lhe são reconhecidas como posse permanente?”, questiona a procuradora. Para o MPF, os fazendeiros estavam alienando uma propriedade que não lhes pertencia. Na verdade, cerca de dez anos antes da transação, a terra já havia sido reconhecida como posse do povo Ofaié-Xavante.

Dessa forma, não houve formalmente um contrato de compra e venda. Como resultado, a comunidade indígena em questão não possui o título de propriedade da terra que ocupa. Atualmente, a comunidade utiliza as áreas de pastagem para a criação de gado, mas para regularizar esse gado junto à Agência Estadual de Defesa Sanitária Animal e Vegetal do MS, é necessário registrar o imóvel em nome da comunidade.

O MPF destaca que o dano extrapatrimonial sofrido pelos Ofaié-Xavante se caracteriza pelo estado de incerteza que vivem até hoje, já que a área ainda não foi demarcada, mais de 30 anos após a publicação da Portaria 264/1992. Não se trata apenas de um aborrecimento, mas sim de um constante estado de incerteza e medo. É um povo que foi expulso de sua localidade várias vezes e teve que habitar terras incompatíveis com seu modo de vida. Eles tiveram que sobreviver por anos com a ajuda de cestas básicas fornecidas pelo poder público”, ressalta a procuradora.

Deixe um comentário

TV JURINEWS

Apoio

Newsletters JuriNews

As principais notícias e o melhor do nosso conteúdo, direto no seu email.