Ao ser designada para varas do interior do estado do Ceará, a juíza Suyane Belchior Paraíba Aragão precisou superar um desafio maior do que os impostos pela profissão. “Minha caçula, Luiza, nasceu com Síndrome de Down e eu não contaria com apoio de tantas terapias, como teria em cidades maiores”, relembra a magistrada. “Precisei me reinventar e buscar alternativas de como lidar com uma criança especial dentro de casa, como desenvolvê-la para que futuramente se tornasse uma pessoa independente”, ressalta Suyane.
A jornada da juíza trabalhista é destacada neste 21 de março, Dia Mundial da Síndrome de Down. A data reconhecida pela Organização das Nações Unidas procura conscientizar e garantir oportunidades iguais às pessoas com essa condição genética. Há nove anos, essa têm sido a luta diária da juíza Suyane, que atua na magistratura há 15 anos.
Ela conta que a experiência com o desenvolvimento da filha é um aprendizado diário. “Passei a ser mais paciente, resiliente, a me colocar no lugar do outro não só na vida pessoal, mas no meu trabalho”, diz a juíza. Ela destaca ainda que “nas audiências, eu me percebi uma magistrada mais tolerante com as partes, os advogados, escutando o que cada um tem a falar”.
Na busca de estímulos para Luiza, a magistrada relembra que desempenhou os papeis de fonoaudióloga e terapeuta ocupacional para que a menina continuasse a se desenvolver. A mãe enfatiza que os estímulos nos primeiros anos de vida são essenciais para a melhor desenvoltura das crianças com essa síndrome. “Passei a estudar tudo sobre a condição genética, aprendi que precisava falar pausadamente, oferecer brinquedos educativos, ler histórias e cantar”, resume.
Na verdade, a dedicação é a mesma que os pais devem ter com qualquer criança em desenvolvimento, avalia Suyane, que deixa ainda um alerta de que isso não implica em ter muitos recursos. “Podemos usar material reciclável para construir brinquedos e tudo se transforma em aprendizado, como empilhar caixas ou blocos, até mesmo rasgar folhas de papel”, ensina a mãe da menina, que também tem Júlia, de 13 anos.
Luiza, com 9 anos, frequenta o 2º ano do Ensino Fundamental e aprende como qualquer outra criança, diz a mãe. Com naturalidade, recentemente ela explicou à filha sobre a Síndrome de Down. “Ao ver uma criança com traços semelhantes aos dela, como olhos amendoados, Luiza diz: olha mamãe, aquela criança é parecida comigo” conta a magistrada.
A experiência com a filha menor a alertou sobre a necessidade de auxiliar outros pais que podem passar pelas mesmas dificuldades que ela enfrentou. “Além de vencer inseguranças, quero contribuir para a superação de preconceitos e crenças como a de que a criança não irá se desenvolver, que não será um adulto independente”, justifica.
O caminho que ela encontrou foi as redes sociais. Nesses espaços, ela fala do dia a dia da menina e aborda temas como discriminação e bullying. Ela também participa de associações de pais, onde compartilha o seu aprendizado. A magistrada ainda planeja para este ano suscitar a discussão sobre a criação de comitê de inclusão e acessibilidade no seu local de trabalho. “São temas que precisam estar no dia a dia da sociedade”, defende.
No âmbito do CNJ, no ano passado, por meio da Portaria n. 222/2022, foi instituído o Comitê dos Direitos de Pessoas com Deficiência.
TRISSOMIA
O dia 21 de março foi escolhido porque representa a triplicação, ou seja, a trissomia, do 21º cromossomo que causa a síndrome. O site da Biblioteca virtual do Ministério da Saúde traz que em cada célula do indivíduo existe um total de 46 cromossomos, divididos em 23 pares. A Síndrome de Down é gerada pela presença de uma terceira cópia do cromossomo 21 em todas as células do organismo.
Com informações do CNJ