Os ataques de bolsonaristas às sedes dos três poderes em Brasília foram uma “tentativa de golpe por gente preparada”, afirmou o presidente Lula (PT) nesta quarta-feira (18), em sua primeira entrevista exclusiva após assumir o cargo, à jornalista Natuza Nery, da GloboNews. Boa parte da conversa girou em torno dos atentados contra os símbolos da República promovidos por extremistas bolsonaristas em Brasília no dia 8 de janeiro.
Lula afirmou que houve falha dos setores de inteligência do governo e explicou porque optou pela intervenção federal na segurança pública do Distrito Federal em vez de de uma operação de garantia da lei e da ordem (GLO) por parte do Exército.
“Eu tinha acabado de ser eleito presidente da República. Não tem importância se foi com 12 milhões, com 20 milhões ou com um milhão de votos. O importante é que fui eleito presidente da República desse país, e eu não ia abrir mão de cumprir com as minhas funções e exercer o poder na sua plenitude. Foi por isso que nós decidimos, em vez de GLO, fazer intervenção na polícia de Brasília, que tinha sido conivente com o caso”, disse Lula.
O presidente disse que, na sua opinião, ficou claro que houve negligência da Polícia Militar do Distrito Federal, que permitiu que as pessoas fizessem o que bem entendessem.
Lula defendeu uma minuciosa investigação e disse ter impressão que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) sabia da tentativa de golpe.
“Acho que a decisão dele de ficar quieto depois de perder as eleições, semanas e semanas sem falar nada; a decisão dele de tomar a decisão de não passar a faixa para mim, de ir embora para Miami como se estivesse fugindo com medo de alguma coisa; e o silêncio dele mesmo depois do acontecimento daqui, me davam a impressão que ele sabia de tudo o que estava acontecendo, que ele tinha muito a ver com aquilo que estava acontecendo”, disse. Segundo Lula, talvez Bolsonaro tivesse esperança de retornar ao Brasil na “glória de um golpe”.
Reação institucional
Lula exaltou o papel dos governadores, do Legislativo e do Judiciário para frear a tentativa de golpe de Estado. Segundo o mandatário, os três poderes atuaram em conjunto para garantir a democracia brasileira.
“E eles perceberam que a gente tinha reagido, eles perceberam que a gente tinha tomado conta da situação, e eles então pararam. Mas aqui, quem veio aqui, Natuza, era gente muito profissional. Tinham pessoas que eram militantes comuns, pessoas que estavam raivosas, nem sei se tinham bebido ou não, mas o dado concreto é que segundo todo o depoimento, as pessoas que vieram aqui eram profissionais, as pessoas conheciam o Planalto, as pessoas conheciam o Poder Judiciário, as pessoas conheciam a Câmara dos Deputados”.
Lula citou a reunião com os chefes dos três poderes e dos governadores que foram visitar os palácios atacados por bolsonaristas golpistas.
“Antes de falar dos militares, eu queria te dizer que no mesmo dia 8 à noite, quando eu cheguei aqui, eu vim visitar, o pessoal tentou me aconselhar a não vir ao Palácio do Planalto, porque poderia ter bomba dentro e tal, resolvi vir visitar o Palácio do Planalto. E no dia seguinte, eu fui visitar, sabe, a Suprema Corte, à noite, os 27 governadores vieram aqui. Nós descemos a rampa juntos, foi um gesto muito forte em defesa da democracia, a Suprema Corte, o Poder Executivo, o Poder Legislativo, sabe, foi uma coisa muito forte”, disse.
Relação com os militares
Lula também afirmou que pretende que o governo estabeleça um novo capítulo com as Forças Armadas dentro da normalidade. Defendeu a permanência do cargo do ministro da Defesa, José Múcio, e declarou que pretende fortalecer a indústria bélica do país.
“Bem, eu estou chamando os comandantes para conversar porque a primeira vez que eu conversei com os comandantes, eu disse para eles que eu gostaria de discutir o fortalecimento da indústria de defesa nesse país. O Brasil é um país muito grande, o Brasil tem uma fronteira muito grande, tanto a marítima quanto a fronteira terrestre, o Brasil tem uma população grande e nós precisamos, então, ter umas Forças Armadas preparadas e fortalecidas para que a gente cumpra aquilo que está na Constituição: a defesa do povo brasileiro contra qualquer possível ataque externo”.
Apesar da via de diálogo aberto para fortalecer as Forças Armadas, Lula foi enfático ao dizer que qualquer militar que tenha participado da intentona golpista irá ser punido.
“Veja, todos que participaram do ato golpista serão punidos. Todos. Não importa a patente. Não importa a força que ele participe, todos que a gente descobrir que participaram dos atos serão punidos. Terão que ser afastados das suas funções e vão responder perante a lei”, defendeu.
Com informações da Conjur