Um estudo realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) revela que os registros sobre apreensão de drogas nos processos criminais dos tribunais estaduais são frequentemente imprecisos e carecem de detalhamento.
A pesquisa intitulada “Critérios Objetivos no Processamento Criminal por Tráfico de Drogas: natureza e quantidade de drogas apreendidas nos processos dos tribunais estaduais de justiça comum”, divulgada nesta terça-feira (23), destaca a escassa preocupação do sistema judiciário em estabelecer critérios para informar a quantidade de drogas presentes nos autos processuais.
De acordo com o estudo controlado pelas pesquisadoras Milena Karla Soares e Natalia Cardoso Amorim Maciel, do Ipea, os dados referentes à natureza e quantidade de drogas foram obtidos a partir de cinco fontes distintas nos processos penais relacionados aos crimes previstos na Lei de Drogas, com decisões finais proferidas no primeiro semestre de 2019.
Apesar das imprecisões e da falta de padronização, uma análise conjunta dos documentos e aplicação de certos critérios permitiram determinar a posse de drogas, com base na “melhor informação disponível nos autos processuais”.
Segundo as pesquisadoras, a nível nacional, existe um domínio de casos relacionados ao tráfico de maconha e cocaína em poucas quantidades, situações em que seria possível presumir que as drogas se destinavam ao uso pessoal caso critérios objetivos de quantidade fossem adotados.
“Os registros de quantidades de drogas nos processos são imprecisos, a ponto de não se saber se a substância foi pesada com ou sem o recipiente que a continha”, afirmam as autoras.
Essa pesquisa aumenta a necessidade de estabelecer parâmetros em objetivos relativos à natureza e quantidade das substâncias apreendidas, a fim de checar maior racionalidade, justiça e equidade à aplicação da lei penal sobre drogas.
De acordo com o documento, a cocaína é citada em 70,2% dos processos, sendo a droga mais comum encontrada, com uma quantidade mediana de 24 gramas. No entanto, em 34,5% dos casos, foram apreendidos níveis inferiores a 10,9 gramas da droga; em 36,3% dos casos, as apreensões variaram entre 11g e 100g; em 17,9% dos casos, a quantidade está entre 101g e 1kg; e apenas 6,8% dos processos envolveram apreensões de mais de um quilo da substância.
Ademais, em 4,4% dos casos, não foi possível encontrar qualquer informação sobre a massa em gramas nos documentos analisados.
A pesquisa também revela que a cannabis é a segunda droga mais encontrada, presente em 67,1% dos processos, com uma quantidade de 85 gramas. Entre os casos relacionados a essa substância, 58,7% envolviam inferiores a 150g, 27,3% situam-se entre 151g e 2kg, 11,1% acima de 2kg e 3,2% não existem dados sobre quantidade exata.
O estudo também revela que existem diversas variações regionais. A quantidade média de cannabis compreendida varia de 20 a 1.140 gramas, enquanto a quantidade média de cocaína compreendida varia de 5 a 96 gramas, dependendo do estado em questão.
Além disso, o estudo sugere a implementação de um protocolo a ser seguido por agentes públicos na elaboração dos laudos periciais preliminares e definitivos. Esse protocolo inclui padrões de pesagem definidos, a obrigação de indicar a massa líquida das substâncias examinadas e a necessidade de informar os métodos utilizados para determinar a natureza das substâncias.
Os agentes públicos também deveriam levar em consideração critérios objetivos para determinar a quantidade de drogas compatíveis com o porte para uso pessoal.
Por fim, se usado aproximadamente de 30% a 50% dos processos relacionados ao tráfico de cannabis e de 30% a 40% dos processos relacionados à cocaína poderiam ser os presumidos como casos de porte para consumo pessoal se fossem seguidos como de 25g a 100g para a cannabis e de 10g a 15g para a cocaína.