Jurisdição. Dilação. Caput. Trânsito em julgado. Teratologia. São muitas as expressões jurídicas que podem afastar o cidadão – que não é da área de direito – do entendimento da Justiça. O “juridiquês”, como é popularmente conhecido, é um neologismo utilizado para denominar o uso excessivo de jargões e termos técnicos pelos operadores do direito.
O linguajar carregado de expressões técnicas empregado em algumas peças jurídicas pode atrasar o entendimento do processo e atrapalhar a comunicação entre as partes interessadas, segundo o juiz federal Marco Bruno Miranda, titular da 6ª Vara da Justiça Federal do Rio Grande do Norte.
Miranda está a frente de um projeto tecnológico e pioneiro no Brasil. O magistrado potiguar é o responsável por implementar a metodologia visual law, com o objetivo de esmiuçar o juridiquês e aproximar cidadãos do entendimento da Justiça. A iniciativa que nasceu dentro da 6ª Vara Federal do RN, em agosto de 2019, se espalhou por outros locais do país. Estados como Rio de Janeiro, Santa Catarina e Ceará têm projetos semelhantes.
O visual law consiste na introdução de elementos visuais como pictogramas, imagens, figuras, vídeos e fluxogramas nos documentos emitidos pela Vara para tornar o conteúdo da mensagem mais acessível para as partes. Desta forma, quem recebe um mandado de intimação e penhora por ter deixado de cumprir obrigações fiscais, por exemplo, terá acesso a uma mensagem clara e descomplicada, mesmo que o conteúdo do comunicado não seja tão agradável.
“Começamos a trabalhar isso nos documentos usados na Vara. Primeiro, substituímos uma estagiária de direito por uma de design e começamos a utilizar pictogramas para representar conceitos jurídicos. É desafiador encontrar imagens que estruturem as informações sem desvirtuar a linguagem jurídica, mas é algo que facilita a comunicação. É uma ferramenta que agiliza até mesmo o diálogo entre os operadores do direito”, explica Marco Bruno Miranda.
Quem recebe um mandado da 6ª Vara assinado por Miranda encontra um documento com informações claras sobre como deverá proceder. Os longos textos com palavras difíceis e expressões em latim dão lugar a parágrafos curtos com orientações e até mesmo mensagens de tranquilidade, que orientam o cidadão a procurar a Justiça para fazer esclarecimentos.
A peça conta ainda com um QR code que direciona para um vídeo de quatro minutos, em que o próprio magistrado complementa a explicação do processo. “Fizemos um estudo para mapear as dúvidas mais frequentes das pessoas e com essa metodologia buscamos responder essas questões complexas com tabelas e fluxogramas, que explicam o funcionamento do direito”, detalha o magistrado.
Para o juiz federal, é necessário ainda que haja um equilíbrio entre o exercício da cidadania e o entendimento da Justiça pelo cidadão. “Por exemplo, é angustiante que uma pessoa tenha a própria vida discutida em um processo e não tenha a compreensão total do que está sendo debatido, mas o direito tem dessas coisas porque é uma ciência social. Nosso objetivo é simplificar o diálogo e não tornar todo cidadão um jurista. Essa também é uma preocupação nossa”, completa.