Reunir, ouvir, desenvolver e dar visibilidade a projetos que contribuam para o cumprimento dos direitos de crianças e jovens no Brasil, nas esferas governamentais e não governamentais, tem sido um dos diferenciais de ação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). No Dia das Crianças (12/10), o órgão se junta aos mais diversos setores da sociedade para reafirmar a importância da proteção à infância e para garantir seus direitos na sociedade e na Justiça.
A Constituição Federal prioriza os direitos de crianças, adolescentes e jovens. No artigo 227, estabelece que devem ter especial proteção da família, da sociedade e do Estado, ficando a salvo de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. “O Conselho tem adotado políticas públicas que visam a garantir os direitos de crianças, adolescentes e jovens, atuando em conjunto com os diversos ramos do Judiciário para cumprir a legislação”, avalia a presidente do STF e do CNJ, ministra Rosa Weber.
O retrato da situação de abandono e de violência a que estão expostos milhões de crianças e adolescentes no Brasil pode ser conferido em números recentes. O Atlas da Violência de 2021, elaborado pelo Instituto de Pesquisa Aplicada (IPEA), por exemplo, revelou que a violência é a principal causa de morte entre os jovens brasileiros de até 19 anos. No contexto da educação, após mais de dois anos de pandemia, dois milhões de crianças e adolescentes de 11 a 19 anos abandonaram as escolas.
O compromisso com a prioridade absoluta conferida pela Constituição Federal às crianças e adolescentes está exposto em ações idealizadas e coordenadas pelo CNJ e compartilhadas com o Sistema de Justiça. Na avaliação do conselheiro Richard Pae Kim, presidente do Fórum Nacional da Infância e da Juventude (Foninj), apesar de possuir boas leis, a concretização desses direitos ainda é um desafio a ser alcançado e o CNJ tem papel importante nesse cenário.
“As ações intersetoriais e interinstitucionais protagonizadas pelo CNJ na articulação dos mais diversos setores da sociedade são passos inéditos e fundamentais nessa direção. E o CNJ tem como uma de suas principais atribuições trabalhar junto ao Judiciário para que os direitos das crianças e adolescentes sejam cumpridos integralmente”, diz.
300 instituições
Esse entendimento culminou em duas recentes ações voltadas para a proteção dos direitos da infância e da juventude. Uma delas é o Pacto Nacional pela Primeira Infância, que envolve mais de 300 instituições em um trabalho de cooperação para a celebração de cursos de capacitação, de seminários regionais, de troca de informações e de atuação em conjunto para garantir a atenção integrada à primeira infância, conforme as regras do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), e do Marco Legal da Primeira Infância.
Para subsidiar as atividades da rede de proteção da primeira infância, um diagnóstico nacional do sistema de atenção a esse público se debruçou sobre cinco eixos de pesquisa: mulheres presas e adolescentes em regime de internação, que estejam grávidas e/ou que sejam mães de crianças de até 6 anos de idade; proteção da criança na dissolução da sociedade conjugal; destituição do poder familiar e da adoção de crianças; unidades de acolhimento e famílias acolhedoras; e estrutura judiciária e gestão administrativa de políticas de infância e juventude.
O levantamento dos dados mobilizou pesquisadores e pesquisadoras do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) com o objetivo de mapear a situação da atenção à primeira infância em 120 municípios.
Outro produto recente, desenvolvido a partir dos esforços da Justiça em prol das crianças, é o Manual de Depoimento Especial de Crianças e Adolescentes de Povos Tradicionais, que orienta os tribunais no atendimento das vítimas de violência oriundas desses povos. O trabalho está alinhado à Resolução CNJ n. 299/2019, que dispõe sobre o sistema de garantia de direitos da criança e do adolescente vítima ou testemunha de violência, de que trata a Lei n. 13.341/2017.
Com o normativo, foram consolidadas as diretrizes para a prevenção da violência institucional contra crianças e adolescentes, a implantação das salas de depoimento especial e a execução do controle sobre a realização desses depoimentos.
Antes dessa resolução, foi editada a Recomendação CNJ n. 33/2010 para orientar a implantação de um sistema de depoimento especial para crianças e adolescentes, vítimas ou testemunhas, de violência. Em 2019, o CNJ coordenou o pacto nacional para o cumprimento da Lei 13.431 (Pacto da Escuta Protegida), prevendo a capacitação dos profissionais do Sistema de Justiça envolvidos com o tema.
Mais de 4 mil profissionais da rede de proteção à infância no tema já foram capacitados por meio da plataforma de ensino a distância, gerida pelo Centro de Formação e Aperfeiçoamento de Servidores do Poder Judiciário (CEAJud/CNJ). “Não temos dúvida de que o trabalho realizado pelo CNJ possibilita que crianças possam ser ouvidas em todo processo judicial de forma protegida”, diz o diretor da ONG Childhood Brasil, Itamar Batista Gonçalves.
O diretor da Childhood também cita o crescimento do número de salas para depoimento especial, em todos os tribunais de Justiça, como um importante avanço em direção ao atendimento constitucional dos direitos das crianças. “Em 2012, havia 59 salas. Em 2022, são mais de 1.000 locais voltados para garantir uma escuta protegida de crianças”, diz.
Acesso à Justiça
Outra inovação originária do Pacto pela Primeira Infância diz respeito mais diretamente ao trabalho da Justiça, de forma estruturada e integrada, por meio da Política Judiciária Nacional pela Primeira Infância. Lançada neste ano por meio da Resolução nº 470/2022, a Política se destaca por medidas que, no âmbito da Justiça, ampliam e asseguram o acesso à justiça por crianças na primeira infância.
Entre elas estão: adoção de métodos adequados de solução de conflitos, quando houver crianças envolvidas; criação de programa de capacitação continuada nessa temática; monitoramento das demandas judiciais relacionadas à primeira infância; e investimento em soluções tecnológicas para o acompanhamento da política, entre outros.
“São iniciativas relevantes pelo seu pioneirismo e podem ser consideradas divisores de água no que se refere a estratégia de implementação da lei, ao colocar o Judiciário como um importante ator nesse cenário”, avalia o conselheiro Richard Pae Kim. A implementação dos direitos previstos no ECA ainda tem se configurado como um desafio de difícil, mas necessária superação.
Ações do CNJ
Desde a sua criação, o CNJ elegeu os direitos da infância como prioridade. Em 2006, recomendou aos tribunais de Justiça a implantação de equipe interprofissional em todas as comarcas (Recomendação nº 2/2006), como prevê o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90).
O órgão também foi responsável pela criação de um cadastro nacional de crianças e pretendentes a adoção, permitindo melhor comunicação entre as varas da infância, as crianças e os futuros adotantes. Posteriormente esse cadastro evoluiu para se tornar o atual Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento (SNA), implantado pelo Resolução n. º 289/2019.
Com informações do CNJ