O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) promoveu a formação sobre atendimento inicial e integrado a adolescentes a quem se atribuam a prática de ato infracional. O curso, que acumulou mais de 6,5 mil visualizações nos três dias de evento, aborda a qualificação do primeiro contato com o sistema de Justiça e o sistema de garantia de direitos para um impacto positivo no futuro dessas jovens e desses jovens e, em maior escala, para toda a sociedade.
Na ocasião, foi lançado o Manual sobre a Recomendação n. 87/2021, com diretrizes e procedimentos ao Poder Judiciário para implementação e funcionamento dos Núcleos de Atendimento Integrado (NAI).
A atividade faz parte do programa Fazendo Justiça, coordenado pelo CNJ em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), que incide em desafios no campo da privação de liberdade. Além do evento de formação e do lançamento do manual, o CNJ atua por meio do programa para incentivar o funcionamento de NAIs e de fluxos de atendimento em 26 municípios de 17 unidades da federação – há locais com serviços ou fluxos já implantados, outros com qualificação da metodologia em andamento e um terceiro grupo com discussões abertas sobre implantação serviços ou fluxos.
Durante a abertura do evento, no dia 25 de maio, o supervisor do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF) do CNJ, conselheiro Mauro Martins, disse que os atores envolvidos estão vigilantes na aplicação de garantias dispostas em leis internacionais e nacionais.
“Adolescentes são sujeitos em desenvolvimento e titulares de todos os direitos fundamentais e específicos pela fase de vida em que se encontram. O CNJ tem se engajado no compromisso de ofertar ferramentas para a operacionalizar normativas atinentes à infância e juventude, sem permitir retrocessos em nosso país. Que sigamos em um profícuo diálogo que aponte para a transformação do cenário atual, sem renunciar a nenhuma das conquistas dos adolescentes e de toda a sociedade até aqui.”
Representando a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, George Lima disse que o sistema socioeducativo foi temática prioritária no planejamento estratégico executado entre 2017 e 2021, e seguirá no novo planejamento até 2026. “A comissão entende que o Brasil é relevante na proteção dos direitos da criança e do adolescente e referência para outros países, por isso é importante estreitar relações com o estado.”
A coordenadora de assuntos socioeducativos do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Giselle Cyrillo, afirmou que diagnóstico sobre o Sistema Nacional Socioeducativo (Sinase) identificou a necessidade de fortalecer a intersetorialidade, articulação e a transversalidade do atendimento socioeducativo pedagógico e cidadão. “Que a privação da liberdade seja excepcionalidade em um cenário que a recuperação do adolescente seja feita junto aos familiares.”
Para o presidente do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), Diego Alves, o atendimento integrado é uma grande oportunidade para o estado demonstrar que está ao lado do adolescente. ”Se são complexas e multifacetadas as questões sociais que levam o adolescente ao ato infracional, a resposta do Estado também precisa ser complexa, integrada e compreensiva.”
Esse entendimento se alinha ao diálogo entre as instituições do sistema socioeducativo defendido pelo representante do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) no evento, promotor de Justiça do Rio Grande do Sul Felipe Teixeira Melo. “O atendimento integrado é oportuno para sentir as necessidades do adolescente e delinear um diagnóstico preliminar.”
Em nome do Colégio Nacional de Defensores Gerais (Condege), a defensora pública do Espírito Santo Adriana Peres relembrou que o sistema socioeducativo já viveu quadros graves de superpopulação carcerária, situação que, segundo ela, foi contornada pelo habeas corpus coletivo 143.988 julgado pelo Supremo Tribunal Federal e pela a resolução do CNJ relativa à Central de Vagas. “Percebemos que o atendimento integrado reduz a aplicação de medidas socioeducativas restritivas de liberdade desnecessárias. Isso impacta diretamente na quantidade de lotação das unidades socioeducativas.”
Representando o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), Carlos Arboleda destacou o alinhamento do tema da formação com a Agenda 2030 de Objetivos para o Desenvolvimento Sustentável (ODS). “Instituições que ofereçam atendimento qualificado desde o primeiro ato processual contribuem para a reintegração desses indivíduos e alcança, nos melhores resultados, a construção de uma sociedade mais pacífica, justa e inclusiva. Que o evento que se inicia hoje seja mais uma contribuição para essa jornada da justiça e de desenvolvimento que transforma a realidade dos jovens brasileiro.”
O painel de abertura foi encerrado pelo conselheiro do CNJ Richard Pae Kim. “O lançamento do Manual sobre a Recomendação do CNJ é um alinhamento harmonioso e necessário com a formação, pois auxilia órgãos de todo o país a transformar o sistema socioeducativo em um sistema que acolhe, compreende e auxilia na ampla possibilidade desses jovens terem seus direitos garantidos.”
Lançamento
A Recomendação CNJ 87/2021 busca dar aplicabilidade ao artigo 88 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), estabelecendo a elaboração de Manual sobre os procedimentos administrativos, judiciais e técnicos para a implantação e pleno funcionamento dos NAIs no âmbito do Poder Judiciário. Tanto a publicação quanto a expansão e qualificação de NAIs e de fluxos iniciais de atendimento são temas trabalhados pelo CNJ no contexto do programa Fazendo Justiça.
“O manual não é uma receita pronta, mas aponta caminhos possíveis que já foram trilhados com sucesso. É uma publicação que trata questões complexas com a profundidade que os temas demandam”, avaliou o juiz auxiliar do DMF/CNJ, Fernando Pessôa da Silveira Mello.
A publicação tem cinco partes que partem dos conceitos básicos sobre atendimento integrado, perpassam pela articulação intersetorial e fluxo de atendimento, até chegar na orientação dos atores de justiça contra a tortura e monitoramento de resultados.
A pesquisadora e consultora do Pnud, Karine Szuchman, disse que a qualificação da porta de entrada promove os direitos constitucionais de adolescentes brasileiros. “O estudo e formação deste manual foi longo e esperamos que seja apenas o início desse debate importante para a sociedade, além de auxiliar magistrados e servidores.”
Com informações do CNJ