A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) pediu, nesta segunda-feira (27/11), ao presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, a alteração do Regimento Interno da Corte para que o julgamento de ações penais originárias seja feito, como regra, de forma presencial. O ofício, entregue na 24ª Conferência Nacional da Advocacia Brasileira, em Belo Horizonte (MG), ressalta, ainda, a necessidade da garantia da sustentação oral.
O texto é assinado pela diretoria do Conselho Federal e os presidentes das 27 seccionais da entidade e reúne o sentimento do Sistema OAB diante da defesa das prerrogativas da advocacia. A solenidade ocorreu na presença de todos os signatários e outras autoridades do Sistema OAB e do Poder Judiciário, como o ministro do STF Dias Toffoli e do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e corregedor Nacional de Justiça, Luís Felipe Salomão.
“Gostaria de agradecer a sua sensibilidade, a sua parcimônia e a sua compreensão com os pleitos que a advocacia faz. Colocamos recentemente as dificuldades que temos vivido e quero ver a todos os senhores e a todas as senhoras que nós contamos com a sensibilidade do presidente do STF Luís Roberto Barroso”, afirmou o presidente do CFOAB, Beto Simonetti, durante a entrega do documento.
O presidente do Supremo também agradeceu a interlocução com a entidade. “Eu queria agradecer ao presidente Simonetti, que tem estado com interlocução permanente no Supremo. Com altivez, empenhado, sempre elegante, mas firme na defesa das prerrogativas”, disse. Barroso lembrou ter sido advogado por 30 anos e compreender as demandas.
“Me comprometi com o presidente Beto Simonetti que vou submeter aos meus colegas do Supremo a volta das ações penais para as turmas, em que os julgamentos vão ser preferencialmente presencial e com sustentação oral e acho que isso atende a uma reivindicação importante da Ordem”, pontuou Barroso.
Julgamento presencial
Pelo texto do Regimento Interno, qualquer demanda em trâmite perante o Supremo poderá ser julgada em ambiente eletrônico e os interessados em fazer sustentação oral devem “encaminhar as respectivas sustentações por meio eletrônico após a publicação da pauta e até 48 horas antes de iniciado o julgamento em ambiente virtual.”
Para a OAB, no entanto, merece atenção o fato de as ações penais originárias serem julgadas em única instância pelo tribunal. “Naturalmente, revestem-se de extrema relevância e sensibilidade. A sessão de julgamento, com a oportunidade de defesa oral, constitui fase de grande importância para o julgamento, especialmente por consubstanciar o último ato de defesa antes da colheita de votos”, diz o ofício.
O Sistema OAB reconhece que o julgamento em Plenário Virtual assegura a manifestação oral do defensor, de forma assíncrona ao julgamento. “Contudo, diante da relevância e excepcionalidade das ações penais, o julgamento presencial reveste-se de um valor inestimável em prestígio à garantia da ampla defesa, assegurando aos advogados a realização da sustentação oral em tempo real e o esclarecimento de questões de fato relevantes”, enfatiza.
A preocupação do CFOAB diante do julgamento virtual é do modelo não atender aos imperativos que norteiam o exame de causas penais, uma vez que a apreciação de inquéritos e de ações penais envolve a análise de fatos e de provas, o que não se compatibiliza com o formato e os tipos de interação permitidos no Plenário Virtual.
Além disso, em razão da natureza dos bens jurídicos envolvidos, que incluem a própria liberdade, e da gravidade das possíveis repercussões sobre as pessoas afetadas, o processo penal exige a mais ampla garantia das faculdades processuais, que somente se realiza pelo plenário físico; e demandam debate aprofundado e maior interlocução dos ministros entre si e com as partes.
O julgamento presencial ou por videoconferência permite a sustentação oral em tempo real com os ministros, e, assim, o levantamento de questões de ordem e esclarecimentos fáticos, indispensáveis para a solução da controvérsia. “De mais a mais, não há dúvida de que as sessões presenciais prestigiam a qualidade deliberativa das decisões e o amplo respeito ao direito à participação processual e ao dever de publicidade, exigidos em sua máxima extensão quando se trata de causas penais”, pontuam diretores e presidentes da OAB.
A proposta já foi feita por integrantes da Corte. Em janeiro de 2022, o então ministro Ricardo Lewandowski enviou sugestão à então presidente da Corte, ministra Rosa Weber, emendas ao Regimento Interno, dentre elas constou a inserção do parágrafo segundo ao art. 5º, que ficaria: “As ações penais somente serão julgadas em sessões presenciais, observados os procedimentos e prazos de sustentação oral previstos na Lei 8.038/1990”.
Na ocasião, o ministro esclareceu que tinha por objetivo “assegurar a estrita observância do devido processo legal, além de garantir o direito à ampla defesa e ao contraditório, com o estrito cumprimento das regras estabelecidas na Lei 8.038/1990, evitando-se prejuízos aos acusados pela ausência física de seus defensores, os quais ficariam impedidos, em ambiente virtual, de fazer sustentações orais à vista dos julgadores, bem assim de fazer uso da palavra “pela ordem” para esclarecimentos de fato ou relativos ao bom andamento do processo, como lhes é facultado pelo Estatuto dos Advogados.”
Sustentação oral
Em segundo lugar, também enseja preocupação a postura das Cortes Superiores de indeferir pedidos de sustentação oral mesmo com expressa previsão em lei autorizando o uso da palavra pela defesa. Essa é a hipótese que tem ocorrido, por exemplo, nos julgamentos de agravos, o que gera enorme instabilidade e insegurança no sistema judiciário brasileiro.
O texto legal é expresso em permitir a sustentação oral no julgamento dos agravos internos e regimentais interpostos contra decisões monocráticas do relator que julgar o mérito ou não conhecer dos recursos ou ações dispostos nos incisos I a VI do art. 7º, § 2º-B, da Lei 8.906/1994.
Ainda que o Regimento Interno do Supremo tenha previsão em sentido contrário, e que esse tem sido, inclusive, o fundamento legal para o indeferimento dos pedidos nessas hipóteses, a OAB defende que a lei deve prevalecer quando se está diante de matéria processual, enquanto o regimento prepondera quando se tratar de regra sobre o funcionamento dos tribunais.
“Assim, decisões que optam por aplicar o regimento interno da Corte em detrimento de lei federal posteriormente aprovada pelo regular processo legislativo, sem qualquer impugnação, e sem que haja declaração de inconstitucionalidade, tal qual art. 7º, § 2º-B, da Lei 8.906/1994, com redação dada pela Lei nº 14.365/22, acabam por mitigar pilares do Estado Democrático de Direito como a soberania popular, o equilíbrio e separação dos poderes, e o império da lei.”