A 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) não conheceu de Habeas Corpus coletivo ajuizado pela Defensoria Pública de Santa Catarina com o objetivo de fazer com que todo e qualquer crime sexual cometido contra mulheres na comarca de Joinville (SC) seja julgado pela vara especializada — o Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher.
O julgamento, em 21 de junho, foi resolvido com base na jurisprudência pacífica do STJ, no sentido de que o HC não é meio adequado para analisar o vago receio ou a mera expectativa de violência, coação ou ameaça à liberdade de locomoção. Mas acabou por expor uma divergência de posições sobre o tema no tribunal.
Relator, o ministro João Otávio de Noronha fez considerações sobre o mérito do Habeas Corpus. Afirmou que, conforme a posição da 5ª Turma, o fato de a vítima do crime de estupro de vulnerável ser do sexo feminino nem sempre basta para inaugurar a competência da vara de violência doméstica.
O colegiado exige que a motivação do acusado seja de gênero, ou que a vulnerabilidade da ofendida seja decorrente da sua condição de mulher.
Isso exclui, por exemplo, alguém que cometeu estupro de vulnerável contra criança do sexo feminino, se o crime tem como ideia determinante a idade do ofendido e sua fragilidade. Essa pessoa seria julgada, portanto, por um juízo especializado em processos contra a dignidade sexual ou, mesmo, por uma vara comum.
Esse entendimento diverge de como a 6ª Turma tem decidido. A Defensoria Pública catarinense apontou o RHC 121.813, julgado em 2020, quando o colegiado afirmou que, para definir a competência da vara especializada, o que importa é a violência praticada contra a mulher (de qualquer idade), no âmbito da unidade doméstica, da família ou em qualquer relação íntima de afeto.
Essa divergência é relevante porque serve de indicação de competência para os tribunais locais tratarem a competência das dezenas de varas especializadas em violência doméstica espalhadas pelo Brasil.
“Percebe-se, então, clara divergência entre as turmas de Direito Penal desta corte”, destacou o ministro Noronha. A diferença é que a 5ª Turma faz a análise das circunstâncias do caso concreto para eventual deslocamento da competência para o juizado de violência doméstica.
Isso, por si só, tornaria inviável a concessão de um Habeas Corpus de forma generalizada e antecipada para que todo e qualquer processo sobre crime sexual contra a mulher seja destinado a determinada vara especializada em Santa Catarina.
Caberá à 3ª Seção dirimir essa divergência. Isso não poderá ser feito no Habeas Corpus coletivo catarinense porque o processo não ultrapassou as barreiras do conhecimento.
O problema é que a Defensoria Pública catarinense ajuizou o HC “em favor todas as pessoas presas ou que vierem a ser presas em crimes sexuais cometidos no âmbito de violência doméstica e familiar contra mulheres na comarca de Joinville”.
Não há elementos para analisar ou individualizar quem são essas pessoas. Além disso, a discussão do mérito é tese jurídica em caráter geral, sem a comprovação de ameaça real à liberdade de locomoção.