A maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal decidiu que o Poder Judiciário tem o poder de determinar que os governos apresentem planos para solucionar problemas identificados nos serviços de saúde. A discussão envolveu um recurso que questionava se a intervenção do Judiciário para implementar políticas de saúde violaria o princípio da separação dos poderes.
Os ministros concluíram que esse princípio não é infringido quando a atuação do Judiciário é necessária para garantir um direito fundamental, como o direito à saúde. O julgamento ocorreu no plenário virtual e diz respeito a uma disputa jurídica no estado do Rio de Janeiro.
O Ministério Público do estado ajuizou uma ação civil pública para obrigar o município, que abriga a capital carioca, a tomar medidas administrativas para garantir o funcionamento adequado do Hospital Municipal Salgado Filho, localizado no bairro do Méier. O relator do caso, ministro Ricardo Lewandowski (atualmente aposentado), já havia manifestado seu voto no sentido de que o Judiciário pode impor obrigações à Administração Pública na área da saúde, como a realização de concursos públicos para médicos e funcionários técnicos, seguidos da nomeação e posse dos profissionais aprovados.
Além disso, também podem ser determinadas medidas para corrigir procedimentos e solucionar irregularidades apontadas pelos conselhos regionais de medicina. O voto de Lewandowski foi acompanhado pelo ministro Edson Fachin.
Por outro lado, o ministro Luís Roberto Barroso discordou dessa posição. Embora ele considere que a atuação do Judiciário nesse tipo de política pública não viole a Constituição, ele argumentou que as decisões judiciais devem determinar que o Poder Público apresente um plano ou outras formas de alcançar resultados.
Barroso propôs a seguinte tese: “A intervenção do Poder Judiciário em políticas públicas voltadas para a realização de direitos fundamentais, nos casos de ausência ou deficiência grave do serviço, não viola o princípio da separação dos poderes. A decisão judicial, em regra, ao invés de determinar medidas pontuais, deve indicar os objetivos a serem alcançados e ordenar à Administração Pública que apresente um plano e/ou os meios adequados para atingir o resultado. No caso de serviços de saúde, a falta de profissionais pode ser suprida por meio de concurso público ou, por exemplo, realocando recursos humanos e contratando organizações sociais (OS) e organizações da sociedade civil de interesse público (OSCIP)”.
A posição do ministro Barroso prevaleceu no julgamento, sendo acompanhada pelos ministros Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Luiz Fux, Nunes Marques, Cármen Lúcia e Rosa Weber. Já o ministro Alexandre de Moraes discordou do relator e propôs uma tese em que a atuação do Judiciário só seria possível se ficasse evidenciada a negligência da Administração Pública em cumprir direitos fundamentais.
Ele
propôs o seguinte entendimento: “Não cabe ao Poder Judiciário, sob pena de violação ao princípio da separação dos poderes e das regras orçamentárias legais e constitucionais, atuar em substituição ao juízo de oportunidade e conveniência do Poder Executivo para a prática de ato administrativo discricionário, determinando a realização de concurso público para a contratação de servidores públicos para atuação em hospitais, bem como determinando outras medidas de cunho administrativo. É legítima e válida a atuação excepcional do Poder Judiciário em matéria de políticas públicas quando ficar bem evidenciada a desídia do administrador em cumprir direitos fundamentais.”
O ministro André Mendonça acompanhou a posição de Moraes. O julgamento foi realizado no plenário virtual, onde os ministros apresentam seus votos em uma página do Supremo na internet. A análise do caso foi concluída na última sexta-feira (30). A decisão terá repercussão geral, ou seja, deverá ser aplicada a casos semelhantes nas instâncias inferiores.