Os valores indicados na petição inicial devem ser encarados como uma mera estimativa de créditos pretendidos pelo empregado. Com esse entendimento, a 3ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) manteve decisão que afastou a limitação das condenações impostas a uma empresa alimentícia aos valores indicados por um vigia na petição inicial de sua reclamação trabalhista.
No caso, o vigia sustentou que a sua dispensa foi simulada pelo antigo empregador para que a Seara Alimentos, como sucessora, admitisse-o como auxiliar contábil, mas, na verdade, ele continuou a trabalhar no mesmo local e sem alteração nas tarefas.
Na ação, pediu o reconhecimento da sucessão trabalhista e a condenação da empresa ao pagamento de horas extras, adicional noturno, horas de itinerário, horas laboradas em domingos e correspondentes reflexos.
O juízo da Vara do Trabalho de Porecatu (PR), ao verificar que o vigia não havia indicado na petição inicial, de forma individualizada, os valores de suas pretensões, determinou que os autos fossem retirados de julgamento. Em seguida, concedeu prazo para que o empregado emendasse a petição inicial, indicando os valores, sob pena de extinção do processo sem resolução de mérito. A defesa do empregado, então, emendou a inicial indicando os valores.
Em sentença, o juízo reconheceu a existência de um contrato único e condenou a empresa ao pagamento das verbas pleiteadas, calculadas em R$ 20 mil, limitando o valor ao que fora pretendido na inicial. A decisão destaca que o artigo 840, parágrafo 1º, da CLT exige que o pedido tenha como requisitos a certeza, a determinação e a indicação do valor correspondente, não podendo, assim, o magistrado se afastar das quantias indicadas na inicial.
O empregado, então, interpôs recurso ordinário com o argumento de que o dispositivo da CLT não determina a exata liquidação dos pedidos e a Instrução Normativa 41/2018 do TST deixa claro que o valor da causa será estimado.
Quantia estimada
O Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (TRT-PR) entendeu que a sentença deveria ser reformada para afastar a limitação da condenação. No entendimento do TRT-PR, a atribuição dos valores aos pedidos indicados na petição inicial é uma previsão.
A empresa recorreu ao TST por meio de agravo de instrumento após o seu recurso de revista ter sido desprovido na corte regional. Mas o relator na 3ª Turma, ministro Mauricio Godinho Delgado, votou no sentido de negar provimento ao agravo de instrumento.
O ministro explicou que, após a vigência da Lei 13.467/2017, o parágrafo 1º do artigo 840 da CLT exigiu que, em caso de reclamação escrita, o pedido deverá ser certo, determinado e com indicação do autor, além da designação do juízo, qualificação das partes, exposição dos fatos, data, assinatura do demandante ou de seu representante legal.
Entretanto, conforme destaca o magistrado, em nome dos princípios da finalidade e da efetividade social do processo, da simplicidade e da informalidade, deve-se buscar uma interpretação que busque o alcance da norma, sob pena de, ao se fixar valores dos pedidos, serem afrontados “os princípios da reparação integral do dano, da irrenunciabilidade dos direitos e, por fim, do acesso à Justiça”.
Dessa forma, entende o ministro que o artigo 840, parágrafo 1º, da CLT, após alterações da Lei 13.467/2017, “deve ser interpretado como uma exigência apenas de estimativa preliminar do crédito”, a ser apurado, de forma mais detalhada, na fase de liquidação.
Segundo o ministro, diante dos pedidos deferidos, não é possível exigir do trabalhador a apresentação de uma memória de cálculo detalhada, pois a reclamação trabalhista contém pedidos de apuração complexa, como é o caso, exemplificativamente, da pretensão a horas extras, que demanda usualmente o acesso aos documentos relativos à jornada e a produção de prova oral. Assim, somente por ocasião da liquidação judicial é possível a quantificação da parcela.
Por fim, ele destacou que “o autor foi cauteloso ao expressar tratar-se de ‘valor estimativo’ naquelas parcelas que dependem de liquidação de sentença”. Diante dessa constatação, segundo Godinho Delgado, a decisão estaria em conformidade com a jurisprudência do TST, tornando inviável o exame das indicadas violações de dispositivo legal ou constitucional.
Com informações do TST