Apesar de, nos seis meses que antecedem a eleição, ainda constar como administrador de empresas que possuem contratos com o poder público, o candidato Paulo Octavio (PSD) poderá concorrer ao governo do Distrito Federal porque esses documentos possuem “cláusulas uniformes”.
Com essa conclusão e por maioria de votos, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) deferiu o pedido de registro de candidatura do empresário. O julgamento, nesta quinta-feira (29), foi resolvido por 4 votos a 3 graças à controvérsia sobre o que são, de fato, as tais “cláusulas uniformes”.
A candidatura de Paulo Octavio foi impugnada por adversários políticos com base no artigo 1º, inciso II, alínea “i”, da Lei Complementar 64/1990.
A norma prevê que estão inelegíveis os que, dentro dos seis meses anteriores ao pleito, tenham exercido administração de pessoa jurídica que mantenha contrato com órgão do poder público, “salvo no caso de contrato que obedeça a cláusulas uniformes”.
A existência das tais cláusulas significa, segundo definição do Tribunal de Contas de União (TCU), que um contrato foi firmado com regras estabelecidas indistintamente a todos os cidadãos ou a determinado segmento social, de forma objetiva, em situação de igualdade.
Já a lei eleitoral indica que, se o candidato não administra ou é sócio de empresas que negociaram acertos específicos com o poder público ao assinar contratos, ele tem idoneidade para concorrer sem precisar se afastar dessas funções.
O melhor sentido para o termo “cláusulas uniformes”, no entanto, é algo historicamente controverso na doutrina brasileira, por se tratar de conceito indeterminado.
Seu uso foi inaugurado pelo artigo 54, inciso I, alínea “a”, da Constituição Federal, na regra que proíbe deputados e senadores de firmar ou manter contrato com entes do poder público — exceto quando se tratar de documento com “cláusulas uniformes”.
Contrato padrão ou não?
Paulo Octavio é sócio de empresas que mantêm contratos de locação de imóveis com diversas secretarias distritais. Essa contratação deveria observar o modelo padrão 11/2002 estabelecido pelo governo do Distrito Federal, por meio do Decreto 23.287/2002.
No entanto, a alegação dos autores da ação é de que não se tratam de meros contratos de locação, pois a avença vai além para incluir prestação de serviços e fornecimento de bens. Se o contrato foge do modelo padrão, então deixaria de ter “cláusulas uniformes”
O candidato impugnado também administrava uma construtora que integra o consórcio responsável por erguer um viaduto no Setor Sudoeste, em Brasília, por meio de licitação feita pela Secretaria de Obras e Infraestrutura.
Esse acordo não teria “cláusulas uniformes” porque prevê que o próprio consórcio pode negociar aditivos contratuais e renegociar cláusulas, com o objetivo de preservar o equilíbrio econômico do contrato.
Foi essa análise que dividiu o colegiado do TSE. Os julgadores reconheceram a existência de nuances. A corrente vencedora optou por, diante da controvérsia, prestigiar o direito de Paulo Octavio de concorrer, afastando sua inelegibilidade.
Na dúvida, deixa passar
A posição vencedora foi inaugurada pelo ministro Ricardo Lewandowski. Para ele, a previsão de prestação de serviços e fornecimento de bens não desnatura o contrato de aluguel e suas cláusulas uniformes.
Da mesma forma, ele argumentou que a circunstância de o contrato principal da licitação feita pela Secretaria de Obras ser aditado para manter o equilíbrio econômico e prorrogar sua vigência não revela nenhuma grande excepcionalidade, a ponto de alterar sua uniformidade.
Votaram com ele os ministros Raul Araújo e Benedito Gonçalves. O ministro Alexandre de Moraes, que desempatou o placar, afirmou que nenhum dos pontos citados na ação mostra grande interferência das empresas de Paulo Octavio na contratação com o governo do DF.
“São serviços que, se tivessem sido contratados a outras empresas, seriam igualmente prestados. Em virtude disso, não verifico eventual necessidade de desincompatibilização no prazo exigido pela lei”, concluiu o presidente do TSE.
Ficou vencido o relator, ministro Carlos Horbach, que foi acompanhado pela ministra Cármen Lúcia e pelo ministro Sergio Banhos. Para eles, o caso dos autos mostra a existência de uma bilateralidade na formação dos contratos, que, assim, deixariam de ter “cláusulas uniformes”.
“A circunstância de haver debate sobre algumas das cláusulas e dos contratos não autoriza que não se tenha o rigor que consta na Constituição Federal e na legislação”, disse Cármen Lúcia. Para ela, não se pode permitir que haja confusão entre interesses públicos e privados em relação às pessoas que disputam as eleições.
RC 0601362-18.2022.6.07.0000
Com informações da Conjur