O juiz do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA), Mario Soares Caymmi Gomes, está enfrentando uma reclamação disciplinar após publicar um edital com três vagas de estágio em seu gabinete exclusivas para pessoas LGBTQIAPN+.
O TJ-BA acusa o juiz de ter ultrapassado os limites da liberdade de expressão ao comentar o caso em uma entrevista após o veto ao edital.
A reclamação disciplinar contra o juiz foi apresentada pelo presidente do Tribunal de Justiça da Bahia, Nilson Soares Castelo Branco. No documento, ele afirma que, desde o lançamento do edital, a imagem da Corte “foi vilipendiada” devido à veiculação de “fatos inverídicos e distorcidos” sobre as ações e políticas públicas desenvolvidas pelo tribunal nas redes sociais.
Castelo Branco acusa o juiz de ter ultrapassado os limites da liberdade de expressão e do dever de prudência e cautela que devem guiar as manifestações dos membros do Poder Judiciário.
“Ao falar sobre a decisão do corregedor, ele fez uma declaração ofensiva direcionada ao membro da mesa diretora do tribunal, além de fazer um juízo depreciativo”, afirma o presidente do TJ-BA.
A iniciativa do juiz foi vetada pelo desembargador José Rocha Rotondano, corregedor do TJ-BA. Ao falar sobre o veto, Mário Gomes afirmou que o corregedor é “gay não assumido”
“O que me causou maior incômodo é que essa determinação tenha vindo de um corregedor que é gay, ainda que ele não se assuma. Isso não é fofoca. Tem a ver com o caso. Sei que ele é gay, pois ele teve caso com meu marido, antes dele me conhecer, ele foi casado com um rapaz que era vereador de Mata de São João”, afirmou o magistrado em entrevista num programa de rádio.
Para Mario Gomes, no entanto, a situação trata-se de preconceito. Em declaração, ele afirmou: “Esse talvez seja o primeiro caso explícito de LGBTfobia institucional no Poder Judiciário”.
Mario Gomes recebeu a notificação em 28 de junho, no Dia Internacional do Orgulho LGBT+ e tem 15 dias para se defender.
O magistrado é defensor dos direitos da população LGBT+. Gomes começou a se envolver de forma mais ativa na causa a partir de dezembro de 2020, quando propôs e viu ser aprovada no tribunal uma comissão para a promoção de igualdade e políticas afirmativas em questões de gênero e orientação sexual.
O QUE DIZ O JUIZ
O juiz Mario Gomes se diz surpreso com a agilidade com que o caso está correndo. “Foi distribuído às 14h41 e às 14h48 já tinha uma decisão de duas folhas nos autos mandando me intimar. Parece que foi tudo combinado.”
Ele afirma não ter falado mal do tribunal durante a entrevista e diz que citou o corregedor-geral dentro de um contexto. “Não é que tenham me chamado para uma entrevista e eu, de forma aleatória, acusei. Não foi isso o que aconteceu.”
Mario Gomes enxerga esse processo como uma forma de retaliação e preconceito. “E não apenas homofobia contra mim, por ser um juiz gay que divulga e reivindica políticas afirmativas. Homofobia por não querer transgêneros nem travestis dentro do tribunal”, frisa.
O juiz se vê encurralado, além disso, pelo fato de a reclamação envolver o presidente e os dois corregedores do tribunal. “Não estou conseguindo advogado. Ninguém quer se indispor”, ele diz. “Me parece que seria caso de o CNJ intervir.”