“O Conselho Federal e os Conselhos Seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil não estão obrigados a prestar contas ao Tribunal de Contas da União nem a qualquer outra entidade externa.”
Essa foi a tese fixada, por maioria, pelo Supremo Tribunal Federal em julgamento virtual finalizado nesta segunda-feira (24/4), sob o Tema 1.054 da repercussão geral. Os ministros acompanharam a divergência aberta por Luiz Edson Fachin; ficou vencido apenas o relator, o ministro aposentado Marco Aurélio.
Em recurso extraordinário, o Ministério Público Federal questionava decisão da 7ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, que reiterou que a OAB não tem obrigação de prestar contas ao TCU. O MPF argumentava violação do artigo 70 da Constituição Federal, apontando para a natureza jurídica da OAB, que a obrigaria a prestar contas.
Em seu voto, Fachin lembrou que a OAB, apesar de criada por um ato oficial, foi engendrada por um movimento organizado de juristas; e que a controvérsia sobre a necessidade de prestação de contas ao poder público remete a 1951.
A Ordem exerce serviço público, “que não se confunde com serviço estatal, cujo controle pode ser realizado por vias outras que não o TCU”. Segundo o ministro, para cumprir suas finalidades institucionais, a entidade não pode estar submetida ao Estado, pois a atividade da advocacia envolve sempre a possibilidade de conflito com o poder público.
Fachin destacou que a OAB demanda “o mais alto grau de liberdade” para cumprir sua função expressa no artigo 133 da Constituição. O próprio Supremo já decidiu, na ADI 3.026, que a entidade é instituição com natureza jurídica própria, dotada de autonomia e independência e, por isso, não se confunde com os demais conselhos de fiscalização profissional.
Por fim, o ministro também rechaçou o argumento do MPF de submissão ao TCU com base no fato de as anuidades serem compulsórias. Os bens e valores arrecadados pela OAB não são públicos nem se confundem com qualquer espécie tributária. “A OAB caracteriza-se como entidade ímpar no ordenamento jurídico, figura sui generis, cujas finanças não se submetem ao controle estatal, nem se enquadra no conceito jurídico de Fazenda Pública, submetido ao controle da Lei 4.320/1964.”
FUNDAMENTAÇÃO DE PESO
O ministro Fachin fundamentou seu voto em diversos pareceres de juristas levados aos autos. De um deles, apresentado pelo advogado e professor Lenio Streck, o ministro citou doutrina de Paulo Lôbo que dispõe que a função institucional exercida pela OAB “não autoriza confusão do exercício de tal múnus público com função própria de ente estatal”.
De Egon Bockmann Moreira ele citou o entendimento de que a OAB “pauta-se pela mais absoluta liberdade”. Por isso, não se aplicam a ela os artigo 70 e 71 da Constituição, já que o exercício da liberdade não se submete à aprovação “de quem quer que seja”.
Maria Pia Guerra e Ana Carolina Couto também foram citadas pelo ministro ao fazer o resgate histórico da questão. Em ensaio, as autoras narraram que o Plenário da OAB, em 1976, deliberou por unanimidade que não se submetia à prestação de contas ao TCU. “Também a VI Conferência Nacional da Ordem dos Advogados, realizada em outubro de 1976, incluiu entre suas diretrizes a desvinculação definitiva ao TCU e ao Ministério do Trabalho”, completam.
Do parecer do ministro aposentado Eros Grau, Fachin destacou o entendimento de que “a contribuição devida à Ordem pelos advogados consubstancia um ônus, confirmando essa minha conclusão a leitura do artigo 46 e seu paragrafo único e dos artigos 58, IX e 34, XXIII da Lei n. 8.906/94”.
“O que gera a obrigação de prestar contas por qualquer entidade, pública ou privada, é o fato de utilizar, arrecadar, guardar, gerenciar ou administrar dinheiros, bens ou valores públicos ou pelos quais a União responda, ou que, em nome dela, assuma obrigação de natureza pecuniária”, completou o professor José Afonso da Silva.
VOTO VENCIDO
Para o ministro aposentado Marco Aurélio, que ficou vencido, embora a Ordem dos Advogados do Brasil não seja ente estatal, é entidade pública, de natureza autárquica e, portanto, deve se submeter à fiscalização do Tribunal de Contas da União (TCU).
Para o ministro, o caráter especial e corporativista da OAB, além do fato de que a entidade arrecada contribuições de índole tributária, justificam a submissão ao controle externo. Ele propôs a fixação da tese: “A Ordem dos Advogados do Brasil está submetida a fiscalização pelo Tribunal de Contas da União”.
Clique aqui para ler o voto de Fachin
Clique aqui para ler o voto de Marco Aurélio
RE 1.182.189
Com informações da Conjur