O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) permitiu a venda de um automóvel, da marca Saveiro, que estava com restrição no Detran-SP. Os desembargadores entenderam que o proprietário, dono de uma frota de veículos, não poderia ser obrigado a esperar um ano para comercializar o bem, sob pena de ter que recolher uma diferença de ICMS.
Na época em que comprou o veículo, o consumidor ganhou um desconto sobre o preço de venda sugerido ao público, que era de R$ 88 mil. Pagou R$ 78,1 mil, com a incidência de um valor menor de ICMS.
Contudo, não observou que na nota fiscal havia um alerta: “Ocorrendo a alienação do veículo antes de 24 de setembro de 2022, deverá ser recolhido o ICMS, com base no Convênio ICMS nº 64/2006”. Mas para os magistrados do TJSP essa regra não poderia ser aplicada. Eles consideraram que a norma, editada pelo Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), não havia sido assinada pelo governo paulista.
De acordo com o advogado do proprietário do veículo, Pedro Casquet, do Andrade, Foz, Hypolito e Médicis Advogados, a concessionária não alertou o cliente sobre a restrição. E ao analisar o caso, acrescenta, percebeu que São Paulo não é signatário do convênio. Para ele, a Volkswagen do Brasil, como forma de diminuir artificialmente o valor do veículo e tornar o seu produto mais atraente, tem feito uso indevido da norma para reduzir o recolhimento de ICMS ao Estado.
O proprietário tentou resolver o problema diretamente no Detran-SP. O órgão, porém, informou que só poderia retirar a restrição com decisão judicial. A Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo, por sua vez, afirmou não ter competência para desbloquear a venda.
A saída foi procurar o Judiciário. Se o contribuinte fosse obrigado a recolher o ICMS, ele incidiria sobre a diferença entre o valor de referência e o pago, com alíquota de 15%. Seriam R$ 1,5 mil a recolher que, com as correções monetárias, hoje chegaria perto de R$ 2 mil.
Na Justiça, obteve liminar, que depois foi confirmada em sentença. Segundo o advogado Pedro Casquet, a decisão é a primeira que se tem notícia sobre o tema (processo nº 1002445-09.2022.8.26.0032).
Na sentença, o juiz José Daniel Dinis Gonçalves, da Vara da Fazenda Pública de Araçatuba, ressalta que o convênio autoriza a exigência de ICMS das empresas locadoras de veículos, incidente sobre as vendas de veículos usados, quando estes forem alienados em menos de 12 meses contados de sua aquisição. “Mas a questão é que o Estado de São Paulo, ao que se infere dos autos, não aderiu ao referido convênio”, diz. Logo, acrescenta, “não há sustentáculo legal para a cobrança do imposto”.
Por meio de recurso da Fazenda paulista, a questão foi levada ao TJSP e analisada pela 5ª Câmara de Direito Público. E, por unanimidade, os desembargadores mantiveram a sentença.
Segundo o relator, desembargador Fermino Magnani Filho, o Convênio ICMS nº 64/2006 não se aplica ao Estado de São Paulo, conforme artigo 3º do Decreto Estadual nº 50.977/2006. Por isso, afirma, seria “patente direito líquido e certo a ser amparado nesta via”.
Em nota, a Procuradoria Geral do Estado (PGE) informa que “o fato de o Estado de São Paulo não ter aderido ao Convênio ICMS-64/06 não afasta a exação do tributo, caso ocorra venda de veículo antes de 12 meses contados da aquisição por pessoa jurídica”. A questão, segundo o órgão, “está relacionada com a alienação de ativo imobilizado desses contribuintes”.
Esse critério temporal, diz, foi validado pelo STF no julgamento do Tema nº 1.012. A PGE afirma que existem precedentes favoráveis ao Estado no TJSP (processos nº 0003890-58.2011.8.26.0099 e nº 1049186-15.2020.8.26.0053, a título de exemplo).
A Volkswagen preferiu não comentar o assunto. Já o Detran-SP informa, também por nota, que cumpre todas as decisões judiciais. “Sobre este caso, assim que for notificado oficialmente, realizará os procedimentos determinados pela Justiça”, afirma.
Com informações do Valor